Dez boas razões para ir à Mostra de Cinema de São Paulo
O evento exibe 322 filmes de 50 países até 2 de novembro. Confira 10 títulos destacados pelo EL PAÍS
São 40 edições as que a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo completa em 2016. Muita cinefilia passou debaixo dessa ponte, que se vê abalada com mais um ano de recessão e, portanto, de patrocínios minguados. Mas que continua firme na tarefa de conectar o público ao melhor do cinema mundial. Desta vez, mesmo com crise, são 322 títulos trazidos de 50 países. Eles serão exibidos em 42 salas da cidade, incluindo sessões gratuitas em 18 salas da periferia (graças ao circuito de CEUs, ampliado pela Prefeitura este ano).
Como é de se esperar, há filmes premiados em vitrines internacionais de primeira linha, como os festivais de Cannes (Elle, de Paul Verhoeven) e Veneza (Animais noturnos, de Tom Ford). Porém, talvez melhor do que isso, são as pérolas encontradas em águas mais profundas, como a boa e ampla seleção de 19 títulos latino-americanos, que trazem novidades das cinematografias que mais crescem na região – como a do Chile (Nunca vas a estar solo, de Alex Anwandter) e a da Colômbia (Mañana a esta hora, de Lina Rodríguez). É bom estar atento a elas, porque muitas jamais estrearão comercialmente no país.
Mulheres também crescem e aparecem em primeiros papeis, nas temáticas urgentes, como a violência de gênero (Elle, de Paul Verhoeven). Tampouco faltam histórias das periferias do mundo (Ma’Rosa, de Brillante Mendonza, das Filipinas) e das cidades (Deixa na régua, de Emílio Domingos, do Rio de Janeiro), assim como histórias que assumem um tom político sem ser panfletárias. Como lembrou Renata de Almeida, diretora da Mostra, “o cinema é a forma das pessoas se calarem para ouvir outro ponto de vista”. Confira 10 títulos da programação, que vai até 2 de novembro, destacados pelo EL PAÍS.
Pitanga, de Beto Brant e Camila Pitanga (Brasil)
Nesse documentário, o diretor Beto Brant e a atriz Camila Pitanga se debruçam sobre a trajetória do pai dela, Antonio Pitanga. Dirigido por grandes cineastas brasileiros, como Glauber Rocha, Cacá Diegues e Walter Lima Jr., ele esteve presente como ator em diferentes fases de inquietação política e artística do país. O filme, celebrado no recém-concluído Festival do Rio, mostra encontros e desencontros ao longo dessa trajetória, testando as fronteiras entre documentário e o ensaio poético.
Elle, de Paul Verhoeven (França)
Moralidade e violência testam limites nesse filme de Paul Verhoeven que foi destaque no último Festival de Cannes. Nele, a grande Isabelle Huppert é Michèle Leblanc, uma mulher forte e de espírito implacável que é estuprada em sua casa por um ladrão. Michèle, em lugar de ir à polícia, tenta descobrir por sua conta a identidade do homem mascarado e se aproximar dele. O filme, adaptação do romance Oh..., do francês Philippe Djian, e candidato da França a uma vaga no Oscar 2017, entra no circuito comercial brasileiro dia 17 de novembro. Mas muita gente não está afim de esperar.
Poesia sem fim, de Alejandro Jodorowsky (Chile)
Nada se parece a Alejandro Jodorowsky, e nenhuma obra dele se parece a anterior. Talvez a exceção a essa afirmação seja que o escritor, cineasta e guru chileno investe sempre em poesia e experimentação em seus filmes. No autobiográfico Poesia sem fim, Alejandrito, aos 20 anos, decide se tornar poeta contra a vontade de sua família e é introduzido num círculo de outros autores promissores e até então desconhecidos – Enrique Lihn, Stella Diaz, Nicanor Parra, entre outros. O filme triunfou na Quinzena de Realizadores do Festival de Cannes, em maio, onde foi aplaudido durante 10 minutos.
