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As novas rotas da seda da China

Megaprojeto pretende conectar a China com a Europa por via terrestre e marítima

Macarena Vidal Liy
Primeiro trem de direto da China chega a Madri, em dezembro.
Primeiro trem de direto da China chega a Madri, em dezembro.Julián Rojas

O que o trajeto de trem mais longo do mundo, o porto de Pireus e um centro logístico no Cazaquistão têm em comum? Ou Duisburg, na Alemanha, as ilhas Maldivas e Gwadar, no Paquistão? A resposta é a China.

Todos formam parte do ambicioso conceito que Pequim transformou em uma das grandes prioridades de sua política exterior: a criação de extensas redes de transporte, conexões e infraestrutura que partam da China e, por via terrestre e marítima, cheguem à Europa. O Governo chinês batizou a iniciativa de Novas Rotas da Seda e pretende completá-la até 2025. O projeto prevê investimentos de 40 bilhões de dólares (113 bilhões de reais). E também inclui acordos de construção e empréstimos na Ásia Central em torno de 54 bilhões de dólares (153 bilhões de reais).

O Governo chinês quer completar a rede de infraestrutura até 2025

Caso funcione —e Pequim está concentrando esforços políticos e meios econômicos para isso—, o projeto proporcionará à China um volume potencial de comércio exorbitante, em uma área de 4,4 bilhões de pessoas e com um terço da riqueza mundial. E aumentará exponencialmente a influência global da segunda economia do mundo diante dos EUA, que por sua vez se volta para a região Ásia-Pacífico. Mas praticamente todos os detalhes do projeto ainda precisam ser definidos.

“As chamadas Novas Rotas da Seda são projetos de diplomacia econômica, mas sua realização concreta está incerta no momento, com exceção do desenvolvimento da infraestrutura. Muitos países vizinhos da China se perguntam como podem ser beneficiados. E os altos funcionários de instituições de pesquisa da China se perguntam como aplicar sobre o terreno esse conceito geral, decidido pelas instâncias mais altas do Governo central”, destaca por e-mail Alice Ekman, pesquisadora responsável da China no Instituto Francês de Relações Internacionais (IFRI).

O presidente chinês, Xi Jinping, propôs o projeto de rota terrestre pela primeira vez em outubro de 2013, durante uma visita ao Cazaquistão. Um mês depois, na Indonésia, discutia a rota marítima. Pequim afirma que 50 países mostraram interesse no projeto.

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Embora alguns países, como a Índia, demonstrem certa reserva, outros anunciaram sua adesão, interessados no investimento que possam receber do gigante asiático. O novo Governo do Sri Lanka, depois de se mostrar inicialmente contra o projeto, deu finalmente o sinal verde este mês para o porto que a China está construindo em Colombo.

Segundo o rascunho fornecido por Pequim, o braço marítimo, o “cinturão”—de grande importância para o país, já que 90% de seu comércio é realizado por via marítima—, sairia do leste da China para atravessar o Estreito de Malaca e, através de Bangladesh, Sri Lanka e Paquistão, continuaria pelo Mar Vermelho até o porto de Pireus, em Atenas.

O braço terrestre atravessaria a China de leste a oeste e, através da região de Xinjiang, chegaria aos países da Ásia Central para continuar até a Europa, uma alternativa mais rápida para o transporte de produtos do que a atual via marítima. Nessa rede de trajetos está incluída a rota ferroviária Madri-Yiwu, a mais longa do planeta e ainda em fase experimental.

Uma das grandes vantagens que a China obtém com o plano —além de conseguir novas rotas de abastecimento e distribuição— é o desenvolvimento de infraestrutura em países vizinhos, num momento em que esse setor perde fôlego no mercado interno diante do desaquecimento da economia. E, se esses países são ricos em energia, pode tentar receber acesso privilegiado a esses recursos, em troca das obras.

Sob a perspectiva da segurança, afirma Vikram Nehru, do Carnegie Endowment for International Peace, “há quem diga que, na hipótese de que haja um conflito e não possa acessar facilmente o comércio através do Pacífico, a China sempre teria a rota ocidental por terra para alcançar a Europa e ter acesso a matérias-primas e energia”.

O desenvolvimento da rota terrestre permitirá também à China desenvolver as províncias mais pobres do centro e do oeste, que não se beneficiaram tanto do boom econômico dos últimos 20 anos no país, como as regiões do leste.

Mas essa rota terrestre, alerta Ekman, “pode enfrentar ainda muitos desafios em seu desenvolvimento. Pode, por exemplo, gerar uma competição econômica com outros atores regionais. Assim, o reforço da presença econômica chinesa em vários países da Ásia Central pode competir com os interesses russos a longo prazo e, com isso, pode ser que Moscou não a receba de braços abertos. Além disso, a segurança das rodovias (contra redes de contrabando, ataques terroristas) também pode se tornar um desafio significativo, à medida que se desenvolvam e se valorizem”.

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