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Favela rica, favela pobre: estudo mostra as desigualdades nas baixas rendas de São Paulo

Levantamento mostra que enquanto algumas áreas têm esgoto, água e coleta de lixo quase universalizados, outras parecem com os municípios de pior IDH do Brasil

Favela no Jardim Peri Alto, em foto de 2012.
Favela no Jardim Peri Alto, em foto de 2012. Lalo de Almeida (Folhapress )

As favelas de São Paulo apresentam situações bastante diversas. Enquanto algumas delas possuem indicadores de acesso a água encanada, esgoto e coleta de lixo praticamente universalizadas, em outras a situação é similar a de Melgaço, no Pará, que possui o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil. Os dados fazem parte de um estudo obtido pelo EL PAÍS feito durante o ano passado pelo Centro de Estudos da Metrópole, ligado à Universidade de São Paulo (USP), em parceria com a Prefeitura de São Paulo, para orientar as políticas de habitação da cidade.

A pesquisa sobrepôs as cartografias das habitações precárias da Secretaria Municipal de Habitação aos dados do Censo de 2010, o último levantamento com informações detalhadas da infraestrutura da cidade. Com isso, foi possível dividir as favelas em cinco agrupamentos distintos. O primeiro deles, de melhor situação, é representado por 1045 favelas das 2096 favelas da cidade (49,6%): são elas as que têm acesso quase universal água, esgoto sanitário e coleta de lixo por serviço de limpeza. Já, na outra ponta, existem 84 favelas com a pior situação: apenas 35,6% têm acesso à água, 9,9% a esgoto e 45% à coleta de lixo. O estudo já havia sido feito em 2003 com dados do Censo de 2000 e foi possível verificar que, neste período, a desigualdade entre as favelas aumentou, explica o coordenador da pesquisa Eduardo Marques, professor de ciências políticas da USP. No entanto, como os dados são de 2010, eles não medem as possíveis melhorias ocorridas durante as gestões de Gilberto Kassab (2006 a 2012) e de Fernando Haddad (2013 a 2016). 

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"Pudemos perceber que o processo de favelização continua acontecendo. Continua havendo um crescimento da população favelada e dos domicílios em favela em um ritmo superior ao da população geral do município. Mas, apesar de ser maior, esse crescimento é baixo. Não há um processo intenso de favelização", ressalta Marques. "As características sociais médias das favelas continuaram melhorando bastante, não tem piora. E como elas eram muito piores do que no resto da cidade, elas melhoraram num ritmo muito melhor do que o conjunto da cidade. Mas a pesquisa também indica a existência de um conjunto de favelas e loteamentos com características muito precárias. Por isso, a desigualdade entre as favelas aumenta. Não porque tenha favelas que pioraram de situação, mas porque a maioria das favelas fica melhor. Porém, continua havendo um conjunto delas com uma situação ruim", explica ele. 

O pesquisador afirma que não está claro o que faz com que essas favelas sejam piores, já que os cinco agrupamentos estão espalhados pela cidade de forma igualitária. Ou seja, nas franjas da cidade é possível achar tanto favelas do melhor grupo quanto do pior. "A dimensão geográfica não é a que explica. Pode ser que as favelas em piores condições sejam mais frequentemente em terrenos privados, que é uma informação que a gente não tem. Estar em área privada dificulta a colocação de infraestrutura por parte do poder público. Tem uma associação entre a precariedade das favelas e tempo. Elas [em pior situação]  tendem a ser um pouco mais recentes. Mas não são só favelas mais recentes. Tem favelas menores. O poder público tende a centrar energia nas de maior porte", ressalta o professor. "Tudo isso aponta para a necessidade da continuidade das políticas de urbanização de favelas no município. Não se sabe como o novo governo municipal vai tratar essa questão, mas é imperativo que programas de urbanização de favelas venham a ser executados porque mesmo as favelas em melhores condições estão longe ainda de serem equiparadas às populações dos outros bairros. A grande maioria delas ainda tem condições piores do que o resto da cidade", ressalta Marques.

 Veja abaixo uma radiografia das favelas da cidade, com base nos dados do estudo.

Evolução da população de favelas

2000

Favelas: 1.172.043

% população em favelas: 11,2%

2010

Favelas: 1.307.152

% da população em favelas: 11,6%

Adensamento

A maior parte dos domicílios analisados não são excessivamente adensados – tanto em favelas quanto no município. Nas favelas, enquanto 87,5% dos domicílios possuem entre um e cinco moradores, somente 12,5% dos domicílios possuem seis ou mais moradores.

