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Tensão no Golfo Pérsico ameaça estabilidade do mercado de petróleo no mundo

Trump adverte sobre resposta militar contra o Irã se autoria do ataque à Arábia Saudita for confirmada, enquanto Teerã rejeita as acusações

Imagens do incêndio no sábado passado.Vídeo: Atlas
Dubai / Washington -
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Irã adverte aos EUA sobre “consequências devastadoras” se for atacado

O Irã se apressou em negar as acusações dos Estados Unidos sobre sua responsabilidade no ataque com drones ocorrido contra instalações petrolíferas sauditas, atribuídas aos rebeldes huthis do Iêmen. O risco de agravar o braço de ferro entre Washington e Teerã constitui uma nova ameaça ao abastecimento mundial de energia, já afetado pelo corte significativo na produção de petróleo saudita provocado pelo ataque, ocorrido no sábado, e que pode durar dias. O Governo saudita afirmou ter margem para cobrir as exportações com suas reservas.

O presidente dos EUA. Donald Trump advertiu na noite de domingo que os Estados Unidos estão “carregados e prontos” para responder, embora tenha se manifestado com menos veemência do que o secretário de Estado Mike Pompeo sobre a autoria. “Há razões para acreditar que conhecemos o culpado, estamos carregados e prontos”, escreveu em sua conta no Twitter, mas admitiu que aguardava comprovação e que esperava falar com os sauditas “para saber quem eles acreditam ter causado o ataque e em quais termos proceder”.

"As acusações parecem resultado de um complô organizado por alguns serviços secretos para desprestigiar a imagem de um país e preparar o caminho para ações futuras”, denunciou o porta-voz do Ministério das Relações Exterior iraniano, Abbas Musavi, que disse que são “mentiras sem sentido”. No sábado Pompeo acusou o Irã de estar por trás do bombardeio com drones de duas importantes instalações da companhia de petróleo saudita Aramco, que está em processo de abertura de capital.

O impacto dos incêndios que provocaram na refinaria de Abqaiq, a maior do mundo, e nas infraestruturas de Khurais, seu segundo campo de petróleo, obrigou a empresa a interromper a produção de 5,7 milhões de barris por dia, algo mais da metade do seu volume e equivalente a quase 6% do consumo mundial. Segundo diferentes fontes sauditas consultadas pela imprensa econômica, os danos às infraestruturas foram “grandes”, embora a Arábia Saudita espere retomar hoje um terço da produção interrompida.

A Arábia Saudita tem 188 milhões de barris armazenados que serviriam de colchão durante semanas, caso seja necessário. Uma fonte do setor citada pela agência Reuters disse que as exportações estariam garantidas nas próximas semanas graças ao estoque —dividido entre o próprio território saudita e depósitos no Japão, Holanda e Egito. Os Estados Unidos, no entanto, ofereceram suas reservas para garantir o abastecimento mundial.

Conforme relatado pelo Financial Times no domingo, Riad está em contato com vários membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) caso seja necessário aumentar temporariamente sua produção até que o reino restabeleça a sua, embora sem especificar quais membros poderiam fazê-lo. Entre os países da OPEP, a Arábia Saudita é o primeiro produtor, seguido por Iraque, Irã —submetido a sanções dos EUA por causa de seu programa nuclear—, Emirados e Kuwait.

De qualquer forma, existe margem porque desde o final de 2016, sob iniciativa saudita, os membros dessa organização de produtores limitam o volume de petróleo bruto que entra no mercado para manter o preço.

Trump anunciou na noite de domingo que havia autorizado o uso das reservas estratégicas de petróleo, em caso de necessidade, “em uma quantidade suficiente a ser determinada para manter os mercados bem abastecidos”, uma mensagem que não serviu para evitar o aumento no preço nos mercados de futuros do petróleo Brent, uma referência na Europa, e do West Texas Intermediate. O presidente também aproveitou a oportunidade para pedir às agências correspondentes que acelerassem as aprovações dos oleodutos atualmente em processo de autorização no Texas e em outros Estados.

Embora os huthi tenham reivindicado a autoria do ataque, o terceiro desse tipo que assumem desde maio, Pompeo disse no Twitter que não há provas de que os drones saíram do Iêmen. Ele tampouco ofereceu qualquer respaldo às suas alegações além de denunciar que o presidente iraniano, Hasan Rohani, e seu ministro das Relações Exteriores, Mohammad Javad Zarif, “fingem que fazem diplomacia”.

