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Polêmico arquiteto espanhol impulsiona a transformação do Rio

A cidade inaugura o Museu do Amanhã, projeto de modernização face aos Jogos

María Martín
Vista do Museu do Manhã no Rio de Janeiro.
Vista do Museu do Manhã no Rio de Janeiro.VANDERLEI ALMEIDA (AFP)
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Sem gala nem champanhe, mas com a presença da presidenta Dilma Rousseff, o arquiteto espanhol Santiago Calatrava foi coroado como símbolo da transformação do Rio de Janeiro, na quinta-feira. Sua mais recente obra, o Museu do Amanhã, uma gigantesca estrutura branca projetada sobre a Baía de Guanabara, agora domina a paisagem da zona portuária – um lugar de importância histórica, mas esquecido e desprezado pelos cariocas até pouco tempo atrás.

O museu, cuja construção custou cerca de 215 milhões de reais, é uma homenagem à ciência e à tecnologia, e traduz em arte o papel do ser humano no mundo. O roteiro é guiado por cinco perguntas que a Humanidade sempre se fez: De onde viemos?, Quem somos?, Onde estamos?, Para onde vamos? e Como queremos ir?. A busca pelas respostas está nas atividades interativas, onde o visitante pode explorar os temas que dominarão os próximos 50 anos: das mudanças climáticas ao crescimento populacional, passando pela tecnologia.

Esta é a primeira vez que o polêmico arquiteto, descrito durante a inauguração como “um renascentista que vive na pós-modernidade”, cria o recipiente para um conteúdo que já estava completamente definido. O prefeito do Rio, Eduardo Paes, e a Fundação Roberto Marinho, do herdeiro do grupo Globo, conceberam juntos um projeto para transformar aquele pier sujo e bloqueado por uma via expressa elevada e sempre engarrafada, a Perimetral. “Por que não fazer um museu?”, cantaram ao prefeito. Assim começou um projeto de transformação do porto que viu as vias expressas serem retiradas e abriu espaços ao público. Agora, a iniciativa privada, além de colaborar com o financiamento do museu, constrói arranha-céus comerciais e hotéis na região.

“Eles já sabiam o que queriam. Trabalhei com pessoas de ideias muito firmes”, disse Calatrava a respeito dos idealizadores do projeto. “Eu apenas complemento os conteúdos com um edifício que também pode ser lido. Os jardins têm plantas selecionadas da Mata Atlântica, que é patrimônio da humanidade, para que os jovens percebam sua importância; filtramos e usamos a água da Baía para transmitir a mensagem de que um dia ela ficará completamente limpa. É uma arquitetura que fala”, afirmou.

O edifício de Calatrava teria sido inspirado pelas bromélias que crescem nas matas do Rio e que o arquiteto viu no Jardim Botânico. O prédio é quase autossustentável. O telhado tem estruturas móveis que giram durante o dia para deixar entrar a luz do sol, e placas solares que a convertem em energia elétrica. A água da Baía de Guanabara, destino de resíduos industriais e esgotos da cidade, é filtrada para fazer funcionar o ar-condicionado e encher os espelhos d’água do jardim. A água limpa é devolvida ao mar, em um pequeno gesto, para que no futuro a Baía, palco das competições aquáticas dos Jogos Olímpicos de 2016, volte a ser saudável.

A visita começa em uma espécie de ovo escuro para a qual o diretor Fernando Meirelles, autor de filmes como Cidade de Deus, criou um minidocumentário em 360o sobre a evolução da Terra e da Humanidade. O visitante viaja, visual e musicalmente, do Big Bang às megalópoles. A seguir estão telas interativas, jogos e uma sala um tanto aflitiva, onde totens de 10 metros de altura transmitem imagens em alta velocidade e números impactantes sobre os efeitos gerados pelo homem no clima, nas cidades e os desafios de 10 bilhões de pessoas povoando o planeta em 2060, como é previsto. O roteiro inclui ainda laboratórios tecnológicos para que pesquisadores, start-ups e grandes empresas compartilhem seus projetos.

O Museu do Amanhã, que conta com o banco Santander como principal patrocinador, já é considerado parte do legado dos Jogos Olímpicos. Se o evento der certo, ele deve impulsionar o prefeito do Rio como candidato à Presidência do país em 2018. “Os Jogos são uma oportunidade para fazer muitas coisas ou para não fazer nada”, disse Paes. “Há Jogos que se aproveitam das cidades e há cidades que se aproveitam dos Jogos. Nós estamos abrindo muitas oportunidades. Estamos transformando uma cidade”.

Calatrava que se lembra de, no passado, observar do alto de um mirante o crepúsculo do Rio e ouvir de um de seus filhos que aquela era a cidade mais bonita do mundo, já foi apresentado aos cariocas como patrimônio do Rio do futuro.

Um arquiteto polêmico

Santiago Calatrava (Valência, 1951) é elogiado no mundo todo, mas suas obras, além de reconhecimento, arrastam polêmicas e batalhas judiciais. Sobrecustos, atrasos ou goteiras mancharam a excelência de vários dos seus projetos, grande parte deles financiados com dinheiro público.

A última dor de cabeça do arquiteto veio do intercambiador de transportes do novo World Trade Center de Nova York, uma das joias da reconstrução da Zona Zero após os atentados do 11 de setembro de 2001. O projeto, inspirado em um pássaro com as asas abertas, já deveria ter sido inaugurado. Alvo de polémica por ter duplicado seu orçamento inicial até os 3,5 bilhões de dólares lidou recentemente com filtrações de água na sua estrutura.

A água foi um problema em outros edifícios de Calatrava na Espanha. Em 2013, descobriram-se goteiras em um dos prédios da Cidade das Artes e as Ciências de Valência, um complexo arquitetônico e cultural símbolo da modernização da cidade. A tradicional família Domecq, proprietária de um império de vinhos na Espanha, cobrou de Calatrava na Justiça os dois milhões de euros custava consertar a coberta desenhada por ele para acolher uma das suas adegas e que estava com goteiras.

Em 2014, um juiz de Oviedo, na região espanhola de Astúrias, condenou Calatrava a pagar uma indemnização de três milhões de euros a uma construtora pelas falhas detectadas na execução da obra do Palácio de Congressos da cidade.

Outro dos principais litígios contra o arquiteto travou-se em Venécia, na Itália, onde o Tribunal de Contas o acusou de falhas e custos não previstos na construção da ponte da Constuiçao. O Ministério Público chegou a pedir uma indemnização à Prefeitura de quatro milhões de euros, mas Calatrava foi absolvido em março.

O arranha-céu Turning Torso, uma torre residencial em Malmoe (Suécia) teve um sobrecusto de 170 milhões de euros, o que provocou várias demissões políticas na cidade. Calatrava tem recebido vários prêmios pelo desenho do projeto.

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