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Bolsonaro abre a era da extrema direita na presidência do Brasil

Com 56% dos votos válidos, o candidato do PSL derrota Fernando Haddad e será o 38 presidente da democracia a partir de 2019. Traz uma agenda conservadora que vai testar os limites do Judiciário e terá a pressão da esquerda, que sai enfraquecida das urnas

Carla Jiménez
Bolsonaro após votar no Rio de Janeiro neste domingo, 28
Bolsonaro após votar no Rio de Janeiro neste domingo, 28Antonio Lacerda (EFE)
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Os 'whatsapps' de uma campanha envenenada

O Brasil será governado por Jair Bolsonaro a partir de janeiro de 2019. Venceu o candidato que liderou a corrida presidencial desde o início, e será o 38° presidente eleito democraticamente no país. Prevaleceu o desejo da alternância de poder, e de arriscar o novo. Tudo menos a volta do PT ao poder, como ficou claro na última pesquisa Datafolha que mostrou seu adversário Fernando Haddad com um taxa de rejeição maior que a sua. Com  55,21% dos votos, ou quase 57 milhões de votos, o capitão da reserva, que assume o figurino da extrema direita no poder, conseguiu ‘fuzilar’ seu adversário nas urnas, e sobreviver aos movimentos de repúdio que seu nome suscitou, como o #Elenão, que levou centenas de milhares às ruas no final de setembro.

Nunca uma eleição havia provocado tanta angústia, medo e raiva, com uma violência que atingiu o próprio candidato. Ele quase perdeu a vida após o ataque com faca que lhe furou o intestino em um ato de campanha em Juiz de Fora, Minas Gerais no dia 6 de setembro. O Brasil teve ainda dois eleitores mortos por quem hostilizava o PT, um sentimento que marcou como nunca o pleito. Um na Bahia, e outro no Ceará. Foi o estresse que se estabeleceu num país que vive uma crise de identidade desde que a Lava Jato escancarou as entranhas do sistema político brasileiro. Foi nessa brecha que Bolsonaro se embrenhou, como o candidato antissistema, mesmo sendo deputado por 28 anos, tendo passado tempo em partidos que depois foram acusados de corrupção.

O estilo do novo presidente já ficou claro quando foi votar. Seguiu com um casaco verde da cor do Exército, e um colete a prova de balas, cercado de seguranças. Levará militares para seu ministério e promete seguir a disciplina do Exército para realizar o seu projeto de país. “Missão dada é missão a ser cumprida”, disse ele durante um Live assim que o resultado da eleição foi confirmado. Outro momento deste domingo que marca o perfil do novo presidente: antes de sair a público para fazer pronunciamento, entregou o microfone ao senador Magno Malta, que é também pastor evangélico. Ao lado da sua mulher, Michele, e de mãos dadas com toda a sua entourage, o novo presidente do Brasil acompanhou de olhos fechados uma espécie de oração conduzida por Malta. “Começamos esta jornada orando... os tentáculos da esquerda não seriam arrancados sem um apelo a Deus”, afirmou. 

Em seguida, fez um discurso de tom mais conciliador, num momento em que o mundo estava com os olhos ligados no Brasil. “Liberdade é um princípio fundamental. Liberdade de ir e vir, de andar nas ruas, liberdade de empreender, liberdades política e religiosa, de fazer escolhas e ser respeitados por elas”, discursou.

De fala rude, e estilo conservador, Bolsonaro foi questionado ao longo de toda a sua campanha por suas falar horríveis e insensíveis para ferir seus interlocutores no passado. Nada derrubou o capitão da reserva que já esteve preso por desrespeitar o próprio Exército. Tudo o que ele disse foi minimizado por ele e seus  quase 58 milhões de eleitores. O novo presidente promete fazer uma guinada no Brasil que votou pela alternância do poder e deu um recado de intolerância com a corrupção e os políticos que já estiveram no poder. Abraça uma agenda dos evangélicos, dos ruralistas e da bancada da bala, o bloco conhecido como BBB do Congresso, e vai testar os limites do Judiciário para pautas que pareciam superadas no Brasil. É o caso da liberação de armas, que hoje é rejeitada pela maioria da população.

Tem um caminho árduo pela frente diante da euforia que seu nome criou entre os eleitores. Há uma ansiedade para que a economia seja retomada depois de quatro anos pífios – recessão em 2015 e 2016, e recuperação pífia em 2017 e 2018. Os quase 13 milhões de desempregados esperam que a agenda do futuro ministro da Fazenda, Paulo Guedes, traga soluções rápidas e a confiança para que as empresas voltem a investir. “Falaremos com o seringueiro da selva amazônica e o empreendedor que cria sua empresa”, afirmou Bolsonaro.

Mas o futuro presidente ainda não deixou claro qual será sua forma de comunicação com a sociedade brasileira. Antes do discurso transmitido pelas televisões, ele falou por um Live no Facebook com seus seguidores e usou o estilo agressivo que o caracteriza. "Não poderíamos mais ficar flertando com o socialismo, o comunismo, o populismo e o extremismo da esquerda", afirmou, e lembrou: “Nossa bandeira, nosso slogan, eu fui buscar naquilo que muitos chamam de caixa de ferramentas para consertar o homem e a mulher, a Bíblia sagrada.”

A partir de agora, o Brasil começa a conhecer o mandatário que já teve arroubos como de tirar o Brasil da ONU, ou de aumentar o número de ministros do Supremo. Ele e seus emissários extrapolam em seus recados, até mesmo chocam, para depois se corrigirem. “Ué, não estava quase empatado? Vocês são o maior do engodo do jornalismo do Brasil. LIXO!”, escreveu o assessor de imprensa atual do gabinete do deputado e futuro mandatário, em mensagem por whatsapp para dezenas de jornalistas que cobrem política em Brasília logo após o resultado da pesquisa de boca de urna que o colocava mais de dez pontos à frente de Haddad.

Seria o prenúncio do que será a comunicação com o Governo de Bolsonaro? A medir pela queda de braço que ele já estabeleceu com a Folha de São Paulo, por publicar uma matéria sobre empresários que pagavam por mensagens via Whatsapp para favorecer o candidato – o que configura crime — a resposta parece afirmativa. Bolsonaro entrou com uma ação contra o jornal e seus acionistas e contra a repórter que escreveu a matéria no Tribunal Superior Eleitoral. O jornal recebeu 220.000 mensagens intimidatórias por causa da reportagem.

Alheios a esses bastidores, seus eleitores celebraram com fogos, e buzinaços em várias partes do Brasil quando seu nome foi confirmado. A campanha do PT para firmar uma mensagem de que a democracia estava em risco foi derrotada. Os eleitores de Bolsonaro não permitiram que os petistas se apropriassem dessa retórica e apontaram o combate à corrupção e a necessidade de alternância de poder para justificar seus votos. Em um colégio no bairro de Boa Viagem, no Recife, onde ocorreram os atos pró-Bolsonaro, a advogada Ana Guerra, 41, se dizia esperançosa com um governo do capitão reformado. "Acho que vai ser tudo diferente. Acredito em um país melhor e sem corrupção", diz, vestindo uma camiseta amarela com a foto de Bolsonaro nas costas. "E acho a alternância de poder importante. Passamos muitos anos com PT e vimos que não deu certo. Estão todos [os dirigentes] presos ou respondendo a algum processo. Bolsonaro pelo menos não é corrupto".

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José M. Abad Liñán

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