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“Decisão de Trump de taxar o aço brasileiro é uma retaliação ao país”, diz indústria

Presidente dos EUA afirma que irá retomar tarifas sobre produtos brasileiros e argentinos por conta da desvalorização de suas moedas frente ao dólar. Bolsonaro diz que, “se for o caso”, falará com Trump

Presidente Donald Trump nesta segunda-feira.
Presidente Donald Trump nesta segunda-feira.Alex Brandon (AP)
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Em mais uma frente de batalha da guerra protecionista impreendida por seu Governo, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou em seu perfil do Twitter que irá retomar imediatamente as tarifas norte-americanas sobre aço e alumínio do Brasil e da Argentina. “O Brasil e a Argentina têm promovido uma forte desvalorização de suas moedas, o que não é bom para nossos fazendeiros", justificou Trump. “Portanto, com vigência imediata, restabelecerei as tarifas de todo aço e alumínio enviados aos EUA por esses países”. Na mesma publicação do Twitter, Trump também pediu que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) impeça que países tomem vantagem de um dólar mais forte, desvalorizando suas moedas. Um terço do aço exportado no Brasil tem como destino o mercado dos Estados Unidos, que também é o maior cliente do produto argentino.

Na manhã desta segunda, o presidente Jair Bolsonaro reagiu à fala de Trump, um aliado de seu Governo, afirmando que irá conversar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e acrescentou que, se precisar, entrará em contato com o próprio presidente norte-americano. "Se for o caso, falo com Trump, tenho canal aberto". Logo depois, durante uma entrevista à rádio mineira Itatiaia, no Palácio do Planalto, Bolsonaro afirmou que o anúncio de Trump é "munição para pessoal opositor meu aqui no Brasil" e em seguida que que não entende a medida como "retaliação".

Para o chanceler Ernesto Araújo, a medida anunciada por Trump não preocupa "e não nos tira desse trilho rumo a uma relação mais profunda". "Vamos conversar, vamos entender a medida, como eu digo, com toda tranquilidade. Não estamos de forma nenhuma apurados com isso, vamos avaliar o impacto, avaliar exatamente que tipo de medida os EUA estão pensando", declarou o ministro, segundo quem esse é um setor que desde ano passado preocupa os americanos. "Então, vamos, como eu digo, tentar entender e ver como a gente vai conversar com EUA, com muita calma, vamos chegar a um entendimento sobre isso", finalizou.

Em nota, o Instituto Aço Brasil afirmou que recebeu com perplexidade a decisão anunciada por Trump e disse que o câmbio no país é livre, não havendo por parte do Governo qualquer iniciativa no sentido de desvalorizar artificialmente o real. "A decisão de taxar o aço brasileiro como forma de compensar o agricultor americano é uma retaliação ao Brasil, que não condiz com as relações de parceria entre os dois países", diz a nota enviada ao EL PAÍS. "Por último, tal decisão acaba por prejudicar a própria indústria produtora de aço americana, que necessita dos semiacabados exportados pelo Brasil para poder operar as suas usinas".

Na tarde desta segunda-feira, o ministério da Economia comunicou que o Governo brasileiro já está em contato com interlocutores em Washington sobre o tema. "O Governo trabalhará para defender o interesse comercial brasileiro e assegurar a fluidez do comércio com os EUA, com vistas a ampliar o intercâmbio comercial e aprofundar o relacionamento bilateral, em benefício de ambos os países", diz nota do ministério. Enquanto isso, na Argentina, o ministro das Relações Exteriores, Jorge Faurie, falou por telefone com o secretário de Comércio dos EUA, Willbur Ross, "para negociar em diferentes níveis e ver como a questão pode ser resolvida", disseram fontes do Ministério das Relações Exteriores ao EL PAÍS. O porta-voz se recusou a dar detalhes da conversa. A negociação também está nas mãos do ministro da Produção, Dante Sica, que pediu ao embaixador argentino em Washington, Fernando Oris de Roa, que solicitasse uma entrevista com Ross, um funcionário que estava em Buenos Aires e que a Casa Rosada considera um aliado. O problema na Argentina é que em oito dias o centro-esquerdista Alberto Fernández substituirá Macri e qualquer negociação iniciada deverá continuar com novos funcionários.

