![A região do Rio Verde é considerada o coração da Estação Ecológica Jureia-Itatins](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/24PIDK4JTBILLGHGWFLJU2IP2E.jpg?auth=c6bb70402262fdecbbfd51c64cece9b5cf88c660fefa404d0989ce64c427b48e&width=414)
Uma geração que quer fincar pé no território tradicional
Três casais caiçaras integram a oitava geração da família Prado e lutam para permanecer na Jureia, em uma área do litoral sul paulista considerado o gradiente de mata atlântica mais preservado do mundo pelo Estado e por ambientalistas
![No dia 4 de julho, três casais da oitava geração caiçara da região do Rio Verde iniciaram um acampamento para tentar resistir na única casa que não foi demolida pelo Estado naquele dia. Chovia muito quando guardas e policiais ambientais cumpriram a ordem do Governo de desfazer as casas levantadas sem autorização na área da estação ecológica, cuja legislação traz fortes restrições para moradia. De um lado, o Estado argumenta que atuava para evitar a consolidação de um crime ambiental. Do outro, a comunidade alega que a construção foi um ato de desobediência civil para fazer valer seu direito como povo tradicional. No acampamento, ativistas sociais, ambientalistas, parentes e até políticos seguem em vigília há semanas. Dormem em barracas e assumem o compromisso de seguir o modo de vida caiçara.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/DN5X34O6VZLUJMQIGHH4RXBJ5Y.jpg?auth=8ca5027d542a83263fbda66799311ac97cf84c416647b6478d3b3287ea1ff899&width=414)
![Crescida na cidade de São Paulo, Karina Ferro casou com Edmilson Prado e adotou o modo de vida caiçara há cerca de dois anos, mas não se sente exatamente tradicional. "Eu entendo que tem uma memória familiar e ancestral que eu não tenho, mas que meu filho vai ter. Ele vai ser caiçara”, explica, argumentando que o casamento lhe deu o direito de estar ali. Aos quatro meses de gravidez, ela gesta também o futuro da família no território. O casal acredita que a casa deles não foi demolida por conta da sua condição. Antes, eles viviam na casa dos pais de Edmilson. “Eles não contavam com três famílias jovens fincando pé no território”, acredita Karina. Para eles, o Estado esperava a morte dos mais velhos pra resolver o conflito de moradia na região. A preocupação do Governo de São Paulo é que a comunidade cresça ao longo das próximas décadas e ponha em risco a preservação ambiental do local.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/NJ7AYNPPIJKLVCUR6MJEBBCD4Q.jpg?auth=e08efbad733b0c657d23f6a61d45de9c934d70adaee1cd7c86bc1596d770ca4b&width=414)
![Marcos Prado e Daiane Neves são descendentes caiçaras. Depois de deixar o território do Rio Verde para estudar na Barra do Ribeira, um bairro da cidade de Iguape, decidiram voltar e constituir família no território que veem como sua casa. Eles caminham no entorno da clareira onde construíram sua casa e têm dificuldade de acreditar que o que um dia foi sonho agora são entulhos espalhados pela terra batida da tapera que foi morada da avó de Marcos, Nancy Prado, durante a infância dela. "Falam que somos invasores, mas chegamos aqui antes da estação ecológica", diz Marcos. Daiane chora enquanto olha o entorno, sem acreditar no que vê. "Destruíram o meu sonho, agora eu vou ter que reconstruir. Isso tudo só vai deixar a gente mais forte", se consola.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/YTX5BIJMMBK3HHCGKX7HSSQIQE.jpg?auth=a92d49088c5edaa0739567c7100d32c1fd45a75f50f05cf7e635f67765690a91&width=414)
![Vanessa Muniz Honorato, de 22 anos, vasculha o que restou de sua casa, uma construção de paredes verdes que tinha a mesma estrutura de um único vão de 64 metros quadrados que as outras duas construídas pelos primos do marido, Héber Prado, sentado ao seu lado. Entre os escombros, sob uma lona azul, ainda estão o fogão, um balcão de pilha, uma vassoura e alguns utensílios domésticos. O casal junta parte das compras feitas antes da demolição e separa pacotes de feijão e arroz para levar até a casa de Edmilson, onde vivem provisoriamente. Era ali, naquela parte da mata que um dia serviu de roça aos seus ancestrais, que eles faziam o evangelho espírita toda quarta-feira. "Eu vejo e não consigo acreditar. Tenho uma culpa enorme porque não estava aqui naquele dia", diz Vanessa. Ela e Daiane haviam ido para Matinhos, no Paraná, onde estudam Educação no Campo em um sistema de alternância, com períodos na universidade e outros na comunidade.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/OY3XNBH4HZICPBYQGOTTZLNXKM.jpg?auth=6897c8011cc715054077137b0f3d1c9973a97e8a03c72725c5b33eb22e56ef81&width=414)
