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Europa dará dinheiro aos países dos imigrantes para deter o êxodo

Os recursos serão destinados ao controle de fronteiras

Outros 200 imigrantes resgatados chegam ao porto de Catania.Foto: atlas | Vídeo: Atlas / AFP
Lucía Abellán

A União Europeia ofereceu nesta quinta-feira o primeiro plano concreto para tentar conter a chegada de imigrantes do sul e melhorar o salvamento marítimo de quem sofre um naufrágio. Pressionados pelo drama do barco que afundou com entre 700 e 900 pessoas a caminho da Itália na semana passada, os chefes de Estado e de Governo se reuniram em regime de urgência e adotaram um compromisso que combina medidas de solidariedade com outras que, no fundo, tentam manter as tragédias distantes da Europa. Bruxelas oferecerá mais recursos para países como Tunísia, Sudão e Egito para que controlem melhor suas fronteiras e evitem que os imigrantes irregulares tenham acesso aos portos do Mediterrâneo.

A diplomacia europeia sabe que, sem resolver os conflitos da África e do Oriente Médio, a única maneira de conter os fluxos de estrangeiros é bloquear as vias de saída. Por isso os líderes acordaram dar mais dinheiro a vários Estados africanos para que vigiem as rotas que conduzem principalmente à Líbia, o ponto de partida da maioria dos barcos. As entradas irregulares provenientes dessa região triplicaram em 2014, ultrapassando as 170.000, segundo dados da Frontex, a agência europeia de fronteiras.

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Consciente de que esse ritmo não vai diminuir no curto prazo, a UE propôs triplicar o orçamento destinado às duas operações de vigilância —ainda que façam o salvamento marítimo quando detectam algum barco em situação de naufrágio— no Mediterrâneo. A proposta de multiplicar por três os recursos, proposta pelo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, recebeu o apoio da maioria dos Estados, entre eles França e Alemanha, segundo fontes do Conselho Europeu, que representa os Estados membros. No caso da Tritão, operação que vigia as costas italianas, esse aumento significaria se aproximar dos nove milhões de euros mensais.

“Trata-se de evitar o tráfico de seres humanos em barcos, trata-se de lutar contra as causas dessa migração mas, sobretudo, trata-se de salvar vidas humanas e de tomar para si as medidas necessárias”, afirmou a chanceler alemã Angela Merkel antes de entrar na reunião. O presidente francês, François Hollande, criticou veladamente a atuação do Ocidente na Líbia, abandonada pouco depois da intervenção para derrotar Kadafi em 2011, ao propor “corrigir os erros do passado”.

Essa solidariedade, respaldada por países anteriormente críticos à travessia de barcos no Mediterrâneo, trazia também um elemento envenenado. O primeiro ministro britânico David Cameron comprometeu uma quantidade inusitada de equipes (um navio de guerra, dois barcos-patrulha e três helicópteros), mas com um requisito inescapável: “Sem dúvida, sob as condições corretas. Que as pessoas que resgatemos sejam transferidas ao país seguro mais próximo, provavelmente a Itália, e não tenham direito imediato de pedir asilo ao Reino Unido”, declarou à imprensa. Cameron repetiu esse argumento na reunião de líderes, mas nenhum deles chegou a reprová-lo, explicam fontes da comunidade europeia.

Com as imagens recentes dos imigrantes que sobreviveram aos últimos naufrágios, os chefes de Estado e de Governo não queriam se enfrentar em Bruxelas. Por isso pactuaram um texto moderado que, mesmo assim, supõe um passo adiante em relação à situação atual. Os líderes se comprometeram a acolher pelo menos 5.000 refugiados dos que agora estão em campos da ACNUR, a agência da ONU para os refugiados, e que poderão viver na Europa pelo menos até que a situação de seus países —principalmente da Síria— melhore. A Europa mostrou até agora pouca solidariedade nesse terreno e, no ano passado, acolheu 7.600 pessoas sob o programa, segundo dados da Eurostat, a agência estatística comunitária. “O maior desafio do encontro pode ser a discussão sobre questões difíceis como a acolhida e a realocação de quem pede asilo”, vaticinou o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk.

Bruxelas financiará a países como Tunísia, Egito ou Sudão para reforçar os controles

Para aceitar todas essas medidas de abertura, os países da linha mais cética em relação a uma maior abertura impuseram alguns requisitos. Um deles consiste em acelerar as devoluções de todos os imigrantes que saem de seus países pelo que Bruxelas considera razões econômicas. Ou seja, não fogem de nenhum conflito e, portanto, não têm direito de pedir asilo em território da UE. Para esse encontro, o Conselho Europeu prevê colocar em andamento um programa de retorno rápido que os devolva aos países que os aceitarem. O programa deve ser criado pelos Estados mais expostos (ou seja, Itália, Malta, Grécia e Espanha) e seria coordenado pela Frontex. Na prática, o compromisso pode ser mais retórico do que real. A UE já tem programas de retorno rápido, com voos especialmente fretados para devolver imigrantes e cuja organização cabe à Frontex.

Os países membros emitem ordens de expulsão a cerca de 250.000 pessoas por ano, segundo dados dessa agência comunitária. Fontes diplomáticas garantem que se trata de fazer com que todos eles tomem o voo de regresso, algo que nem sempre acontece.

Um dos elementos-chave dessa declaração aprovada na noite de quinta-feira está para ser definido. Trata-se da possível operação militar que deve permitir confiscar e destruir barcos cujo objetivo seja transportar imigrantes pelo Mediterrâneo. A maior parte dos países apoia, mas aguardam determinar em que termos se faz isso.

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