Os países emergentes contra-atacam para conter a crise cambial
Turquia defende sua moeda com uma espetacular elevação das taxas de juros
Os mercados emergentes perdem sex appeal à força. A crise cambial que contagiou a Argentina na velocidade de um relâmpago serviu para acionar os alarmes sobre o problema que o país enfrenta desde maio do ano passado: o Federal Reserve (Fed), banco-central dos Estados Unidos, advertiu que a retirada dos estímulos monetários não podia ser adiada e que os grandes fluxos de dinheiro começaram a abandonar as potências em desenvolvimento.
A resposta ao colapso das moedas vivido atualmente pelos emergentes também veio de seus bancos centrais: a Índia surpreendeu na terça-feira com um aumento inesperado das taxas de juros. Porém, o banco central da Turquia foi mais contundente ao decidir anunciar de última hora um aumento drástico das taxas de juros após uma reunião de emergência convocada na terça-feira. Assim, nas operações de financiamento de um dia, os juros passaram de 7,75% a 12%, enquanto que nas operações de uma semana, que é a principal referência de liquidez da entidade, as taxas passaram de 4,5% para 10 %.
O objetivo de uma medida tão ousada é defender a moeda nacional, a lira, contra ataques especulativos. E num primeiro momento parece que a medida foi bem sucedida. Após o anúncio do aumento (noite de terça-feira no horário de Brasília), a moeda turca recuperou 3,3% em relação ao euro, ficando abaixo de 3 liras, enquanto que em relação ao dólar também foi registrado uma valorização de 3%. As autoridades turcas querem enviar uma mensagem clara não só aos mercados, mas aos próprios investidores para frear a fuga de capitais que aflige o país. Além disso, também devem ocorrer restrições na política monetária argentina, origem das turbulências dos últimos dias.
Pelo segundo dia consecutivo, a depreciação das moedas foi contida, os bancos centrais de países emergentes cessaram o impacto, embora os problemas subjacentes permanecem: a perda de fluxos de capital, o crescimento mais lento, a dependência excessiva de uma China com problemas de crédito que também tirou o pé do acelerador e matérias-primas a preços baixos. “Quando há liquidez, vale tudo, mas isso é ruim para os países dependentes de financiamento externo”, diz Francesc Balcells, chefe de mercados emergentes da Europa Pimco, a maior gestora de títulos do mundo. Dentro dos emergentes “quem vai sofrer mais são os que têm mais dívida e déficit em conta corrente, como Argentina, Turquia e Ucrânia.”
Os investidores esperam mais ações das autoridades monetárias para aumentar o preço do capital e, com isso, conter as altas dos preços e a depreciação de suas moedas no mundo.
A Índia aumentou surpreendentemente suas taxas de juros em 0,25 ponto, para 7,75%, no que foi o terceiro aumento desde que Raghuram Rajan, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), assumiu o controle do banco central em agosto. A medida, que segue o caminho empreendido nos últimos meses por um Brasil preocupado com a inflação, deixou o mercado boquiaberto – apenas três dos 45 analistas consultados pela Bloomberg haviam considerado essa possibilidade – e a rúpia se revalorizou cerca de 1% em relação ao dólar, praticamente o que havia perdido desde o início do ano.
Mas foi a lira turca que, pelo segundo dia consecutivo, registrou o maior avanço no dia, de 1%. No dia anterior havia avançado 2,3%, a maior alta em quatro meses, graças ao anúncio do chefe do banco central, Erdem Basci, de que convocaria uma reunião especial na terça-feira a fim de tomar medidas para controlar a inflação.
Basci tinha evitado elevar os juros desde que, em dezembro, as notícias de corrupção no governo do primeiro-ministro Tayyip Erdogan pesaram sobre a moeda, os títulos e a bolsa, e optou vender divisas estrangeiras para manter o valor da lira.
“Mas não sobra aos bancos centrais muito mais margens para controlar o preço de sua moeda com base na venda de divisas, já que as reservas estão se esgotando. Na semana passada, a Turquia gastou 10% do total (das reservas internacionais)”, disse Balcells.
A calmaria também chegou ao peso chileno, que recuperou 0,7% de seu valor, e o rand sul-africano, que subiu 0,5%. O peso argentino, no entanto, recuou 0,2% em relação à moeda norte-americana e acumula uma depreciação de 18% desde o início do ano.
As turbulências não impediram que as grandes bolsas de valores europeias abandonassem as perdas dos últimos dias no pregão de terça-feira. A bolsa de Madri saltou 1,24%, enquanto a de Frankfurt subiu 0,62%, a de Paris avançou 0,98% e a de Milão, 0,91%. O ritmo do Produto Interno Bruto (PIB) do Reino Unido e as declarações do ministro da Economia espanhol, Luis de Guindos, que previu na véspera um crescimento econômico de 1% em 2014, três décimos acima da previsão oficial, não foram decisivos.
“Esses dados já estavam descontados, a correção dos últimos dias no mercado acionário espanhol tem a ver com a excessiva complacência que havia, já que ainda não vimos os resultados da maior parte das empresas que compõem o índice Ibex 2013. A Argentina serviu como um gatilho para a venda de ações e realização de lucros”, disse Miguel Arregui, da Analistas Financieros Internacionales (AFI).
Do outro lado do Atlântico, Wall Street registrou alta de 0,57%, enquanto Buenos Aires fechou com ganhos de 0,99%. O índice Bovespa, da bolsa de São Paulo, avançou 0,29%, mas em Istambul, a bolsa recuou 1,59%. O novo sentimento mais cauteloso dos investidores foi percebido na cotação dos bônus soberanos, que na terça-feira pagaram menos rendimentos aos investidores dispostos a vendê-los.