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Elena Poniatowska, uma voz para os sem terra

A escritora e jornalista mexicana recorda Gabriel García Márquez em seu discurso ao receber o prêmio Cervantes

Foto: reuters_live | Vídeo: EL PAÍS LIVE

O discurso de Elena Poniatowska ao receber o Prêmio Cervantes discorreu sobre o assombro diante do silêncio e do esquecimento vivido pelas mulheres e os mais pobres que devem migrar em busca de melhores oportunidades. "O silêncio dos pobres é um silêncio de séculos de esquecimento e marginalização", afirmou a escritora e jornalista mexicana.

Poniatowska é a quarta mulher a receber o prêmio —frente aos 35 homens ganhadores do Cervantes— mas a primeira a subir ao palco porque Ana María Matute estava em cadeira de rodas, María Zambrano não conseguiu ir e Dulce María Loynaz enviou uma pessoa que a representasse. A autora é também a quinta ganhadora mexicana do Cervantes, depois de Octavio Paz, Carlos Fuentes, Sergio Pitol e José Emilio Pacheco.

Mas, antes de mais nada, vestida com o traje tradicional mexicano vermelho e amarelo que as mulheres de Juchitán lhe deram, Poniatowska quis recordar García Márquez. Com as orelhas tocadas e enfeitadas com a magia dos peixinhos de ouro feitos e desfeitos pelo coronel Aureliano Buendía no final de seus dias pela graça do Nobel colombiano em Cem anos de solidão, disse: “Antes de Gabo éramos os condenados da Terra. Mas com seus Cem anos de solidão deu asas à América Latina. E é esse grande voo o que hoje nos envolve e faz com que cresçam flores na nossa cabeça”. Suas palavras e seu tom davam fé de como dizia que se sentia à agência Efe, pouco antes do discurso: "Nervosíssima".

Contar, contar, contar... É o verbo preferido de Poniatowska. É seu verbo natural. E isso fez esta manhã, para contar um pedacinho da história triste das mulheres e dos mais desfavorecidos. Com suas palavras, criou uma grande crônica da zona na sombra da América Latina. Algo que contou nos  60 anos que exerce o jornalismo. Crianças, mulheres, idosos, presos doentes e estudantes caminham ao lado desta repórter que busca ir além da própria vida, estar nas outras vidas.

A América indígena e desfavorecida, representada por uma mexicana culta de origem polonesa. Isso foi Poniatowska na entrega do Cervantes na Universidade de Alcalá de Henares, na comunidade autônoma de Madri. Lembrou que o jornalismo também pode ser literatura e, sobretudo, que a leitura e a cultura são essenciais para o ser humano, especialmente em um continente onde o índice de analfabetismo é muito alto, a pobreza aumenta e os governos não prestam muita atenção aos pobres. "Antes de que os Estados Unidos pretendessem engolir todo o continente, a resistência indígena alçou escudos de ouro e cocares com penas de quetzal e os levantou ao alto quando as mulheres de Chiapas, antes humilhadas e furtivas, declararam em 1994 que queriam escolher seu homem, olhar nos olhos, ter os filhos que desejavam e não ser trocadas por uma garrafa de álcool".

Depois de denunciar o eclipse que viveram e vivem ainda essas mulheres, a escritora evocou seu alegre assombro pelo idioma espanhol que começou a descobrir aos dez anos quando sua família se mudou ao México. E de uma criança que passou de dizer merci a se divertir pronunciando palavras como obrigado e parangaricutirimicuaro

Na terra de Miguel de Cervantes vive hoje uma mulher tão sensível quanto combativa. Uma jornalista que começou a se dar conta da realidade e a contá-la há 60 anos, quando em 1954 a contrataram no jornal mexicano Excelsior. Desde então, quase cinquenta livros jornalísticos, ensaios, novelas e biografias. Desde grandes reportagens e crônicas como La noche de Tlatelolco e Las soldaderas, até El universo o nada, a biografia novelada de seu marido, Guillermo Haro; passando por novelas como A pele do céu (publicado em português) ou Hasta no verte, Jesús mío.

Não apareceu cavalgando como Sancho Panza, personagem do livro Dom Quixote de Miguel de Cervantes, mas se comparou a ele. "Sou uma Sancho Panza feminina. Uma escritora que não pode falar de moinhos porque já não os há, mas fala dos andarilhos comuns que carregam sua sacola, sua picareta ou sua pá, dormem à boa ventura e confiam em uma cronista impulsiva que retém o que lhe contam".

Poniatowska é criadora de uma obra que conjuga diferentes registros para ver a vida. O resultado, segundo o júri do Cervantes, é “uma brilhante trajetória literária em diversos gêneros, de maneira particular na narrativa e em sua dedicação exemplar ao jornalismo. Sua obra se destaca pelo seu firme compromisso com a história contemporânea. Autora de obras emblemáticas que descrevem o século XX desde uma projeção internacional e integradora. Elena Poniatowska constitui uma das vozes mais poderosas da literatura em espanhol destes dias".

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