Zarif, um hábil usuário das redes sociais (apesar de a maioria delas estar bloqueada no Irã), não tardou a responder. “Depois do fracasso da [política de] ‘máxima pressão’, o secretário Pompeo dá uma guinada para a de ‘máximo engano’”, tuitou ele neste domingo. O chefe da diplomacia iraniana disse que “os EUA e seus acólitos estão atolados no Iêmen” e que “culpar o Irã não vai por fim ao desastre”.

Enquanto isso, um general da Guarda Revolucionária recordou aos Estados Unidos que “suas bases e seus porta-aviões em um raio de 2.000 quilômetros se encontram ao alcance dos mísseis iranianos”. Não está claro se as palavras do responsável pela Força Aérea desse Exército revolucionário são uma mera bravata para consumo interno ou denotam nervosismo ante o temor de que Washington esteja procurando um pretexto para atacá-lo.

Trump já reconheceu ter dado a ordem de atacar (que cancelou no último momento) em junho passado, depois que a Guarda Revolucionária derrubou um drone norte-americano. As tensões que vêm se acumulando desde que os EUA abandonaram o acordo nuclear com o Irã, no ano passado, pareciam ter diminuído nas semanas posteriores, mas Washington continuou aumentando suas sanções, enquanto Teerã continuou desafiando essa pressão com uma progressiva retirada de seus compromissos sob aquele pacto.

Diálogo com Teerã

É incerto o efeito que os ataques às instalações petrolíferas sauditas terão sobre a política dos EUA em relação ao Irã se mantiverem suas acusações contra o regime. Apenas três dias antes, na quarta-feira, Trump deixou a porta aberta para um abrandamento das sanções econômicas que impôs àquele país para forçá-lo a renegociar um acordo nuclear que substitua o de 2015. “Acredito que eles gostariam de chegar a um acordo”, disse o presidente à imprensa, lembrando que o Irã “atravessa enormes dificuldades financeiras e as sanções estão ficando cada vez mais duras”. Quando perguntado diretamente sobre a possibilidade de reduzi-las, respondeu: “Vamos ver o que acontece”, bem ao seu estilo.

Por causa da mediação francesa durante o último G7, no final de agosto, Trump expressou sua disposição de se encontrar com o presidente iraniano, Hasan Rohani, durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, que começa na próxima terça-feira. No entanto, Rohani descartou qualquer reunião enquanto as sanções não forem levantadas. Além disso, não está claro que tenha o apoio para isso do líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei, que tem a última palavra em todos os assuntos de segurança nacional e política externa.

Alguns analistas norte-americanos especularam que os ataques tentarão fechar qualquer possibilidade a esse respeito. “Não ajudam”, respondeu Kellyanne Conway, assessora da Casa Branca, à rede Fox neste domingo. Mas Conway não descartou a eventualidade de uma cúpula.

Os Estados Unidos e a Arábia Saudita já acusaram o Irã de estar por trás das sabotagens contra navios-tanque no Estreito de Ormuz e nas infraestruturas petrolíferas sauditas dos últimos meses, algo que Teerã negou. Também responsabilizam a República Islâmica de armar os rebeldes iemenitas (o que ambos rejeitam). Pompeo foi mais longe desta vez, ao dizer que os bombardeios de Abqaiq e Khurais não teriam se originado no Iêmen, mas no Irã.

Tanto Abqaiq quanto Khurai, os objetivos alcançados pelos rebeldes iemenitas, estão muito além da faixa de 150 quilômetros de alcance dos drones em poder dos huthi, os chamados Qatef-1. No entanto, investigadores da ONU revelaram que os rebeldes têm um novo modelo, o UAV-X, que pode chegar a 1.500 quilômetros.

ARAMCO, GIGANTE DO SETOR

Rentabilidade. A petroleira estatal saudita Aramco é considerada a companhia mais rentável do mundo, responsável pela produção de 10% do petróleo bruto em todo o mundo. A Arábia Saudita é, além disso, o maior exportador de petróleo.

Valor. As autoridades sauditas estimam o valor da companhia em dois trilhões de dólares (cerca de oito trilhões de reais), o dobro do que vale o gigante informático Apple.

Emprego. A Aramco dá trabalho a 65.000 pessoas.

Mercado. A companhia prevê abrir seu capital em 2020.

Produção. A refinaria de Abqaiq é considerada a maior do mundo, com uma produção de aproximadamente sete milhões de barris por dia.

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