O Brasil coloca Neymar em jogo
Scolari pode usar Bernard ou Willian no ataque, ou mudar o esquema tático
Neymar jogará a semifinal da Copa do Mundo contra a Alemanha, na próxima terça-feira, e pretende, naturalmente, ir à final de domingo no Maracanã. Mesmo que desde o último sábado esteja repousando, por escolha própria, em sua casa no Guarujá, litoral de São Paulo, Scolari pediu a ele que se sentasse no banco de reservas do Mineirão, em Belo Horizonte. O Brasil invoca o seu 10 com o mesmo fervor com o qual pede a graça de Deus. O martírio do atacante do Barcelona funciona como motor para o sonho. A imagem de Neymar sendo retirado por um helicóptero depois de fraturar a terceira vértebra lombar, resultado de uma entrada de Camilo Zúñiga, lesão que o deixará imobilizado por pelo menos quatro semanas, funciona como um selo nesta Copa do Mundo.
O choro do ícone do futebol brasileiro, escancarado no vídeo publicado pela Confederação Brasileira de Futebol, é contagioso, tanto que até a presidenta Dilma Rousseff entrou na onda: "Nada nos tirará o sonho de ganhar o Mundial". O lema é "raça, garra e lágrima", em solidariedade ao drama do jogador.
Diante da ausência do jogador - e de futebol -, o Brasil apela ao emocional, ao discurso populista de Felipão, aos conselhos dos psicólogos, às recordações de suas façanhas futebolísticas em situações precárias, como quando Pelé, então com 21 anos na Copa de 1962, se machucou. O substituto foi Amarildo, do Botafogo, que marcou três gols no Chile. A ausência do Rei, no entanto, provocou a explosão do lendário Garrincha, ídolo do povo, cujo corpo foi velado no Maracanã. "Tem que ter vontade, empenho e coragem para suprir a qualidade de Neymar", afirma Amarildo. "Eu também fiquei fora da Copa uma vez, mas Deus deu um presente ao Brasil com o título", interveio o próprio Pelé, aos 73 anos. "Espero que agora aconteça o mesmo".
Neymar é um jogador criado no Santos, e não poder jogar mais a Copa dói especialmente ao Brasil, pois ele fez quatro dos dez gols da equipe, bateu os escanteios que terminaram nos gols dos zagueiros Thiago Silva e David Luiz, e converteu o pênalti decisivo contra o Chile. Nunca ficou fora de um jogo desde que Scolari substituiu Mano Menezes na seleção, pela qual marcou 39 vezes em 52 jogos. Antes, desde a sua estreia em 2010, havia perdido seis confrontos: cinco vitórias (Irã, Ucrânia, Gabão, Egito e Dinamarca) e uma derrota (França). Felipão armou a sua seleção ao redor de Neymar. O ponto final do jogo teria que ser necessariamente o herdeiro de Ronaldo e Romário.
Portanto, não se sabe como o treinador vai resolver o enigma que surge com a lesão de Neymar. Felipão pensa em duas situações: substituir jogador por jogador ou mudar o sistema tático. Há dois candidatos naturais para entrar no lugar do atacante do Barcelona: Bernard ou Willian. Embora ainda não se sinta importante no Shakhtar Donetsk, Bernard triunfou com o Atlético Mineiro na Libertadores e disputou a Copa das Confederações. Aos 21 anos, dotado de boa técnica, pode jogar nos dois lados e se destaca pela habilidade e rapidez, aproveitando a baixa estatura (1,66 metros). "Tem alegria nas pernas", afirma Scolari, que o utilizou como reserva nas duas primeiras partidas (jogou 66 minutos no total). Bernard é o mais parecido com Neymar.
“Brasil precisa a Neymar porque é decisivo no um contra um", explica Mourinho, técnico do Chelsea
Menos vertical, mas melhor no último passe, Willian é um meio-campista estupendo, explosivo e bom definidor, mais intenso desde que chegou ao Chelsea de Mourinho. Também pode exercer a função de falso 9. O problema é que não jogou mais do que 39 minutos na Copa. O técnico poderia adiantar Oscar de posição e dar lugar a Luiz Gustavo, ausente por suspensão contra a Colômbia. Não está descartado que Felipão mude o esquema tático e coloque três zagueiros, mesmo que Thiago Silva esteja suspenso, caso o recurso da federação brasileira seja rejeitado. Ela também pediu uma sanção a Zúñiga. Além disso, há Ramires ou Hernanes como alternativas.
Precisamente sobre isso, Mourinho disse que a ausência de Thiago Silva pode "ser tão ou mais importante que a de Neymar". "O Brasil precisa de Neymar porque é decisivo no mano a mano, desequilibra no ataque, faz gols e é fantástico na bola parada", explica o técnico português. "Acontece que o jogo do Brasil é baseado na estrutura defensiva, cujo fator decisivo é a estabilidade de Thiago".
Também há o consenso sobre a necessidade de ganhar a Copa do Mundo para dedicar o título a Neymar porque essa é a cara do Brasil. Afinal, foi o próprio jogador azul-grená que sentenciou antes de se machucar. "Não viemos dar espetáculo, mas conquistar a Copa". Agora, a garantia é Felipão, campeão em 2002 com o Brasil e semifinalista em 2006 com Portugal, recordista de vitórias consecutivas em Mundiais, pragmático por excelência, reabilitado depois da conquista da Copa das Confederações, após Mano Menezes fracassar na Olimpíada de Londres, em 2012. Hoje, o Brasil é "a família Scolari" e, como tal, exige uma adesão incondicional, com a qual não comungam Ronaldinho, Robinho ou Kaka. Neymar, sim.
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