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André Calixtre | Diretor do Ipea

“Temos um colchão amortecedor da crise. Mas ele não é infinito”

Programas sociais aliados à inclusão no mercado de trabalho foram os instrumentos para atravessar a crise. Ao menos até agora

Marina Rossi

O Brasil viveu um ciclo ininterrupto de transformações sociais nos últimos dez anos: a pobreza extrema foi reduzida em 63%, o rendimento do brasileiro aumentou, o desemprego diminuiu e a taxa de escolaridade média cresceu também. Um levantamento, foi feito com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) entre 2004 e 2014, mostra que apesar da crise, as transformações sociais continuaram acontecendo. Ao menos até agora.

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O estudo, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que programas sociais como o Bolsa Família, aliados à inclusão no mercado de trabalho foram os grandes pilares para sustentar o que, nas palavras do economista André Calixtre, diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea, se transformou em um "colchão de amortecimento às crises".

Resta saber, porém, até quando esse colchão aguentará. "Essa é a grande questão", diz Calixtre. "Esse colchão suportou 2014, que já foi um um ano de crescimento zero. Mas só saberemos qual a resiliência de uma crise severa quando saírem os dados de 2015".

Enquanto isso, a maioria das conclusões do levantamento de agora são positivas. A taxa de pobreza extrema no Brasil teve uma queda de 63% quando se consideram as pessoas que vivem com até 70 reais por mês. Entre aquelas que recebem até 77 reais, atual valor do benefício básico do Bolsa Família, o recuo foi de 68,5%. A redução deste índice foi de 10% ao ano. "Isso significa que não houve retrocesso social no ciclo 2011 – 2014, como muitos analistas diziam", observa Calixtre.

Outro dado positivo foi o aumento do rendimento real do brasileiro, de 1.192,53 reais em 2004 para 1.720,41 reais em 2014. Porém, o crescimento anual desse rendimento que superou 7% em 2006 e registrou 5,6% em 2012, desacelerou para um patamar inferior a 1% em 2014, ano em que o aquecimento da economia já demonstrava fortes sinais de esgotamento.

Apesar disso, segundo Calixtre, é difícil fazer alguma previsão de como serão os próximos indicadores. "Haverá um solavanco", diz. "Mas ele pode ser compensado pela permanência das políticas sociais".

A permanência ou não de programas como o Bolsa Família volta e meia surge, como uma espécie de fantasma, principalmente para os seus beneficiários. O fantasma desta semana foi a informação de que o valor recebido pelo programa, que atende cerca de 13,9 milhões de famílias, não seria reajustado em 2016.

A notícia assustou pessoas como Andressa Brito, 34, mãe solteira de cinco filhos. Ela mora na ocupação do Jardim Prainha, no extremo sul de São Paulo e sustenta a família com os 302 reais que recebe do Bolsa Família. "Eu acho que não vai ter reajuste nenhum neste ano", disse ela, enquanto saía do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) do Grajaú, região que concentra o maior número de beneficiários do Bolsa Família na cidade de São Paulo: mais de 20.237 famílias. O local, mantido pela Prefeitura, recebe também os cadastros do Bolsa Família.

No que depender da realidade de Andressa, o solavanco de 2015 pode ser maior do que os técnicos do IPEA esperam. "2015 foi muito pior. Em 2014, em novembro eu já tinha tudo [para o natal]: tinha roupa para as crianças e comida", diz. "No ano passado, nem ceia tivemos. Fomos comer na casa dos outros. O quilo do arroz e do feijão estão impossíveis de pagar".

Apesar da queda quase previsível dos índices sociais de 2015, é difícil que o país retroceda em alguns aspectos básicos, aponta Calixtre. "É muito pouco provável que a escolaridade média do brasileiro caia com uma crise, ou que as pessoas deixem de ter banheiros dentro das suas casas", explica. Mas alerta: "Em um curto período de crise, temos estrutura. Só não podemos dizer que é [uma estrutura] infinita".

Reajuste: o fantasma que rondou o Bolsa Família na última semana

A insegurança sobre o reajuste do Bolsa Família surgiu no primeiro dia de 2016, quando o Diário Oficial publicou a lei que regula a elaboração dos orçamentos para este ano. Dilma Rousseff sancionou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO),  vetando mais de 40 pontos. Dentre eles, o que previa que esse programa fosse reajustado com base na inflação acumulada entre maio de 2014 e novembro de 2015, cerca de 13,40%.

A proposta foi feita pelo senador Aécio Neves, presidente do PSDB, quando a LDO tramitou no Congresso, no ano passado. Com o veto, aqueles que são atendidos pelo programa ficaram com medo de que não fosse reajustado. Acontece que a inflação nunca foi um indicador base para os reajustes do Bolsa Família, que ocorrem sem periodicidade definida. Não é como o salário mínimo, por exemplo, que aumenta anualmente, corrigido pela soma da inflação do ano anterior com o aumento do PIB de dois anos antes.

Com o veto da proposta de reajuste pela inflação, o Governo teve que correr para informar o que aconteceria com o programa então. O ministério do Desenvolvimento Social anunciou na segunda-feira que o orçamento do Bolsa Família aumentará em até 1 bilhão de reais neste ano, mas não tem ainda a previsão de quando o reajuste acontecerá e nem qual será o percentual do reajuste.

Segundo o ministério do Desenvolvimento Social, de 2011 até 2015, o benefício médio do programa aumentou 73%. Hoje, esse benefício médio é de 165 reais por família.

A cada ano, o programa é reajustado de uma maneira. Por isso, de acordo com o ministério do Desenvolvimento Social, não é possível estimar a data e o percentual do reajuste neste momento, pois ele não necessariamente será linear, podendo beneficiar as famílias em situação de pobreza extrema ou que tenham filhos menores, como tem sido feito desde 2011.

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