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Irlanda, o primeiro país a aprovar o casamento gay em um referendo

A escolha do "sim" obteve um amplo respaldo (mais de 62%) em uma votação histórica

Pablo Guimón
Apuração de votos do referendo sobre o casamento gay em Dublin.
Apuração de votos do referendo sobre o casamento gay em Dublin.CATHAL MCNAUGHTON (REUTERS)

A Irlanda se tornou o primeiro país do mundo a aprovar por votação popular o casamento entre pessoas do mesmo sexo. O "sim" obteve 62% dos votos em um referendo realizado na sexta-feira. O "não" conseguiu apenas 37% do votos.  Os primeiros dados da apuração de votos, iniciada às 9h de sábado (5h em Brasília), já  apontavam para uma vitória do sim no referendo sobre a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo na Irlanda. O ministro da Igualdade, Aodhán O'Ríordáin, adiantou que o voto parece inclinar-se com força para o sim. No principal centro de apuração de votos, o ministro declarou na manhã deste sábado: "Acredito que está ganho. Vi urnas abertas, de áreas médias que não têm por que ser necessariamente liberais, e estão votando sim maciçamente".

O'Ríordáin foi o primeiro de uma série de deputados que, de suas respectivas circunscrições eleitorais, repetiram a mesma mensagem: tudo indica que o sim, como estava previsto, vai ganhar. Até um dos principais defensores da campanha pelo não admitiu que é muito provável que isso aconteça. "Todo mundo parece estar predizendo um sim, e esse parece ser o caso no momento. É decepcionante", declarou John Murray, do católico Instituto Iona.

Se trata de um acontecimento histórico para um país fortemente católico, onde a homossexualidade era ilegal e punida com pena de prisão até 1993.

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Todos os partidos políticos pediram o voto pelo sim, assim como os principais jornais. Todas as pesquisas publicadas antes da sexta-feira, dia da votação, indicavam uma vitória do sim por uma margem cômoda. Mas ninguém descartava um estreitamento dessa margem devido ao voto do chamado "não tímido", o daqueles cidadãos que, no contexto de uma campanha muito mais visível do sim, poderiam ocultar sua vontade de que se mantenha o statu quo.

A participação parece ter sido alta, muito mas que em outros referendos realizados no país. No fechamento das seções eleitorais às 22h (18h em Brasília), a rede pública RTE estimou que a participação teria sido entre 50% e 60%. O alto comparecimento às urnas dá uma ideia do interesse que suscitou neste país, ainda majoritariamente católico, a proposta de legalização do casamento homossexual apresentada pelo Governo de Dublin, de coalizão entre conservadores e trabalhistas.

Mais de 3,2 milhões de irlandeses maiores de idade fizeram o registro para votar. Deviam responder, marcando sim ou não, se a Constituição irlandesa deve ser alterada para incluir a seguinte frase: "Podem contrair matrimônio, conforme a lei, duas pessoas sem distinção de sexo". Havia outra questão submetida ao voto popular: reduzir ou não o limite de idade legal (de 35 para 21 anos) para ser candidato a presidente. A apuração começou pelas cédulas do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

A mobilização dos jovens urbanos teria sido um fator decisivo na vitória do sim, caso finalmente se confirme. Em Dublin, em cuja área metropolitana vive quase um terço dos 4,5 milhões de habitantes do país, calcula-se que a participação tenha chegado a 65%. E em Cork, a segunda maior cidade, a 60%. Até 60.000 pessoas fizeram o registro para votar nos últimos meses, muitas delas irlandeses residentes por todo mundo que não queriam perder um momento histórico. Não era possível o voto por correio, e podiam votar todos os irlandeses emigrados há menos de 18 meses.

Na capital, o triunfo do sim pode ser esmagador. No distrito oeste, com 13% dos votos apurados, 73% dos cidadãos se mostraram a favor. Esta percentagem é de 70% no centro-oeste e entre 60% e 65%. No centro-norte, o sim alcançaria 70%, segundo as melhores perspectivas. "Parece que essa questão tocou um nervo nos irlandeses e me sinto orgulhoso de ser um cidadão deste país", disse o ministro.

Irlanda se soma finalmente à tendência global de estender aos gays o direito de contrair contrair matrimônio. O casamento entre pessoas do mesmo sexo é legal em 19 países em todo o mundo, em todo seu território. Além disso, esse direito é reconhecido em parte do território dos Estados Unidos, México e Reino Unido (o casamento gay continua sendo ilegal na Irlanda do Norte, uma das quatro nações que compõem o Reino Unido).

Dois motivos fazem da Irlanda um caso especial. O primeiro é que aqui são os cidadãos com seus votos que decidem sobre o tema, dado que a Constituição do país só pode ser modificada por referendo.

O segundo motivo é de caráter histórico: o país, onde até recentemente a Igreja Católica tinha um importante peso na política, foi um dos últimos do mundo ocidental a punir a homossexualidade com pena de prisão. Só em 1993 o Tribunal Europeu de Direitos humanos declarou ilegal a legislação até então vigente, herdada da vizinha Inglaterra. O divórcio foi legalizado em 1995, os anticoncepcionais em 1985, e o aborto continua ilegal mesmo em caso de estupro.

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