![Os três casais se ancoram na força dos avós, Nancy e Onélio Prado. De origem caiçara, os dois moraram praticamente a vida toda naquela região que o Estado considera a área de mata atlântica mais preservada do mundo. Deixaram o lugar por menos de uma década, quando foram morar no sítio Brasília, já fora da estação ecológica, por conta da pressão de grileiros e jagunços na década de 1960. Estudos do arqueólogo Plácido Cali apontam que existem documentos que comprovam a presença da família Prado na região desde o século XVIII. O Estado diz que não discute que esta comunidade caiçara viveu ali nem questiona que os três jovens sejam caiçaras, mas argumenta que desde os anos 1980 não há uma comunidade vivendo na região.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/IRKGZC343NIVJMBDFTZSAZLPGE.jpg?auth=d7f38e65298ce99b09d2ed82346ffd489ff25531e77bd92069b35a5386c5f85a&width=414)
![A Fundação Florestal, órgão que gere a unidade de conservação, diz que o desfazimento das casas foi uma tentativa de evitar o crime ambiental que representa a consolidação de construções irregulares na região. Alega ainda que as construções representam a criação de um novo núcleo habitacional no meio de uma unidade de conservação. A Justiça, por sua vez, entendeu que existe uma comunidade tradicional ali e, por isso, proferiu liminar para manter a integridade da casa de Edmilson enquanto o caso não é analisado com mais profundidade no curso do processo. Enquanto isso, os três casais dividem o único vão da casa que permanece de pé.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/M5PWSHXCSZIALIKNCT5YC5YGQE.jpg?auth=4efd79c10521b855781ba41716b007917fb529c26c45d33cf24f8f68b10a3f64&width=414)
![Os caiçara viviam originalmente da agricultura, mas com as restrições para as roças e a proibição da caça pela legislação ambiental passaram a viver também majoritariamente da pesca. No acampamento montado no Rio Verde, eles cozinham em um fogão a lenha improvisado. Na imagem, tainhas pescadas na vizinha Praia do Una são estendidas acima do fogo para serem defumadas e não estragarem.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/SQYCQTOV35O67JSROLZ63E2GBY.jpg?auth=d110f3e85e66fd88e138fa2b6ce4f7910ffa679c0d3afd3337feece3eb230ba3&width=414)
![Se por um lado a entrada em uma estação ecológica precisa de autorização, por outro os caiçaras reivindicam ter direitos como cidadãos de receber visitas que possam ir e vir na região. Ao lançarem o acampamento, eles destacaram que seus apoiadores viveriam como eles enquanto estivessem ali, preservando a consciência ambiental. O Estado defende as restrições. Argumenta que dezenas de pessoas causariam impacto. No fim de julho, emitiu um documento para que a família Prado se abstivesse de realizar o sopão solidário que organizava na região. Na imagem, as regras e a programação dos acampados.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/IVVKM3FHPFM5TE74WBTUFMBU2E.jpg?auth=bb52a87478d7f7acfa339c0ac8ae31d1217dbcd6593a499f03549fc2ee3ba1b9&width=414)
![A principal festa cultural da comunidade caiçara é o fandango, um baile ao som de violas com danças tradicionais. Diante do conflito territorial na Jureia, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional já expressou ao Governo de São Paulo a preocupação de que repercuta na manutenção dessa tradição. Na imagem, mulheres da comunidade fazem seus afazeres domésticos enquanto as violas seguem penduradas na parede.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/LSFUGDKMSVPXDJMRHNJS63R75M.jpg?auth=3043437abc940ace1dfab191980d7f5fa4eede6b5615f1731f57b6f482d1d42e&width=414)
![A Estação Ecológica Jureia-Itatins está no centro de um conflito delicado. De um lado, o Estado e entidades ambientalistas como a SOS Mata Atlântica defendem a preservação integral da região, sem a presença humana. É um símbolo da luta ambiental pela conservação de um lugar onde se pretendia construir oito usinas atômicas durante a ditadura militar. Considerada uma das maiores conquistas da proteção da biodiversidade brasileira e patrimônio da humanidade pela Unesco, é também vista como morada pela família Prado. "Se me jogarem em qualquer lugar dessa mata, eu me sinto em casa. Se me tirarem daqui, sou um homem perdido", diz Edmilson. A comunidade defende que é ela quem protege a região, fonte de recursos naturais dos quais depende a sua sobrevivência, já que o próprio Estado não tem estrutura grande o suficiente para fiscalizar toda a área.](https://imagenes.elpais.com/resizer/v2/JGPBH6XW6BPBNHPJPAFNMGK7WA.jpg?auth=a8cd4d7b355b467653152cfaa85e2332733dc69cfb1f9c3650e2b0cc2541e1d2&width=414)