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O enigma dos sinais cósmicos que chegam a cada 131 segundos

Dois estudos esclarecem o comportamento dos buracos negros, os objetos mais violentos do universo

Ilustração mostra um buraco negro devorando uma estrela.
Ilustração mostra um buraco negro devorando uma estrela.Chandra
Nuño Domínguez
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Durante 500 dias, potentes sinais de raios-X chegaram à Terra vindos de uma galáxia remota. O mais surpreendente é que eram periódicos. Repetiam-se exatamente a cada 131 segundos. Para alcançar essa galáxia e conhecer a origem desses sinais, seria preciso viajar durante quase 300 milhões de anos a 300.000 quilômetros por segundo – a velocidade da luz –, algo totalmente impossível com a tecnologia atual. Agora, graças a vários telescópios espaciais, uma equipe de astrônomos conseguiu explicar o fenômeno e, de passagem, esclarecer como os buracos negros se alimentam.

A teoria da relatividade de Einstein prediz a existência desses corpos, cadáveres de grandes estrelas cuja enorme massa se concentra em uma superfície esférica reduzida, de forma que nada que cruze seu limiar pode escapar à força de gravidade, nem mesmo a luz. São invisíveis aos telescópios, mas graças à observação de seu entorno é possível conhecer melhor as diferentes categorias de buracos negros e seu comportamento.

Em novembro de 2014, vários telescópios captaram uma eclosão de raios-X vinda de um buraco negro com uma massa um milhão de vezes maior que a do Sol, e que fica no centro da galáxia em questão. É um corpo similar ao que existe no centro da nossa própria galáxia, a Via Láctea. O brilho ocorreu quando o buraco engoliu uma estrela que cruzou o chamado horizonte de acontecimentos, o limite além do qual nada pode escapar à sua atração.

“Um evento como esse acontece apenas uma vez a cada 50.000 anos em uma galáxia”

“Um evento como esse acontece somente uma vez a cada 50 mil anos em uma galáxia", ressalta Dheeraj Pasham, físico do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos. Sua equipe analisou as observações desse buraco negro feitas pelos telescópios espaciais XMM Newton, da Agência Espacial Europeia, e Chandra e Swift, da NASA. Todos captaram o mesmo sinal de raios X que chegava justo do horizonte dos eventos.

Graças a esses sinais, a equipe conseguiu calcular pela primeira vez a velocidade de rotação de um buraco negro: 150.000 quilômetros por segundo, ou seja, a metade da velocidade da luz, segundo um estudo publicado nesta quinta-feira na revista Science e apresentado no congresso da Sociedade Astronômica dos EUA, que se realiza em Seattle.

A hipótese da equipe é que parte da estrela não foi devorada, mas se desintegrou em uma nuvem de gás e poeira que permaneceu em órbita exatamente no horizonte do buraco. Os sinais periódicos são resultado da presença de outra estrela na mesma órbita, uma anã branca, que arrastou consigo a nuvem de poeira e produz as emissões periódicas de raios X. É um fenômeno extremamente raro que durará apenas algumas centenas de anos antes que o buraco engula essa outra estrela, explicam os responsáveis pelo estudo.

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O trabalho de Pasham permitirá explorar regiões do cosmos impossíveis de visitar e esclarecer a evolução desse tipo de buraco negro, fundamental para a evolução das galáxias que se formam ao seu redor. "Usando esses mesmos princípios", explica Pasham, pode-se inferir a rotação dos outros buracos negros supermaciços e até mesmo criar "uma função de distribuição para explicar como evoluíram os buracos negros supermaciços, desde o início dos tempos até agora", explica. Sobre os outros sinais periódicos, talvez não se volte a saber mais. "O sinal ficou ativo por 500 dias. Depois o brilho diminuiu radicalmente e não é mais detectável com nenhum telescópio", explica o astrofísico. Só se conhece outro caso deste tipo de sinal, acrescenta.

No ano passado foi captada outra poderosa explosão de raios X vinda de um lugar a apenas 10.000 anos-luz da Terra. Era um buraco negro de 10 massas solares que acabara de engolir uma grande quantidade de poeira e gás proveniente de uma estrela próxima. Uma equipe de astrônomos dos EUA e da Europa recorreu ao experimento Nicer, que começou a operar no ano passado a bordo da Estação Espacial Internacional, para mapear o buraco negro com base em suas emanações de luz. Em torno desses corpos forma-se um disco de gás e poeira a centenas de milhares de graus e submetido a uma grande velocidade de rotação, que acaba decompondo os átomos. Os prótons e nêutrons permanecem neste disco de acreção enquanto os elétrons formam uma nuvem logo acima do buraco, chamada de coroa. O estudo, publicado na capa da revista Nature, registrou como essa coroa se contrai dezenas de quilômetros, quando o buraco se prende a uma atração de matéria estelar e cospe as poderosas rajadas de raios-X.

É a primeira vez que algo assim é observado em um buraco negro próximo e de pequeno tamanho, os mais violentos. Os cientistas acreditam que podem usar esses corpos como análogos dos buracos supermaciços para estudar seus efeitos na evolução de galáxias distantes. A equipe já capturou outros quatro eventos similares com o instrumento a bordo da ISS, de acordo com Phil Uttley, coautor do estudo. "Estamos prestes a obter descobertas inovadoras", diz ele.

O QUE HÁ DENTRO DE UM BURACO NEGRO?

No universo há duas grandes classes de buracos negros. "Os de massa estelar são do tamanho de uma cidade e massas de até 10 sóis. Nascem de explosões de estrelas enormes", escreve Daryl Haggard, do Instituto Espacial da Universidade McGill, no Canadá, em um comentário publicado pela Nature. Os buracos supermaciços são do tamanho do sistema solar, concentram milhões ou bilhões de vezes a massa do Sol e residem no centro das galáxias." O que ainda é impossível saber é o que acontece com o que cai em um buraco. "De acordo com a teoria da relatividade de Einstein, nenhuma informação pode escapar de dentro de um buraco negro, porque para isso teria que viajar mais rápido que a luz [e a relatividade deixa claro que nada pode ser mais rápido que a luz]", explica Teo Muñoz Darias, do Instituto de Astrofísica das Ilhas Canárias. Somente graças a novas teorias ainda por demonstrar, como a gravidade quântica, seria possível começar a responder a essa pergunta.

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