“Se Trump ganhar, vou para Cuba”
A ilha atrai turistas dos EUA, enquanto os cubanos veem em Obama a chance de melhorar
“Quem é este? O presidente de Cuba?”, pergunta a turista Nancy Carwile, de Virginia (EUA), apontando para um cartaz em Havana. “É Raúl Castro, sim, é o presidente de Cuba”. “Ah, é Raúl... pensei que fosse mais jovem!”. A primeira lembrança que ela tem de Raúl Castro vem de um artigo lido nos anos 50 na Reader’s Digest. Para os norte-americanos mais velhos, Cuba é uma recordação de páginas amareladas, mas agora, cada vez mais, eles vêm tendo a oportunidade de entrar na ilha para constatar que ela não ficou congelada no tempo.
Cerca de 160.000 turistas procedentes do Velho Inimigo Imperialista visitaram Cuba em 2015. São as primeiras gotas de um fluxo que poderá se transformar em uma enchente à medida que Washington continue a atenuar as barreiras impostas a seus cidadãos para viajar ao Velho Inimigo Comunista.
No sábado à noite, na incontornável Floridita, o bar onde Hemingway passou a noite pregado no balcão bebendo até não poder mais, duas californianas cruzavam os dedos para que a eventual inundação de turistas não venha a padronizar Havana. “A cidade não tem nada das influencias ocidentais”, suspirava uma delas – profissional de novas tecnologia –, com seu coquetel de morango na mão. Sua companheira brincava dizendo que já sabe o que fazer caso o resultado da próxima eleição presidencial nos Estados Unidos não seja do seu agrado: “Se Trump ganhar, me mudo para Cuba”. Elas preferiram não revelar suas identidades por que, como muitos outros norte-americanos, para obter a permissão para viajar a Cuba, tiveram de usar o artifício de se inscrever em um programa cultural que, como elas mesmas admitem, “ninguém controla depois se foi cumprido ou não”. Pensavam em ir à praia no dia seguinte, para empanar o seu programa na areia.
Neste domingo, poucas horas antes da chegada de Barack Obama, a Havana Velha estava em calma. Ali passeava o casal Kronenberg. Ele, Hale, comentava que havia se surpreendido ao poder ver a BBC e a CNN na TV a cabo do hotel. “Imaginava um clima mais ditatorial e opressivo”, disse, complementando que espera que Obama “impulsione mais os direitos humanos em Cuna”.
Os Kronenberg estavam na frente da catedral. Em uma das laterais da igreja, havia uma outra família, cubana: a avó Erena Cabarrocas, a filha Diana Soria Cabarrocas e a neta Samanta Soria Cabarrocas, três afro-cubanas que se identificavam, na cor, com uma outra família que visitaria a catedral algumas horas depois: Sasha, Malia, Michelle e Barack Obama. “Temos de agradecer a ele pela coragem que teve”, disse a avó. A filha se limitou a opinar com um sorriso tímido que el parece ser “um homem bonito”. Acrescentando, porém, com ênfase: “A Primeira Dama é muito forte e elegante. Não me daria chances”.
Em outra rua do bairro histórico, Milagros Ortiz, havanesa, expressava um discurso ainda antagônico. “É bom que Obama venha, para que a relação se restabeleça, como é preciso. Mas eu estou com a Revolução. Tenho 46 anos e três filhos, e até agora nenhum deles morreu de fome”, disse. Mais tarde, algumas crianças diziam que que lhes parecia muito bom que Obama fosse ao país e uma senhora de cabelos brancos lhes disse: “Atenção para a ideologia. Vocês nasceram na Cuba socialista”. Olharam para ela em silêncio, e um dos meninos prosseguiu: “E que ele goste de conhecer o time cubano de beisebol”.
Em Cuba, os norte-americanos veem beleza, história, gente simpática. Em Obama, os cubanos veem um motivo para ter esperança em uma situação melhor, que é o seu maior anseio. Não o elogiam como sendo um redentor capaz de solucionar todas as suas carências, mas se referem a ele com apreço, e seu nome está presente em todos os cantos. Uma mulher contava, neste domingo, que em um batizado um padre fizera uma reflexão sobre a visita do homem do Salão Oval. Então, com o bebê na pia batismal, uma menina ergueu a voz e fez uma pergunta sensata: “Por que o senhor está falando de Obama em um batizado?”.
Obama, aplaudir ou não
Um dos momentos altos da visita de Obama será sua presença, terça-feira, no jogo amistoso de beisebol entre a seleção cubana e os Tampa Bay Rays, dos Estados Unidos.
Será o encontro do presidente dos EUA com a massa cubana. Haverá cerca de 50.000 pessoas no Estádio Latino-americano de Havana. Os ingressos são gratuitos e o Governo os distribuiu entre militantes e organizações sociais, aparentemente com algumas orientações: "Não aplaudir quando Obama entrar e não levar gorros nem chapéus", afirma o 14ymedio, um jornal local cujo acesso pela Internet é vetado dentro da ilha.
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