Animais noturnos, de Tom Ford (Estados Unidos)
Grande premiado do júri do último Festival de Veneza, esse filme de Tom Ford, ex-estilista e hoje aclamado cineasta, é um suspense inspirado no livro Tony & Susan, de Austin Wright. A trama gira ao redor de Susan Morrow (Amy Adams), dona de uma galeria de arte, uma mulher assombrada pelo romance dedicado a ela e escrito pelo seu ex-marido (Jake Gyllenhaal), com quem não tem contato há anos. Uma história de vingança com bons atores dirigida com maestria por um esteta. Não tem como dar errado.
Nunca vas a estar solo, de Alex Anwandter (Chile)
Premiado no Festival de Berlim, esse filme – dirigido por Alex Andwandter, um ídolo da música pop em seu país – é baseado num crime real: o assassinato de um jovem de 24 anos por quatro skinheads nas ruas de Santiago. O foco, no entanto, é posto no pai da vítima, assolado pela barbaridade, como maneira que o diretor e roteirista encontrou de discutir uma violência que vemos cotidianamente e “inclusive aceitamos”. "O Chile é um país em que homens não podem se dar as mãos com segurança em nenhum lugar", afirmou o diretor.
O apartamento, de Ashgar Farhadi (Irã)
Farhadi, diretor do celebrado A separação, volta a receber elogios com essa história sobre um casal que tem relação abalada pelo ataque de um vizinho. Voltam à tela os dilemas morais do Irã moderno e também a violência contra a mulher. O filme foi vencedor do prêmio de melhor roteiro e de melhor ator (para Shahab Hosseini) no último Festival de Cannes.
Ma’Rosa, Brillante Mendonza (Filipinas)
Esse filme, do grande cinesta das Filipinas (e além), deu o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes para Jaclyn Jose – tirando-o, portanto, das mãos de Sonia Braga, que era uma das favoritas a ele por sua atuação em Aquarius, de Kleber Mendonça. Na história, Jaclyn é Ma’Rosa, mãe de quatro filhos e dona de uma loja de conveniência em um bairro pobre de Manila. Para fechar as contas, ela e o marido vendem droga em pequenas quantidades. Quando são presos, seus filhos enfrentam a polícia corrupta para liberá-los.
A luta do século, de Sérgio Machado (Brasil)
Num ring, cabe muito mais do que a luta entre dois oponentes em nome do esporte. Nesse documentário, o pernambucano Luciano Todo Duro e o baiano Reginaldo Holyfield – ídolos do boxe no Nordeste na década de 1990 – voltam a se enfrentar depois de uma rivalidade cultivada em mais de 20 anos. Foram seis combates, com três vitórias para cada lado – colocando Pernambuco e Bahia em pé de guerra por mais uma razão, além do Carnaval. A luta do século venceu o prêmio de melhor documentário no recém-concluído Festival do Rio.
Mañana a esta hora, de Lina Rodríguez (Colômbia)
O cinema colombiano disputa hoje um lugar de prestígio no olimpo do audiovisual latino-americano. Esse segundo longa-metragem de Lina Rodríguez mostra o surgimento de jovens cineastas que, cada vez mais, querem ver na tela as histórias de seu próprio país. Em Mañana a esta hora, selecionado para o Festival de Locarno, na Suíça, Adelaida é uma adolescente em crise familiar. Vale destacar que, assim como nesse filme, personagens fortes e temas femininos relevantes estão em todos os seis títulos colombianos desta Mostra.
Deixa na régua, de Emílio Domingos (Brasil)
Procure uma barbearia na periferia de uma grande cidade – do Rio de Janeiro, no caso desse documentário – e descubra não só os cortes da moda, mas também onde nascem os pensamentos mais prosaicos e profundos dos jovens e onde circulam as gírias mais fantásticas. Emílio Domingo, pesquisador de cultura urbana e realizador com outros dois longas do currículo, faz esse retrato visual antropológico com régua na mão.
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