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Dilma garante reduzir gastos e Levy ganha tempo no Congresso pelo ajuste

Em entrevista à Bloomberg, presidenta garante que haverá “grande corte” das despesas Ministro convence senadores a adiar votação de novos gastos

Carla Jiménez
A presidenta Dilma Rousseff concede entrevista em Brasília nesta terça.
A presidenta Dilma Rousseff concede entrevista em Brasília nesta terça. Lula Marques (Bloomberg)

A presidenta Dilma Rousseff garantiu nesta terça-feira que o Governo vai cortar na própria carne, ou seja, reduzir os próprios gastos, em nome do ajuste fiscal necessário para o equilíbrio das contas públicas. Em entrevista à Bloomberg, a presidenta disse que o Governo promoverá “um grande corte”. “Vamos cortar despesas correntes e temos de racionalizar os gastos do Governo”, disse Dilma, garantindo que fará tudo para atingir a meta fiscal estabelecida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. A meta de superávit, de 1,2% do PIB, exige um aumento de receitas e redução de gastos para fechar a conta do Governo.

Segundo ela, os cortes são necessários para reduzir o déficit atual. No ano passado, o setor público registrou um saldo negativo de 0,64% do PIB. Para reverter o quadro, e não deteriorar mais o quadro atual, o Governo começou o ano anunciando o fim de subsídios ao setor privado, e o aumento de tarifas. Agora, espera-se uma sinalização concreta de que fará a economia necessária para retomar as contas equilibradas. O tamanho do corte que será anunciado ainda não é conhecido, mas já se especula que ficará por volta de 80 bilhões de reais, segundo o jornal Folha de S. Paulo.

A entrevista da presidenta à agência de notícias, que tem como público alvo investidores e especialistas do mercado financeiro, ocorreu no mesmo dia em que o Tesouro anunciou um saldo negativo de 2,3 bilhões de reais do setor público (que inclui os gastos e receitas do Governo federal, estaduais, municipais e empresas estatais), em fevereiro. E foi exatamente o Governo Federal quem mais contribuiu para deixar as contas no vermelho: um déficit de 7,357 bilhões de reais, o pior resultado para fevereiro, desde 1997, e mais que o dobro do que foi apurado no mesmo período de 2014. O rombo foi compensado pelo bom desempenho de receitas dos Estados, o que permitiu fechar com um déficit menor (de 2,3 bilhões de reais).

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Na entrevista à Bloomberg, Dilma afirmou que a redução do rombo no orçamento ajudará a retomar a confiança na economia apontando para um retomada rápida do crescimento.

O ajuste fiscal tornou-se uma questão de vida ou morte para o Governo Dilma. Por isso, evitar novas despesas tornou-se uma obsessão do ministro Levy. Nesta terça, ele gastou muito do seu latim, português e economês, durante sete horas na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. O objetivo era convencer os senadores presentes que era importante acatar o ajuste fiscal, que vai exigir sacrifício de todos os setores da sociedade. “Além de pedir a aprovação para as medidas provisórias que estão sendo debatidas no Congresso – que preveem mudança no acesso a alguns benefícios, como pensão por morte e seguro desemprego – Levy pediu que os congressistas deixem de cobrar alguns pleitos, como a aplicação dentro de 30 dias de um novo indexador para as dívidas dos Estados e municípios com o Governo federal, uma pendência que tem raízes no final dos anos 90.

Durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso, foi fechado um acordo, pelo qual o Governo federal assumiria as dívidas dos Estados e municípios. Em troca, governadores e prefeitos pagariam essa dívida com o Governo federal ao longo de 30 anos, com parcelas reajustadas pelo IGP-DI, um índice que à época parecia mais vantajoso. Acontece, porém, que o IGP-DI subiu mais que outros indicadores, o que tornou o endividamento um peso quase impossível de carregar para Estados e municípios. A mudança já havia sido aprovada no Congresso e sancionada pela presidenta Dilma, mas Joaquim Levy pediu aos senadores que eles acatem esse pagamento apenas em 2016, em nome do ajuste fiscal, pois se entrasse em vigor agora, ele custaria 3 bilhões de reais. Seria um extra indesejado quando o Governo está se comprometendo a economizar 66 bilhões de reais este ano (1,2% do PIB, de superávit primário).

O ministro jogou pesado para mostrar os riscos de não garantir o enxugamento de gastos. “O país pode perder o grau de investimento [da nota de risco] se não promover o ajuste”, disse ele. “O prejuízo será altíssimo para o Governo, que aumenta o custo da sua dívida, mas também para as empresas, que terão mais dificuldades de financiar; e para o trabalhador, que obviamente vai viver num país com mais dificuldade, eventualmente até com turbulência”.

Levy mostrou um gráfico que ilustrava a alta dos investimentos estrangeiros no país depois que  o Brasil ganhou o grau de investimento em 2008 por parte das agências de risco. Em meio às turbulências na economia e na política, e ainda, na Petrobras, havia temores que o país viesse a perder esse selo. No dia 23 de março, porém, a agência Standard&Poors anunciou que manteria a nota em função da mudança de rumo na política econômica.

Ao final do dia, o Senado adiou a votação desse pleito, mas deixou claro que espera uma sinalização mais firme do Governo de que ele também fará a sua parte. “Cabe distribuir os sacrifícios”, reclamou o presidente da Congresso, Renan Calheiros. Ainda não há uma previsão de data de quando será votado o assunto.

Levy X Dilma

Confrontado com 25 senadores, o ministro da Fazenda ouviu seguidas críticas à presidenta Dilma Rousseff, e provocações sobre o seu papel no Governo. “O ajuste fiscal não tem apoio popular e nem apoio político, uma vez que a presidente Dilma perdeu sua credibilidade junto à sociedade, que agora sente o aumento do desemprego e a elevação de impostos”, disse Ronaldo Caiado (DEM-GO).

O senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) foi ainda mais incisivo ao questionar Levy se ele, sendo conhecedor da desonestidade do Governo do PT, não temia macular sua biografia ao integrar um "governo desastroso". O ministro respondeu ter "satisfação" de estar no governo Dilma Rousseff devido à “capacidade de construção de soluções democráticas”. "Se tivermos sucesso em avançar em pautas assim [como o indexador das dívidas], com o coração muito humilde, eu diria que terá sido uma oferta inesperada para a minha biografia. Isso não se faz sozinho", afirmou.

Na entrevista à Bloomberg, Dilma minimizou o episódio da fala do ministro que teria dito que Dilma tem o desejo genuíno de acertar as coisas, “nem sempre pelo caminho mais fácil”. “Obviamente estão tentando criar intrigas ao redor do ministro”, afirmou ela, completando que houve “uma tempestade num copo d'água sobre o assunto".

Petrobras

A crise da Petrobras também foi abordada na entrevista de Dilma, que foi presidente do Conselho da estatal entre 2003 e 2010. “Nenhum de nós nunca viu um sinal de corrupção”, disse ela, referindo-se ao Conselho, que era composto, nesse período, por representantes de peso da iniciativa privada, como o empresário Jorge Gerdau, do grupo de siderurgia Gerdau. Questionada sobre a capacidade da Petrobras de resistir ao momento atual, a presidenta disse ter certeza que a companhia tem condições de superar seus atuais problemas e apresentar seu balanço até o final de abril. “Os novos membros da diretoria da Petrobras, assim como os do conselho, estão trabalhando para construir uma solução”, completou.

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