Por que essas gatas querem ser minhas amigas no Facebook?
Perfis falsos têm muitas utilidades – quase nenhuma delas honesta
Jennifer é uma loira explosiva, que se mostra com pouca roupa à beira de piscinas luxuosas. Naomi é uma exótica deusa de ébano que faz biquinho nas suas selfies. Nadia tem um olhar gélido que seria capaz de derreter a Patagônia. E todas elas querem ser minhas amigas, pelo menos no Facebook. O que será que essas gatas querem com um espanhol sem graça como eu?
Uma rápida olhada nos seus perfis desfaz o encantamento: elas não têm amigos em comum comigo (aliás, são mulheres de poucos amigos), e quase nenhuma atividade nos seus murais. Nos seus álbuns (que também são exíguos), às vezes nem parecem ser a mesma pessoa da foto do perfil. Elas me mandam mensagens inbox com links suspeitos. Que decepção. Tudo indica que são perfis falsos. Talvez você já tenha recebido solicitações de amizade de perfis como esses, ou de características semelhantes. Quem se esconde por trás dessas pessoas inexistentes? O que pretendem?
Os perfis falsos se prestam a inúmeras utilidades, quase nenhuma delas honesta. Desde proporcionar mais seguidores e curtidas a uma pessoa, partido, coletivo ou empresa até espalhar softwares maliciosos e extorquir os usuários. “Esses perfis podem ser criados por pessoas ou robôs, e estão na ordem do dia”, afirma Vicente Díaz, analista da empresa de segurança informática Kaspersky. “Eles podem tentar conseguir mais informações de alguém ou lhe tirar dinheiro. Também Estados ou grupos jihadistas podem praticar a espionagem cibernética dessa forma.” Em 2012, o Facebook estimava que entre 5 e 6% dos seus 845 milhões de usuários da época eram contas falsas.
Uma das práticas mais populares e com mais sucesso entre os criminosos cibernéticos é o chamado ransomware (de ransom, resgate, e ware, software). “Ocorre quando alguém convida você a clicar num link onde há, por exemplo, um divertido vídeo de um gatinho”, diz Díaz. Então o site pede que você instale um codec para ver o vídeo, que na verdade é um vírus que cifra todos os conteúdos do seu próprio computador – você se torna incapaz de acessar a sua própria informação armazenada... a não ser que pague o resgate. Sim, sequestraram o seu disco rígido. “Normalmente, o valor do resgate vai subindo com o passar dos dias, para criar uma sensação de urgência. E, se for bem feito, não há nada a fazer nem especialista ao qual recorrer, a única coisa que resolve é pagar essa quantia”, diz Díaz.
Em geral, quem tem um mínimo de prática no uso das redes sociais e da Internet rapidamente percebe o truque: os perfis falsos gritam. Entretanto, há pessoas incautas ou pouco acostumadas ao uso das redes que acabam mordendo a isca. “É muito barato montar uma infraestrutura para criar esses perfis e mandar as mensagens. Imagine que funciona, por exemplo, em 1% dos casos. Quanto mais mensagens fraudulentas você envia, mais chances tem de faturar”, diz o especialista. Recentemente, a Kaspersky detectou no Facebook um ataque de phishing contra mais de 10.000 vítimas em apenas dois dias. Um amigo pedia aos seus contatos que o mencionasse num comentário, e depois, através de um trojan, assumia o controle da conta.
“Por trás das atividades fraudulentas há grupos organizados de delinquentes cibernéticos, que na Europa costumam ser normalmente do Leste Europeu, cujo objetivo final é o dinheiro. Temos informações segundo as quais esse mundo já movimenta mais dinheiro que o narcotráfico”, diz Manuel Ransán, especialista em segurança digital do Instituto Nacional do Segurança Cibernética (INCIBE) da Espanha. Ransán aponta outra opção para enganar os internautas: levá-los a páginas com ofertas de falsos cupons de desconto, Viagra falso, etc.. “As opções são infinitas, são páginas que costumam estar associadas a linhas telefônicas de tarifa especial ou com serviços de mensagem premium. Aí chegam contas muito altas”, explica. Os invasores também podem transformar o seu computador num zumbi teleguiado, que ataca sites concorrentes ou envia spam.
Fora desse terreno, também há perfis falsos criados por pessoas comuns (ou, olhando bem, nem tanto): ex-namorados, inimigos do trabalho, conhecidos ressentidos etc., tentando nos prejudicar a qualquer custo. O uso de perfis falsos para travar uma guerra clandestina contra os nossos semelhantes se chama catfishing. Esses perfis podem tentar saber mais sobre nós, para nos chantagear ou controlar, ou para difundir informações delicadas sobre nossas vidas num esforço para torná-la impossível, ou mesmo para tentar nos seduzir.
O documentário Catfish, lançado por Henry Joost e Ariel Schulman em 2010, é uma boa amostra dos transtornos que isso pode causar, ao retratar a relação sentimental via Facebook de um jovem nova-iorquino com uma pessoa que, na verdade, se faz passar por outra. Relacionamentos à distância com alguém que só conhecemos por algumas fotos e umas poucas mensagens trocadas on-line às vezes terminam em casamento, como já vimos muitas vezes em edulcorados programas de TV, mas em outras, a maioria, acabam em duras decepções.
Dentro dessas atividades, que têm mais a ver com a habilidade de iludir do que com a tecnologia propriamente dita, também podem ser reproduzidos modelos que já eram usados via e-mail, no tempo em que as redes sociais não existiam: a russa tentadora que tenta lhe seduzir e o convence a comprar passagens aéreas para visitá-lo (depois, claro, ela nunca aparece); o nigeriano misterioso que pede um dinheiro para completar certos trâmites e assim poder lhe deixar uma herança abandonada (que tampouco aparece).
“Fizemos muitos progressos na construção de um sistema que mistura métodos automáticos e manuais para bloquear contas utilizadas com propósitos fraudulentos e de falsas curtidas”, diz uma fonte do Facebook. “Grande parte da atividade fraudulenta segue padrões, graças a ataques automatizados de spammers, e observando isso aumentamos muito a nossa capacidade de detectar e bloquear abusos.” A ajuda dos próprios usuários também é valiosa: para denunciar uma conta falsa, basta visitar o perfil suspeito, apertar o botão “denunciar” e seguir as instruções.
“Às vezes aceitamos desconhecidos e achamos que não tem problema, porque está lá e não interagimos com eles”, disse Ransán, “mas ficamos expostos a que essa pessoa obtenha toda a nossa informação e nos engane por meio de um link ou download”. Para evitar problemas, use o bom senso: não inclua nas suas redes sociais gente que você não conheça pessoalmente e que lhe pareça suspeita. Mesmo que sejam moças lindas, posando à beira de piscinas luxuosas, com trajes sumários e fazendo biquinho.
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