Reforma trabalhista: revés inesperado como sintoma da crise de Temer
Derrota por 10 votos a 9 em comissão do Senado surpreendeu governistas. Batalha final será no plenário
Era para ser uma votação tranquila no Senado, mas o Governo de Michel Temer sofreu, nesta terça-feira, a primeira derrota na tramitação da reforma trabalhista, um dos principais projetos de sua agenda para reativar a economia nacional, no que foi lido como um susto em uma base aliada que testa sua coesão enquanto o cerco jurídico da Operação Lava Jato se fecha em torno do Planalto. Ao contrário do que previa o Governo, a Comissão de Assuntos Sociais do Senado (CAS) derrotou, por 10 votos contrários a 9 favoráveis, o relatório do relator Ricardo Ferraço (PSDB/ES), que endossa o texto da reforma aprovado pela Câmara, em nome de um texto feito pelo senador Paulo Paim (PT), que rejeita as mudanças nas regras trabalhistas. O placar surpreendeu os governistas e a própria oposição, que comemorou o resultado final com gritos de "Fora, Temer". Após o revés, o texto governista segue no páreo, mas disputará a preferência dos senadores na verdadeira batalha - o plenário do Senado - com o de Paim (PT).
Em Moscou, onde está em viagem oficial, Temer minimizou a derrota e afirmou que caberá ao plenário do Senado tomar a decisão final sobre a reforma. "Não é surpresa negativa não, isso é assim mesmo, tem várias fases, varias etapas, e nas etapas você ganha uma, ganha outra, perde outra, o que importa é o plenário. O Brasil vai ganhar no plenário", disse Temer a jornalistas. Os mercados financeiros, no entanto, reagiram mal à notícia. Logo após a rejeição do relatório de Ferraço pela CAS, o dólar subiu cerca de 1,5%,chegando a a ser contado a 3,35 reais. Já a Bolsa de Valores de São Paulo acentuou a queda. "Enquanto a perspectiva de aprovação da reforma trabalhista permanece inalterada, o revés sugere que o recente recrudescimento da crise política tornou mais difícil para o Governo o manejo o coalizão", escreveu em boletim a clientes a consultoria política Eurasia.
A oposição também leu no resultado um claro sintoma do desgaste de Temer. Nesta segunda, a Polícia Federal concluiu, em um relatório parcial, que o presidente cometeu crime de corrupção passiva e ainda apura se há indícios dos delitos de obstrução à Justiça e participação em organização criminosa. "O resultado dessa votação demonstra a impossibilidade de o presidente continuar liderando o país. A base está se deteriorando e os senadores já colocam em xeque se vale a pena assumir um desgaste com o eleitorado por um presidente denunciado por corrupção", afirmou o líder da Rede, Randolfe Rodrigues (AP) ao EL PAÍS.
Na derrota do Planalto desta terça foram decisivos a ausência do senador Sérgio Petecão (PSD-AC) e os votos da base aliada dos senadores Otto Alencar (PSD-BA) e de Eduardo Amorim (PSDB/SE). Durante a reunião, senadores do PT, PSB e PCdoB fizeram duras críticas ao documento e disseram que, da forma como está, a proposta retirará direitos do trabalhador. A oposição também ressaltou o fato de o relator ter rejeitado inclusive emendas apresentadas pela própria base aliada para modificar pontos mais polêmicos. O mesmo relatório havia sido aprovado, na semana passada, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da Casa. A sessão teve momentos de debates acalorados entre os senadores.
Após rejeitar o parecer de Ferraço, a comissão aprovou um texto alternativo da oposição, de Paim (PT). Mesmo com a derrota na comissão, a tramitação do projeto da reforma trabalhista continua e segue agora para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Lá será apresentado o relatório de autoria do líder do Governo na Casa, Romero Jucá, semelhante ao de Ferraço e, só depois, o texto da reforma será encaminhado para a votação no plenário. Os três relatórios da CAE, CAS e CCJ vão servir de orientação para a votação em plenário.
Na visão de Jucá, a derrota foi fruto de "posições individuais" de parlamentares da base, mas o resultado não vai alterar o cronograma de votação. De acordo com o senador, o seu relatório irá para a CCJ nesta quarta, mas o documento deve ser votado na próxima semana, no dia 28 de junho. "Os três [relatórios] irão para o plenário e será votado aquele que o plenário entender que tem prioridade. Não muda nada, não muda a posição do Governo, não muda o plano de aprovar, nós vamos aprovar a reforma trabalhista porque é importante para o Brasil", afirmou Jucá a jornalistas.
Próximas etapas
Caso o texto seja aprovado na CCJ, a expectativa é que ele passe a tramitar em regime de urgência no plenário do Senado, onde será posto em votação o voto em separado do senador Paulo Paim, aprovado na CAS. Nele, Paim pede a rejeição total do texto aprovado pela Câmara. Caso o plenário confirme a decisão da CAS, a matéria da reforma será arquivada. Se o voto em separado de Paulo Paim for rejeitado em plenário, vai à votação o parecer do senador Ferraço, com o mesmo texto aprovado pela Câmara dos Deputados. Nesse caso, se aprovado, irá à sanção presidencial.
A reforma trabalhista proposta pelo Governo, se aprovada no Senado, acabará com a contribuição sindical obrigatória, determina que o que for negociado entre patrões e empregados prevalece sobre a legislação e dificultará o acesso dos servidores à Justiça do Trabalho. O texto cria uma jornada intermitente de serviço, regulariza o home office e exclui os sindicatos das homologações de demissões, entre outros tópicos.
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