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Hollande confronta a direita com uma clara defesa da imigração

Presidente francês descreve o combate ao antissemitismo como uma “causa nacional”

Carlos Yárnoz
François Hollande no Museu da História da Imigração, em Paris.
François Hollande no Museu da História da Imigração, em Paris.efe

François Hollande se contrapôs nesta segunda-feira aos crescentes movimentos xenófobos de toda Europa com um discurso solene, emotivo e vibrante, em que fez todo um canto de louvor à contribuição dos imigrantes para a França e sobre a necessidade de fortalecer os sistemas de integração. “Não podemos tolerar que ninguém seja atacado por sua religião, sua cor, sua origem ou sua cultura”, afirmou o presidente francês, que mais adiante chegou a essa conclusão: “O sucesso da integração determinará nosso destino nacional”.

O discurso de Hollande, que está na metade de seu mandato de cinco anos, era especialmente esperado por ser o primeiro que ele dedica à imigração. “Sempre há demagogos. Os estrangeiros têm sido sistematicamente acusados dos mesmos males. A novidade é a penetração dessas teses num contexto de crise interminável e de globalização”, afirmou o chefe do Estado.

Um museu maldito

Hollande pronunciou seu discurso na inauguração – com sete anos de atraso – do Museu da História da Imigração na França. Proposto pelo socialista Lionel Jospin em 2001, não foi inaugurado na época por causa da expansão do partido direitista Frente Nacional, então comandado por Jean-Marie Le Pen. Após várias obras, ficou pronto para ser aberto no final de 2007, meses depois da posse de Nicolas Sarkozy como presidente. Sarkozy tinha baseado boa parte de sua campanha num discurso duro contra os imigrantes, e por isso nunca encontrou o momento adequado para a inauguração. Como resposta, vários dos prestigiosos historiadores decidiram deixar o conselho científico da instituição. Em 2010, o edifício foi ocupado durante meses por imigrantes indocumentados.

Por tudo isso, o gesto de Hollande nesta segunda-feira tem um significado muito especial para a história francesa recente. E também o momento escolhido, quando a direita e a ultradireita esgrimem suas duras receitas contra os imigrantes com a intenção de ganhar votos.

O lugar escolhido foi igualmente simbólico para a mensagem: o Museu da História da Imigração, no Palácio da Porta Dourada, para onde foram convocados 200 embaixadores, parlamentares e representantes de coletivos de imigrantes. Em seu discurso, Hollande condenou “a violência, a demagogia, a intolerância, os preconceitos, as suspeitas, as dúvidas instaladas...” – definitivamente, todos os clichês que ao longo da história foram utilizados contra o estrangeiro. Nestes momentos, o clichê é do “medo da deslocalização”. “Não deixemos lugar aos discursos que instrumentalizam o medo da dissolução, da deslocalização, do desaparecimento”, afirmou.

Hollande deixou clara a abissal distância que o separa da Frente Nacional e do discurso de Nicolas Sarkozy, já que ambos se valem do medo do imigrante como lema para arregimentar seguidores. “Não se pode deixar lugar àqueles que sonham com uma França pequena e recolhida”, disse Marine Le Pen, a atual líder da FN, que defende erguer novamente fronteiras nacionais e abandonar a UE, precisamente para fechar as portas aos imigrantes. Sarkozy, por sua vez, reiterou que deseja alterar as regras do espaço Schengen, que permitem a livre circulação de pessoas dentro da UE. Para Hollande, entretanto, “o espaço Schengen é justamente o que permitiu a todos os países da Europa se organizar para controlar a imigração. Fazer desaparecer o espaço Schengen seria dar marcha a ré”.

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Hollande acredita que não só é desnecessário temer o estrangeiro como também é necessário abrir-lhes as portas. Foi o que sugeriu. Recordou que a França acolhe 200.000 pessoas por ano, uma proporção “baixa” com relação à população do país, e que além disso 60.000 delas são estudantes. Emma Bonino, ex-comissária (ministra) da União Europeia e ex-ministra italiana, recordava na sexta-feira em Paris, durante um evento da Fundação Nossa Europa, que a UE precisará receber 50 milhões de imigrantes até 2050.

O presidente propõe medidas que facilitem a vida dos estrangeiros

Hollande anunciou que prepara “uma nova política migratória”, que incluirá a apresentação de um projeto de lei, no ano que vem, regulamentando o direito de residência para estrangeiros. A nova norma exigirá “o aprendizado da língua francesa, a formação nos valores da República, suas regras, seus usos, seus direitos, mas também seus deveres”. Os vistos de residência valerão por vários anos, para reduzir a burocracia. “De que serve fazer os estrangeiros sofrerem esperas intermináveis nas delegacias de polícia?”, perguntou-se.

O presidente francês aproveitou o ato de segunda-feira para recordar que seu Governo considera a luta contra o antissemitismo uma “causa nacional”, como antecipou na semana passada o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, depois do último ataque antissemita na França. Foi no dia 3 em Créteil, ao sul de Paris. Três indivíduos, já detidos, invadiram a casa de um jovem casal (e estupraram a esposa) para roubar dinheiro, argumentando que, sendo judeus, eles deveriam ser ricos.

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