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Os EUA enviam jovens latinos para Cuba para promover uma mudança na ilha

A empresa responsável pelo programa tem relação com o Zuzuneo, o polêmico twitter cubano

Dois passageiros chegam ao aeroporto de Havana.
Dois passageiros chegam ao aeroporto de Havana.EFE

Na aparência, eles eram jovens viajantes da Venezuela, do Peru e da Costa Rica que visitavam Havana e Santa Clara para fazer turismo ou realizar serviço voluntário. Mas o que uma investigação jornalística publicada neste domingo pela agência Associated Press (AP) revelou é que uma dúzia desses jovens latino-americanos que chegaram em Cuba durante os últimos dois anos foram enviados para lá como parte de um plano secreto gerido pela Agência Internacional dos Estados Unidos para o Desenvolvimento (USAID, na sigla em inglês) para “identificar atores sociais que possam causar uma mudança social na ilha”.

A empresa de Washington responsável pelo programa, a Creative Associates Internacional, teve também “um papel fundamental” no desenvolvimento do Zuzuneo: uma rede social de mensagens de textos conhecida como o ‘twitter cubano’ e secretamente concebida por Washington para fazer circular conteúdos políticos que inspirassem uma primavera cubana, levada ao conhecimento público em abril através de outra reportagem da AP. Ambos os planos foram executados na mesma época em que foi detido na ilha o norte-americano Alan Gross, que trabalhava também como contratado da USAID na implementação do programa para melhorar as comunidades e o acesso à internet da comunidade judia cubana. Gross está preso desde 2009, condenado à 15 anos de prisão por espionagem e subversão.

Nesse caso, se tratavam de agentes inexperientes, que não contavam com recursos nem proteção para escapar da contra-inteligência cubana e sair intactos de uma tarefa arriscada, segundo explica a AP nessa investigação baseada em entrevistas e documentos obtidos em seis países do hemisfério sul. Alguns desses jovens receberam treinamento de meia hora apenas antes de partir na missão. Um comunicado dirigido a eles do qual a agência teve acesso incluía mensagens como estas: “Apesar de que nunca existe a certeza total, confie que as autoridades não querem causar a você danos físicos, somente assustá-lo (a), “Lembre que o Governo cubano prefere evitar reportagens negativas da imprensa no exterior, portanto um estrangeiro espancado não os convém”. Tampouco tinham o respaldo de uma rede de apoio que ajudasse em caso de detenção.

A agência de ajuda ao exterior dos Estados Unidos afirma que não teve nenhum plano “secreto nem clandestino”

Em uma ocasião, esses jovens participaram de eventos de fachada, como oficinas para a prevenção de doenças como o HIV, que, segundo um relatório citado pela AP, eram “a desculpa perfeita” para entrar em contato com comunidades de cubanos e persuadi-los a se converter em ativistas políticos. Para realizar essa tarefa, os garotos recebiam pagamentos de apenas cinco dólares (11 reais) por hora.

A USAID respondeu ontem que o plano “não é secreto, nem encoberto, nem clandestino” e que faz parte dos programas financiados pelo Congresso dos EUA para fortalecer a sociedade civil cubana, disponíveis no site da internet foreignassistance.gov. O porta-voz da agência, Matt Herrick, disse que a história publicada pela AP faz “afirmações sensacionalistas contra trabalhadores de ajuda humanitária para apoiar os programas da sociedade civil e a luta para dar voz a essas aspirações democráticas”. “Isso é incorreto”, assinala Herrick. Na reportagem, a agência de notícias assegura que a USAID se negou a revelar o custo desse plano e que se limitou a informar de que “trabalha com grupos de jovens independentes em Cuba em projetos de serviço comunitário, de saúde pública, de artes e em outros temas que envolvem o público, em conformidade com nossos programas de fomento da democracia em todo o mundo”.

O senador republicano da Flórida Mario Díaz-Balart criticou a reportagem e apoiou a versão oferecida pela Administração de Barack Obama através de um comunicado no qual disse que “as atividades pró-democracia”, como essas, “devem ser feitas com discrição, porque os atos mais inócuos são considerados crimes nos Estados totalitários”. “É de se indignar que a AP abandone toda a pretensão de objetividade e publique uma reportagem de impacto, abertamente tendencioso, contrário a um programa que goza de um amplo apoio bipartidário. Por acaso se opõe de maneira similar aos esforços da democracia em outras sociedades oprimidas como o Irã, a Bielorrússia e a Coreia do Norte?”, disse o congressista de origem cubana.

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