Encontrados os ‘pontos de Hawking’, que poderiam ser vestígios de universos passados
Os pontos seriam criados pelo acúmulo da ‘radiação de Hawking’, que, embora ainda não tenha sido detectada, é aceita no campo da física teórica
A teoria do Big Bang, que estabelece que o universo foi gerado em uma grande explosão há cerca de 14 bilhões de anos, foi uma revolução no pensamento humano. Embora tenha levado muitos anos para ser aceita majoritariamente pela comunidade científica, hoje a origem e o desenvolvimento do universo só podem ser compreendidos graças a essa teoria. Ir além do Big Bang exige muito esforço: o que aconteceu antes dessa grande explosão? Na chamada teoria padrão, o Big Bang não é apenas a origem do universo, mas também nasceram o espaço e o tempo, por isso não faz sentido perguntar o que houve antes dele. Em contraposição, o matemático e físico Roger Penrose propõe em sua teoria cíclica um modelo no qual um universo (éon) sucede outro, infinitamente.
Para formulá-la matematicamente, Penrose usa a chamada geometria conforme, uma geometria que preserva os ângulos, mas não necessariamente as distâncias. Segundo o físico matemático, as distâncias perdem importância, já que o universo cresce várias ordens de magnitude de forma acelerada. Escolhendo fatores de escala apropriados, Penrose “cola” os futuros remotos (ou final) de cada universo à singularidade inicial do universo seguinte. Esse modelo explica questões fundamentais, como a entropia inicial inusualmente alta que é observada.
Essa proposta escandalosa (nas palavras do próprio Penrose) revela-se matematicamente consistente. Mas, apesar disso, não foi levada em consideração pelas principais correntes da cosmologia, sobretudo porque não explica o que provoca a mudança de um éon a outro, para além de que isso seja possível matematicamente; e também porque surge de considerações teóricas e não de observações.
No entanto, recentemente, Penrose – ao lado de outros autores – afirma ter encontrado evidências de sua teoria na radiação cósmica de fundo. Essa radiação eletromagnética que é observada em todo o universo foi descoberta em 1964 e representou um dos mais fortes argumentos em favor da teoria do Big Bang: sua distribuição quase homogênea e sua temperatura encaixavam com as esperadas no modelo do Big Bang.
Agora Penrose e seus colaboradores descobriram pontos anômalos na radiação de fundo. A anomalia reside no fato de serem excepcionalmente quentes, em uma ordem de magnitude maior que a flutuação média. Isso não se encaixa bem com a teoria da inflação, que justamente explica a homogeneidade e a isotropia do universo.
Os autores os chamaram de pontos de Hawking, em homenagem a Stephen Hawking. O físico recentemente falecido descobriu que os buracos negros também emitem radiação, hoje chamada de radiação de Hawking. Embora nunca tenha sido detectada, porque é muito fraca, no campo da física teórica ninguém duvida de sua existência, uma vez que se baseia na teoria quântica de campos em espaços curvos, que foi confirmada por múltiplas observações diferentes em outras áreas.
Penrose considera que os pontos anômalos são criados precisamente pelo acúmulo dessa fraca radiação durante todo o processo no universo anterior (antes do Big Bang).
Esses pontos, portanto, seriam vestígios de universos passados, que sustentariam a teoria de Penrose. A comunidade cosmológica continua muito cética. Em primeiro lugar, questiona-se a existência desses pontos, uma vez que os dados foram analisados no passado por outros cientistas e até agora ninguém os tinha identificado. Será preciso manter a cautela, mas se sua existência for confirmada, será mais um passo para entender melhor a evolução do cosmos, independentemente de o modelo de Penrose estar correto ou não.
Ernesto Nungesser é pesquisador do Instituto de Ciências Matemáticas (ICMAT).
Ágata A. Timón é responsável pela Comunicação e Divulgação no ICMAT.
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