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Banco Mundial: “Recessão no Brasil não se justifica. País sairá logo da crise”

Para Augusto de la Torre, economista-chefe do Banco Mundial, as incertezas políticas limitam retomada do crescimento

O economista chefe para a América Latina do Banco Mundial, Augusto da Torre, fala na apresentação do informe "Empregos, salários e a desaceleração na América Latina"
O economista chefe para a América Latina do Banco Mundial, Augusto da Torre, fala na apresentação do informe "Empregos, salários e a desaceleração na América Latina"Ernesto Arias (EFE)

Augusto de la Torre, chileno, economista-chefe do Banco Mundial para a América Latina, lamenta o protagonismo do Brasil e sua recessão durante o encontro do FMI, que acontece em Lima, no Peru, esta semana. Na opinião de De la Torre, a recessão brasileira “é um mistério”. “Os índices macroeconômicos não justificam uma recessão tão profunda”. Para o especialista chileno, o trabalho que tem sido feito pelo atual ministro da Fazenda brasileiro, Joaquim Levy, é admirável; a moeda “tem se sustentado bem”, aguentando o embate e se desvalorizando corretamente, mas a demanda interna “não consegue se relançar”. E a causa disso deve ser atribuída às “incertezas políticas”. Ou seja: na crise política que evidencia a fragilidade institucional de Dilma Rousseff, que se encontra de mãos atadas diante de um Congresso hostil.

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O economista-chefe, porém, se diz convencido de que o Brasil sairá de sua crise econômica dentro de alguns meses. Por quê? “Porque a economia está encontrando caminhos para se ajustar. Se houver uma resposta política positiva, ela se reajustará bem; caso contrário, não; mas, de toda forma, acabará por se reajustar. E, uma vez digerida a atual crise, o que se mantém é a capacidade de reação das economias nacionais. Quando olhamos para o Brasil, que é uma economia gigantesca, sabemos que possui uma grande capacidade de reação”.

Ainda a respeito do Brasil, De la Torre comentou as aparentes diferenças existentes entre alguns países latino-americanos, como a Colômbia, o Chile e o Peru, membros da Aliança do Pacífico, que atravessam a crise em melhores condições, e o Brasil e a Argentina, que afundam. Não há o risco de se abrir uma fenda no continente? “Os países, quando a economia vai bem, são parecidos uns com os outros; mas isso não acontece da mesma forma quando ela vai mal. Nesse caso, as diferenças estruturais vem à tona. Por isso, é possível que alguns países percam o compasso, especialmente aqueles que não realizaram as reformas necessárias”, explica.

E acrescenta: “Há ditaduras que fazem reformas sem ouvir muito as pessoas. Nas democracias pulsantes, como as latino-americanas, isso é impossível. Assim, as democracias latino-americanas precisam encontrar o equilíbrio entre produtividade e desigualdade. O que não é nada fácil”.

Salário mínimo flexível

De la Torre destaca, ainda, o papel que a política de valorização do salário mínimo, implementada no Governo Lula, teve enquanto alavanca econômica. Mas, defende que se trata de um instrumento importante apenas para os tempos de vacas gordas. “Nos tempos de vacas magras, o salário mínimo não é inimigo daquele que está empregado, é claro, que está satisfeito, tem voz ativa e está organizado. Quem não é ouvido, porém, é o desempregado, que não está organizado. Cria-se, assim, uma espécie de desigualdade, pois aquele que se encontra na pior situação, o desempregado, não tem voz ativa”.

O economista tem algumas propostas para tornar o salário mínimo mais flexível: que seja diferente para cada empresa, já que as pequenas empresas têm mais dificuldade para contratar do que as grandes; ou, que ele seja diferente conforme a idade dos trabalhadores, de forma que os jovens recebam menos, ou que esses jovens trabalhem mais horas pela mesma remuneração. E conclui: “O salário mínimo que nos convém em tempos de vacas gordas não é o mesmo que nos convém em tempos de crise”.

Falar em diminuir o salário mínimo, porém, é um tabu social em qualquer lugar do mundo. La Torre, ao contrário, entende que o salário mínimo se torna um inimigo do emprego quando a economia patina e o desemprego cresce, como ocorre hoje em muitos países da América Latina. Ele defende que essa conquista dos trabalhadores (“da qual Marx já falava”, lembra) não deve ser vista apenas como um tema delicado, mas sim à luz dos ciclos econômicos. “É um tema delicado, relacionado a questões filosóficas e ideológicas.

No mundo moderno, o salário mínimo deve garantir condições de vida razoavelmente humanas. “Mas devemos evitar as paixões, para poder focar naquilo que realmente importa, que é a qualidade do emprego”, acrescenta. O economista explica, também, que o trabalhador qualificado, detentor de habilidades e de formação, não se preocupa com o salário mínimo, pois ganha bem acima disso. “Mas quem se preocupa, sim, é a empresa, que é obrigada a contratar tanto os mais qualificados quanto os não-qualificados. E, se o salário mínimo é muito elevado, ela simplesmente deixa de contratar”. Ele continua: “Nesse caso, pode acontecer algo inesperado. Pretendíamos proteger o trabalhador, para que ele tivesse uma vida decente, mas perdemos o controle por questões políticas e, em tempos de retração econômica, esse salário mínimo se torna um inimigo do emprego”.

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