Na avaliação do economista-chefe da Necton André Perfeito, Trump não entende a natureza das desvalorizações do real e do peso. "Mas ao colocar dessa forma a questão faz reverberar sua retórica anti globalista e é um golpe duro ao Palácio do Planalto que via Washington como um aliado", afirma. Ainda segundo Perfeito, a reação de Trump é desproporcional e sugere que essa talvez seja uma retaliação sobre outros assuntos, como as disputas em relação a tecnologia 5G, por exemplo. “O Brasil está ensaiando se aproximar da China nessa questão”, diz.

No caso argentino, o peso caiu perante o dólar e, neste ano, a inflação será de cerca de 60%, apesar da ajuda de 57.000 milhões de dólares que Macri recebeu do FMI, com a autorização prévia de Donald Trump. Já o real brasileiro superou na semana passada a barreira de quatro unidades por dólar, para o recorde histórico de 4,27 reais. A moeda brasileira é pressionada por uma combinação de fatores, como a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, protestos em países vizinhos, como Bolívia, Chile e Colômbia, e o retorno ao poder do peronismo Kirchner na Argentina. A declaração do ministro da Economia Paulo Guedes, que disse não estar preocupado com a desvalorização, assustou ainda mais os investidores.

Para a XP Investimentos, a declaração do presidente dos EUA é uma tentativa clara de fortalecer o apoio político dos produtores de aço e alumínio dos EUA (seus eleitores), já que as eleições primárias dos EUA estão chegando. Ainda na avaliação da corretora, o impacto econômico (de primeira ordem) dessa medida é negativo, mas de certa forma limitado, pois esses produtos representam apenas 1,7% de nossas exportações totais. "No entanto, reconhecemos que a medida pode impactar a economia através do canal de expectativas, uma vez que mais medidas poderão ser anunciadas em breve se as negociações falharem", afirma relatório da XP Investimentos desta segunda-feira.

O setor industrial argentino também lamentou as restrições comerciais no momento em que o país precisa urgentemente da entrada de dinheiro novo para reverter a falta de crédito internacional e a ameaça de default dos pagamentos de sua dívida externa. Javier Madanes Quintanilla, presidente da Aluar, a maior empresa produtora de alumínio da Argentina, responsabilizou o Governo Macri pelo retorno das tarifas. Em declarações ao jornal La Nación, ele disse que houve uma "má leitura" das conseqüências da guerra comercial e "uma inoperância que assusta a administração da estratégia internacional de negócios".

Histórico da 'guerra do aço'

A discussão sobre o tema, no entanto, não é nova. Em março de 2018, Trump havia anunciado a imposição de uma sobretarifa de 25% sobre as importações de aço e de 10% sobre as de alumínio de vários países, incluindo o Brasil —o maior exportador de aço para os EUA.

A decisão provocou, no entanto, enorme polêmica. E os próprios americanos questionaram a medida, já que a maioria do aço proveniente do Brasil é semiacabado, sendo um insumo usado na indústria de transformação. Eles argumentaram que a barreira a essas matérias-primas poderia encarecer o preço de automóveis, eletrodomésticos e de outros produtos, podendo ter um impacto negativo sobre a inflação do país.

Meses depois, em agosto do ano passado, após forte pressão das próprias empresas americanas, o presidente americano voltou atrás e resolveu flexibilizar a política das tarifas da Coreia do Sul, Brasil e Argentina. Ele estabeleceu a entrada de aço e alumínio no país em quantidade acima das cotas livres dessas taxas, caso ficasse comprovado que o produto não era feito nos EUA em quantidade suficiente.

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