Água e lixo

Com relação aos serviços públicos, tanto o abastecimento de água via rede, quanto a coleta de lixo parecem universalizados nas favelas, com taxas de cobertura de 97,59% e 98,57%, respectivamente. Entretanto, com relação a este último serviço,a quase universalização foi alcançada nas favelas com a utilização de caçambas.Quando se olha o serviço de coleta de lixo feito diretamente por serviço de limpeza apenas 77,9% dos domicílios são atendidos.

Energia

A distribuição de energia elétrica também é universalizada nas favelas, com cobertura de 99,88% dos domicílios. Entretanto, 93,17% dos domicílios recebem energia elétrica diretamente de companhia distribuidora, o que sugere que aproximadamente 6,7% dos domicílios recorrem a alternativas informais de acesso à eletricidade, como os chamados gatos. Somente pouco mais de 66% dos domicílios nas favelas possui medidor de uso exclusivo, número que ultrapassa os 85% no município como um todo. 

Banheiro

Aproximadamente 67% dos domicílios particulares permanentes em favelas apresentam banheiro via rede geral de esgoto ou pluvial, enquanto pouco mais de 1% apresentam banheiro por fossa séptica. 

Faixa etária

A pirâmide etária nas favelas possui base mais larga do que a pirâmide do município como um todo. Isso significa que a presença relativa de jovens nas favelas é maior do que no município, principalmente na faixa etária que vai até os 14 anos, que nas favelas atinge 29,3%, enquanto no município se mantém em 20,7%. As diferenças relativas entre favela e município vão caindo progressivamente nas faixas etárias que se seguem até os 25 a 29 anos, onde a diferença é irrisória. No topo da pirâmide, a faixa acima de 65 anos é mais significativa no município, atingindo pouco mais de 8% de presença relativa, enquanto nas favelas este número é de apenas 2,6% da população.

Educação

Enquanto nas favelas 81,83% da população acima de cinco anos é alfabetizada, no município esta porcentagem sobe para pouco mais de 89,16% da população. Assim como no acesso aos serviços públicos, estes números sugerem que parte importante da população não alfabetizada em São Paulo se concentra nas favelas. A média dos anos de escolaridade do responsável pelo domicílio nas favelas é de 5,4 anos, consideravelmente menor do que a média no município, que é de 8,6 anos.

Mulheres no comando

Não há diferença significativa na presença relativa de mulheres como responsáveis pelo domicílio nas favelas e no município, sendo que em ambos os casos a proporção chega a quase metade dos domicílios: 45,8% nas favelas e 44% no município.

Renda

Quase todos os responsáveis pelos domicílios nas favelas são de baixa renda, concentrando-se na faixa que vai de sem renda até três salários mínimos, que corresponde a 95% dos casos. No município, esta proporção cai para 68%. Isso também sugere que fatia importante dos responsáveis por domicílios de baixa renda se concentra em favelas.

Agrupamentos

Do total de 2096 favelas no município, dois casos foram excluídos por não apresentarem dados domiciliares

Agrupamento 1: tem ótimos indicadores de acesso à água, esgotamento e coleta de lixo direta por serviço de limpeza, praticamente universalizados. Estão nesse agrupamento a maior parte das favelas do município, isto é, 1045 favelas ou 49,6%

Agrupamento 2: tem cobertura muito precária de coleta de lixo por serviço de limpeza, apenas 28% dos domicílios em média são atendidos. Estão nesse agrupamento 263 favelas ou 12,5% do total

Agrupamento 3: caracteriza-se por uma baixa cobertura de esgotamento sanitário via rede geral, sendo que apenas 20% dos domicílios em média são atendidos. É o segundo maior agrupamento, com 499 favelas ou 23,8% do total;

Agrupamento 4: tem indicadores muito baixos de esgotamento – em média 15,9% dos domicílios são atendidos - e lixo, em média 26,5% dos domicílios atendidos . Estão nesse agrupamento 209 favelas ou 10 % do total

Agrupamento 5: combina baixos indicadores médios de acesso à água, esgotamento e lixo, respectivamente 35,6%, 9,9% e 45%. Estão nesse agrupamento 84 favelas, isto é, 4% do total. A proporção média de domicílios com 6 ou mais moradores é maior entre elas do que aquela encontrada nos demais grupos, sendo que 18% dos domicílios neste agrupamento estão nessa condição

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