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Serra Leoa coloca mais duas províncias em quarentena

O bloqueio pega a população desprevenida, que teme ficar sem alimentos

José Naranjo
Uma mulher chora pela morte de um familiar vítima do ebola.
Uma mulher chora pela morte de um familiar vítima do ebola.A.J. (EFE)

São 7 horas da manhã. Ao sair de Kenema em direção a Kailahun, a estrada penetra os campos de arroz e um manto verdíssimo de folhagem. No entanto, depois da última curva, nos deparamos com uma aglomeração de pessoas com a evidente presença de militares uniformizados. Não parece um controle normal. E não é. O tráfico está interrompido por quatro barreiras sucessivas feitas com pedaços de madeira e tambores. De um lado da estrada, cerca de 20 soldados carregando fuzis e cara de poucos amigos. Além disso, uma dezena de oficiais de polícia tenta informar as pessoas, de ambos os lados das barreiras, sobre o que está acontecendo. “Durante 90 dias, ninguém pode passar, apenas os veículos sanitários, militares e as forças de segurança do Estado. O restante precisa de uma autorização especial do chefe da Polícia. Não há protesto, nenhuma palavra mais alta do que a outra. Os fuzis impressionam.

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Embora o Governo tenha declarado o estado de emergência sanitária e circulassem rumores sobre a adoção de medidas destinadas à restrição do tráfego, o golpe chegou sem avisar. Serra Leoa decidiu fechar totalmente por um período entre 60 e 90 dias a Região Oriental, onde se concentra a maior parte dos casos de ebola, o que na prática significa impedir a movimentação de veículos e pessoas tanto em direção a Kenema e Kailahun, como destas duas cidades para fora. É um bloqueio total. Nem caminhões, nem ônibus, nem carros particulares. Nada se move em nenhuma direção.

“Nos transformaram em prisioneiros”, afirma Alpha Lamine, secretário-geral da associação de comerciantes local. “Aqui há muita gente que vive do dia a dia, que vem de povoados próximos ao mercado para vender e com o dinheiro que levam para casa por volta do meio-dia podem comer”. Se não podem vir, como vão fazer? “Esta medida é muito perigosa, não estamos preparados, não nos deram tempo de abastecer nossos lares”, responde.

A rua principal de Kenema é um centro de lojas e comércio de todo o tipo, desde um cibercafé até a venda de peças para motos, uma operadora de telefonia celular, um posto de gasolina. Durante anos, o ouro e os diamantes das minas próximas foram o motor dessa cidade, onde proliferaram os oportunistas e os que estavam em busca de fortunas. Dezenas de libaneses abriram supermercados na região. Agora muitos deles foram para Freetown.

Os preços começaram a subir por causa do ebola. O saco de arroz de 50 quilos, que valia 60 reais, agora já custa 75. “E se o Governo mantiver sua decisão de deixar Kenema bloqueada durante mais de dois meses, nem quero pensar no que pode ocorrer. Vai haver violência, disso tenho certeza, porque não se pode tirar o pão das pessoas”, disse Lamine.

Nos transformaram em prisioneiros, disse um comerciante

Na prefeitura, o administrador-chefe, Daniel Sa Momoh, argumenta: “Fechar Kenema não é uma solução. Tinham que ir de casa em casa fazendo testes nas pessoas, mas isso vai criar problemas. Se vão adiante com esta medida, terão que enviar comida como ajuda humanitária”. As pessoas não falam de outra coisa. As rádios começam a transmitir a informação e formam-se burburinhos pelas ruas. “Minha mãe vive em Makeni. Como poderei vê-la agora?, pergunta uma mulher.

Na estação de ônibus e taxis, Cyril Allie, secretário-geral da União de Transportadores de Kenema, coloca as mãos na cabeça. “Como estamos? Pois não muito contentes. Se este bloqueio se prolongar durante uma semana começarão os protestos, se tornará um problema de segurança para os cidadãos”. Durante todo o dia apenas os trabalhadores dos organismos sanitários e as forças de segurança puderam entrar e sair de Kenema.

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