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Copa América
Análise
Exposição educativa de ideias, suposições ou hipóteses, baseada em fatos comprovados (que não precisam ser estritamente atualidades) referidos no texto. Se excluem os juízos de valor e o texto se aproxima a um artigo de opinião, sem julgar ou fazer previsões, simplesmente formulando hipóteses, dando explicações justificadas e reunindo vários dados

Neymar contra Neymar

O atacante brasileiro é o único responsável por sua saída da Copa América

José Sámano
Neymar encara o colombiano Murillo, e o árbitro Enrique Osses tenta impedi-lo.
Neymar encara o colombiano Murillo, e o árbitro Enrique Osses tenta impedi-lo.RICARDO MORAES (REUTERS)

O fato de Neymar ter que sair da Copa América pela porta dos fundos é, principalmente, culpa de Neymar. Sua desavença com o árbitro chileno Enrique Osses, a quem, ao que parece, agarrou pelo pescoço enquanto o chamava de “filho da puta” em até cinco ocasiões, merece a punição que o tira do torneio. Outra coisa são os atenuantes, como a permissividade da arbitragem com muitos agressores do brasileiro. Mas é hora de se perguntar por que recebe mais pancadas do que outros gênios como Messi e Cristiano Ronaldo, por exemplo. Talvez porque Neymar, com algum excesso de samba futebolístico interpretado fora de tempo ou mal entendido, frequentes sorrisos irônicos e mais encenação do que o normal, não ajuda a ter um julgamento melhor. Tira do sério e acaba saindo do sério. Nada pior para o craque, que ficou marcado por árbitros e jogadores de todos os lugares. Está em uma mira da qual só ele, com outra atitude, poderá se retirar. Seja justa ou injusta, o atacante do Barcelona precisa aceitar a realidade: sendo como é, ainda terá pela frente muitos encontros desagradáveis, o que não o interessa.

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Em um ano, é a segunda vez que Neymar precisa se despedir antes da hora, ainda que por causas diferentes. O colombiano Zúñiga fraturou uma vértebra dele na Copa do Mundo do Brasil em 2014 e agora, contra o mesmo adversário e seus colegas, acabou com os neurônios derretidos, brigando com uns e outros, os de amarelo e os de preto, no gramado e no túnel dos vestiários. Sem chegar a tanto, por sorte, também esteve a um passo de fechar de forma negativa a final da Copa do Rei contra o Athletic Bilbao por um drible exagerado, segundo certos códigos do futebol, uma irreverência imperdoável. Um ponto de maturidade fortaleceria sua defesa, que ele tem, e muita, quando algum Giménez, como o do Atlético de Madri, ensanguenta seu tornozelo no Camp Nou. Ou quando um Medel, o chileno, pisa nele em um amistoso em Londres. São apenas dois exemplos das faltas sangrentas que sofre. Das de verdade, não essas outras em que simula uma morte transitória.

Com a chegada de Dunga ao comando da seleção brasileira, Neymar recebeu a braçadeira de capitão, à frente de guerreiros como Thiago Silva e David Luiz. Um aceno ao jogador que se espera ser o líder dessa seleção Canarinho tão desbotada. ­O cargo requer melhor juízo, maior equilíbrio nas dificuldades. No primeiro teste, o menino perdeu o governo, por mais que exponha em sua defesa os hematomas nas pernas machucadas. É flagrante a falta de proteção dos árbitros, mas o primeiro que deve se preservar é o próprio Neymar. Não convém a ninguém que a espécie se extinga. Por irritante que pareça, por muito que vá contra o senso comum e o jogo limpo, em um futebol tantas vezes selvático, não encontrará resguardo se não cuidar do templo, se não escolher de outra forma seu repertório fabuloso de dribles deslumbrantes, quando são efetivos. Ao estilo do bom toureiro: quando aparecer e quando se esconder.

Neymar representa a única ligação entre o futebol atual e o autêntico Brasil do passado, não o desnaturalizado há muitos anos, esse de digestão tão difícil. É a única alegria que resta do melhor viveiro na história desse esporte, do país com melhores truques. Neymar, como tantos de seus antepassados, simboliza a parte mais fascinante do jogo, a arte do imprevisto, a magia em estado puro, as pernas em voo para um lado e o corpo em direção oposta. Um jogador criativo, com recursos que deixam queixos caídos, com o drible e suas múltiplas variantes como feitiço. Um trapezista contra o futebol robotizado, um encanto para os torcedores. Acontece que seu sorriso não é como o do brincalhão Ronaldinho. Diante do primeiro, os adversário veem um vilão e apontam suas travas; frente ao segundo, tinham vontade de fazer uma selfie, como a do jamaicano Deshorn Brown com Messi no sábado, mesmo que La Pulga não estivesse sorrindo.

Por tudo isso, não bastará a Neymar apelar à justiça, a poética e a real. Mesmo que considere estar cheio de razão. Diante de tanta confusão, de nada adiantará o seu “eu sou assim”. O futebol, seus velhos modos, seus antigos mandamentos, não consentirão com ele. Está à prova. O melhor Neymar será outro Neymar, o dos mesmos pés, sim, mas com outra cabeça.

É driblar a si mesmo o que falta fazer. Se conseguir, os outros culpados ficarão nus. E eles existem, claro que existem. Do jovem brasileiro depende que venham à luz. Enquanto isso, é Neymar quem joga contra Neymar.

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