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O falso Ronaldinho que surpreendeu Messi

O treino aberto da Argentina desencadeia uma delirante invasão de torcedores em campo

Diego Torres
Messi e o sósia do Ronaldinho.
Messi e o sósia do Ronaldinho.Ronald Martinez (Getty)

O estádio Independência, em Belo Horizonte, carregou-se de uma tensão estranha. Havia entre cinco e dez mil pessoas. Metade argentinos, metade brasileiros. Jovens em sua maioria, adultos, algumas mães, crianças, gente tranquila, baderneiros, trabalhadores e integrantes desse grupo confuso que a imprensa local chama de "malandragem". A capital de Minas é um lugar em que cada gesto, cada movimento, cada palavra se faz de forma bem determinada, porque eles mostram que a pessoa pertence a uma classe social. Os trabalhadores mais ricos da cidade foram minoria na multidão que foi ver Messi na quarta-feira.

As pessoas se apertaram nas arquibancadas e esperaram. As luzes iluminaram quatro campos de futevôlei sobre o gramado e fez-se o silêncio. Durante alguns minutos, acumularam-se o nervosismo, a ansiedade, os sentimentos da espera. Cada funcionário da seleção argentina que colocava a cabeça na porta da entrada norte provocava uma onda de murmúrios e assovios. A multidão gemia. Quando por fim se abriram as portas e apareceram os jogadores, o pequeno artilheiro do Barcelona puxou a fila. Trotando, à frente, sozinho, seguido por Zabaleta, a um metro de distância, deu uma volta no gramado em meio a um zumbido estrondoso de palmas, cantos e vaias. A declaração de amor e ódio foi simultânea. Excêntrica. Como se o demônio houvesse entrado na Copa do Mundo.

O sósia de Ronaldinho cumprimenta Messi.
O sósia de Ronaldinho cumprimenta Messi.DENNIS M. SABANGAN (EFE)

Lionel Messi acenou com a mão para a multidão esquizofrênica com camisetas de Argentina e Brasil. Depois, jogou futevôlei, sem tocar a bola com os pés. Os companheiros passavam a bola para que ele tocasse de cabeça, e ele executava com a malícia de quem é doente de tão competitivo. Se esticava sobre a rede e cabeceava com força. Como se não pudesse se permitir uma derrota. Nem no futevôlei.

No fim do treino aberto que a FIFA obriga cada seleção a fazer no Brasil, os jogadores se juntaram e fizeram uma fila no alambrado, onde o ônibus esperava por eles. Eles já se distanciavam quando, das arquibancadas, surgiu um sujeito baixinho com um boné que, de longe, parecia sujo e gasto. Ele superou o fosso com um salto, caiu sobre o gramado como um antílope e correu diante dos olhares atônitos dos gigantes responsáveis pela segurança. Ao ver Messi, o homem jogou-se a seus pés e, tirando o boné, limpou-lhe a chuteira direita enquanto fazia reverência. Perplexo e divertindo-se, o capitão argentino tirou a camiseta e deu ao torcedor.

A lentidão dos corpulentos seguranças inspirou outros torcedores. Um, dois, três, quatro, cinco... Se não foi uma invasão de campo, foi muito parecido. O público soltou um grito de assombro ao ver que um dos invasores era Ronaldinho Gaúcho. Era Ronaldinho Gaúcho? Os mesmos trejeitos, os mesmos olhos saltados, o mesmo cabelo encaracolado preso com uma bandana preta, a mesma corrida imprevisível. Tudo igual, não fosse um detalhe: não tinha nenhum patrocinador. Estava descalço. Era pouco solene.

Se esticava sobre a rede e cabeceava com força. Como se não pudesse se permitir uma derrota. Nem no futevôlei.

As pessoas foram ver o treinamento da Argentina como quem peregrinava ao encontro do sobrenatural. A presença de Messi causa comportamentos irracionais. Mas o mais próximo do indescritível que os peregrinos viram foi a invasão destes garotos brasileiros aparentemente desesperados para se divertir, para se exibir ou, simplesmente, para existir.

O Ronaldinho desconhecido foi alvo de várias entrevistas. Houve câmeras que se amontoaram e outros o perseguiam como microfones para registrar seu depoimento na rua, uma vez que os gigantes da segurança e a polícia militar o expulsaram do campo. Alguém perguntou sobre a semelhança com Ronaldinho e ele, descalço sobre o asfalto, contou que um dia se encontrou com o original e disse que era seu 'clone'. Depois, ele sorriu ao lembrar-se da resposta do ídolo: "Você, meu clone? Mas você é muito feio!".

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