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Direita francesa elimina Sarkozy como candidato à presidência no primeiro turno das primárias

Derrota implica a aposentadoria definitiva da política do ex-chefe de Estado

Carlos Yárnoz
O ex-presidente francês Nicolás Sarkozy e sua esposa, Carla Bruni-Sarkozy, saem de um despacho de voto durante o primeiro turno das eleições primárias
O ex-presidente francês Nicolás Sarkozy e sua esposa, Carla Bruni-Sarkozy, saem de um despacho de voto durante o primeiro turno das eleições primáriasIAN LANGSDON (EFE)

Nicolas Sarkozy sofreu neste domingo a mais humilhante das derrotas, vinda de suas próprias fileiras. O ex-presidente da França, que voltou em 2014 para a atividade política com o objetivo expresso de reconquistar a presidência, foi eliminado no primeiro turno das primárias da direita na escolha do candidato ao Eliseu, superado pelo ex-primeiro ministro François Fillon, vencedor inesperado do dia, e por seu rival e também ex-primeiro ministro Alain Juppé. A derrota de Sarkozy implica sua aposentadoria definitiva da política.

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As pesquisas novamente se equivocaram. Ao longo de toda a campanha, elas concordaram em dar como finalistas Juppé em primeiro lugar e Sarkozy. Mas no fim serão o ex-primeiro ministro François Fillon, grande vencedor do processo, e atual prefeito de Bordeaux, os que disputarão a corrida final.

Sarkozy reconheceu sua derrota e anunciou que apoiará Fillon. “Respeito e compreendo a vontade dos eleitores de terem eleito para o futuro outros candidatos. Quero cumprimentar Alain Juppé e François Fillon que se qualificaram. São duas personalidades de grande qualidade, que honram a direita francesa”, disse.

Como era de se esperar, Sarkozy, ex-ministro do Interior e das Finanças antes de conquistar o Eliseu em 2007, fez uma despedida total da política em tons pessoais. Valorizou “as duras provas” enfrentadas por seus filhos e sua esposa, Carla Bruni, por viverem ao lado de “um homem que levanta tantas paixões”. “Agora espero levantar mais paixões privadas do que públicas.” “Adeus a todos”, concluiu.

Segundo a contagem de 8.400 seções de um total de 10.229 seções eleitorais, Fillon tinha obtido 44% dos votos em uma participação em massa que se aproximou dos quatro milhões de eleitores. Juppé, com 28%, ocupava a segunda posição e, na terceira, Sarkozy, com 21%.

Tanto Fillon quanto Juppé mantêm inflamados enfrentamentos com o ex-presidente, o que torna o fiasco do ex-chefe de Estado um trago ainda mais amargo. Estava tão convencido de sua vitória que, nos dias anteriores à votação, divulgou pelo Twitter mensagens como: “Preciso de vocês. Conto com vocês. Sei que vou ganhar. Vamos ganhar”.

É ainda pior para ele que o vencedor seja Fillon. Era seu primeiro-ministro e, como tal, teve de ouvir muitas bravatas e menosprezos de Sarkozy. “Eu decido, ele executa” é a frase que entrou para a História.

Um sinal da rejeição foi a participação, muito mais alta do que a prevista: quase quatro milhões de votantes. Em 2012, quando Sarkozy perdeu as eleições presidenciais para François Hollande, foram 16,8 milhões de franceses que apoiaram o líder conservador.

Todos os especialistas em pesquisas de opinião afirmavam que os militantes (cerca de 200.000) do partido conservador, os Republicanos, eram partidários de Sarkozy, mas em número muito menor do que os simpatizantes que se inclinavam por Juppé ou outro dos sete candidatos que se apresentaram às primárias.

Provavelmente, foram esses simpatizantes que rechaçaram as propostas tão radicais expostas por Sarkozy ao longo da campanha. Inclusive votantes habituais da esquerda participaram (15% dos votantes, segundo uma pesquisa para a rede BFMTV) desse pleito aberto para, segundo disseram nas redes sociais, impedir o avanço de Sarkozy.

Os programas que os sete candidatos apresentaram foram muito similares, próprios da ala ortodoxa da direita. Todos propuseram endurecer a contestada reforma trabalhista, acabar com o limite legal de 35 horas de trabalho por semana, reduzir os gastos públicos, beneficiar fiscalmente as empresas, retardar a idade de aposentadoria (hoje em 62 anos) e eliminar centenas de milhares de empregos públicos.

Só as propostas diante do terrorismo e da migração os diferenciaram e foi aí que Sarkozy expôs fórmulas muito similares às da ultradireitista Frente Nacional. Fez isso para atrair seu eleitorado mais duro, tentado a continuar engordando os ultras, mas sobretudo porque, também segundo todas as pesquisas nesse caso, o candidato que sair destas primárias será o que vai lutar contra Marine Le Pen para chegar ao Eliseu no segundo turno das eleições presidenciais na próxima primavera europeia.

Dos gritos de “presidente, presidente” em seus primeiros comícios, seus colaboradores passaram logo a ficar preocupados com o rechaço que despertava em um amplo setor da sociedade. “Quanto mais aparece, mais aumenta a rejeição social. E fala tanto de si mesmo, concentra tanto o debate em torno de si que, no fim, estas primárias são um referendo sobre Nicolas Sarkozy”, opinava há algumas semanas o presidente da empresa de pesquisas Odoxa, Gaël Sliman.

Apesar de ser o mais duro, também não ficaram muito atrás o restante dos candidatos, com exceção de Juppé, o mais prudente, aos seus 71 anos. Fillon propôs um referendo sobre a distribuição de cotas de refugiados. Jean-François Copé quer os colegiais uniformizados, cantando diariamente o hino nacional e fazendo seis meses de serviço cívico. E o democrata-cristão Frédéric Poisson, contrário ao casamento homossexual, comemorou o triunfo de Donald Trump como “uma oportunidade formidável”.

Com estas primárias, a pré-campanha francesa fica oficialmente lançada. O cenário que as pesquisas prenunciam é o da França mais à direita da V República. O Eliseu será disputado em maio próximo entre direita e ultradireita. Por isso, os candidatos conservadores venderam toda sua capacidade de derrotar Le Pen. “Sou o melhor posicionado para vencer Le Pen”, disse o prefeito de Bordeaux, Alain Juppé. “Sei como derrotá-la”, respondeu Sarkozy.

Para ganhar, o candidato da direita precisará de votos do centro e da esquerda. A esquerda, uma terra arrasada resultante das divisões, traições, brigas, correntes, vinganças... Sem candidato claro, e enquanto François Hollande pondera se entra ou não na disputa, os socialistas já preparam a pós-derrota.

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