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Coluna
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Brasil, a mina de ouro

Poderia o país se transformar agora em uma nova Meca do turismo mundial?

Juan Arias

A Copa recém-jogada, embora perdida dolorosamente pela seleção pentacampeã, revelou uma nova mina de ouro para este país: a das enormes possibilidades de incrementar o turismo, hoje um dos mais fracos do mundo e até da América Latina. Poderia o Brasil transformar-se em uma nova Meca do turismo mundial?

Talvez pela primeira vez durante os jogos se encontraram em solo brasileiro pessoas de 203 países diferentes, com um total de turistas que superou o milhão.

E foram esses turistas que fizeram com que se abra os olhos para as possibilidades que o gigante americano possui de fomentar um dos setores que tornaram prósperos os principais países da Europa e os Estados Unidos da América.

Se existia a ideia de que o Brasil, com apenas seis milhões de turistas por ano, nunca iria ser um dos países que são destino do turismo mundial, o fato de que 95% dos estrangeiros que vieram assistir aos jogos tenham afirmado que “desejam voltar” desmente a profecia pessimista.

Desse milhão de turistas, 61% não conhecia o Brasil e pensa em retornar. Um turismo que também mobilizou três milhões de brasileiros que aproveitaram a oportunidade para fazer turismo interno e, embora possa parecer estranho, muitos deles nunca tinham visitado cidades como Rio, Manaus e até São Paulo.

E ao Brasil, como já escrevi neste mesmo jornal, desde sempre lhe faltam turistas, principalmente se comparamos esses 6 milhões anuais com os 78 milhões que visitam a França; os 53 da Espanha, os 30 da Itália, países, alguns deles, que são até dez vezes menores que o Brasil. Os Estados Unidos recebem a cada ano 60 milhões de visitantes, o Canadá, 35, e a China, 55. E neste mesmo continente, por exemplo, México, Peru e Argentina recebem mais turistas que o Brasil.

O entusiasmo demonstrado pelo milhão de estrangeiros vindos para a Copa, falando todas as línguas e que confessaram querer voltar, seduzidos pelas belezas naturais e artísticas do Brasil, a simpatia de seu povo e a própria gastronomia, é uma amostra do rio de multidões estrangeiras que poderia vir com uma política mais bem definida, como se fez, por exemplo, na Europa, onde foi criada infraestrutura turística de primeira categoria, que oferece comodidade, preços acessíveis e o profissionalismo dos trabalhadores do setor.

Foi positivo o fato de um milhão de estrangeiros visitar o Brasil durante a Copa, mas esse número é o que chega em média por mês à Espanha ou França. Seis milhões continua sendo muito pouco para este imenso país com tanta riqueza artística, natural e humana.

O que tem freado até agora o turismo brasileiro, quando, ao mesmo tempo, como o entusiasmo pela Copa revelou, é um dos países que todos desejariam poder visitar uma vez na vida?

São várias as causas apontadas pelos especialistas, até mesmo no Ministério do Turismo. O primeiro problema é que vir ao Brasil hoje e viajar por seu interior de avião é mais caro que visitar países até muito mais distantes no Planeta. É costume dizer que os brasileiros ricos viajam pelo Brasil e os outros vão para o exterior porque lhes sai mais barato.

Viajar por estradas no Brasil dá medo aos turistas porque, acostumados às rodovias da Europa e dos Estados Unidos ou aos trens de alta velocidade, elas parecem ser estradas da morte.

São caros, poucos e geralmente mal administrados os hotéis nas cidades mais turísticas como o Rio de Janeiro ou nos lugares das praias paradisíacas do Nordeste. E não menos importante é o medo de acabar sendo vítimas da violência.

Tudo isso, porém, as autoridades poderiam resolver talvez em menos de dez anos, É só questão de vontade política, como ocorreu na Europa e ocorre hoje na Ásia.

A novidade do Brasil é que possui como poucos um território imenso que pode ser visitado numerosas vezes sem se repetir um só lugar belo e interessante. Além dessa peculiaridade, o Brasil possui a cartada única do calor humano de seu povo; a capacidade de aceitar os estrangeiros e sua ausência de discriminação e de fobias existentes hoje em outros países.

Milhões vão todos os anos a países nos quais os próprios turistas reconhecem que os habitantes não são nem simpáticos nem sempre acolhedores.

É verdade que durante a Copa a chegada dos estrangeiros aos aeroportos e todos os serviços que lhes foram preparados superou em muito o que os brasileiros encontram quando viajam normalmente pelo país. Tudo lhes foi facilitado, a burocracia foi reduzida, multiplicaram-se as informações e os sorrisos e, principalmente, se sentiram protegidos desse inferno da insegurança pública que tortura todos os cidadãos locais. Uma pesquisa recente em São Paulo, por exemplo, aponta a insegurança pública como o mais importante e temido problema, acima da inflação e do desemprego.

Poderiam essas mesmas facilidades oferecidas aos turistas da Copa se manterem para sempre? Poderiam os brasileiros nas grande cidades se sentirem tão seguros e protegidos como foram os estrangeiros chegados ao Brasil?

Talvez sem o medo de ser vítima da violência da rua difundido pelas Chancelarias do mundo, ao alertarem sobre os perigos do país aos turistas que viriam ao Brasil durante a Copa, em vez de um milhão de estrangeiros poderiam ter sido ainda muitíssimos mais.

A experiência da Copa será útil para dar uma reviravolta em toda a política turística brasileira, capaz de explorar essa nova mina de ouro que tem servido a tantos outros países, e não só para fortalecer e sustentar as bases de sua economia, mas também para que pudessem enfrentar a terrível crise financeira de 2008?

Se um dia conseguir isso, o Brasil terá perdido a Copa da bola, mas terá ganhado a aposta do até hoje adormecido turismo internacional.

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