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Petrobras ganha um concorrente de peso com a abertura do petróleo no México

Estatal brasileira terá mais dificuldades para disputar investimentos com a reforma do setor de óleo e gás mexicano, avaliam especialistas

Refinaria da Petrobras, em foto de arquivo.
Refinaria da Petrobras, em foto de arquivo.EFE

O Brasil ganhou um concorrente de peso no mercado de óleo e gás com a reforma energética do México, que vai abrir a estatal de petróleo Pemex ao capital privado, afirmam especialistas ouvidos pelo EL PAÍS. Segundo eles, a disputa por investimentos por parte da Petrobras ficará ainda mais acirrada, principalmente devido a uma fase de “menor internacionalização” da companhia.

Primeiro, foi o Senado mexicano, que aprovou, na última quarta-feira, a abertura da indústria dos hidrocarbonetos ao investimento de empresas privadas nacionais e estrangeiras. Menos de 24 horas depois, foi a vez da Câmara dos Deputados  - com 354 votos a favor e 134 contra - dar seu aval às modificações dos artigos 25, 27 e 28 da Constituição Mexicana, colocando fim a 75 anos de nacionalismo na indústria energética do país.

A decisão traz ainda um novo ingrediente à disputa entre Brasil e México pelo título de "queridinho" da região entre os investidores.

O economista e professor do programa de Energia da Universidade de São Paulo (USP) Edmilson Moutinho, por exemplo, afirma que a concorrência ao Brasil se dará até em áreas consideradas de menor rentabilidade, como as de reservas de gás de xisto.

A decisão traz ainda um novo ingrediente à disputa entre Brasil e México pelo título de "queridinho" da região entre os investidores

“O México já tem dutos de importação com os Estados Unidos e vai ser muito rápida a entrada de investimento norte-americano, mesmo que o resultado não seja tão rentável. Nosso leilão de xisto não atraiu ninguém”, observa Moutinho. “Eles têm uma porta do lado de casa, de um capital que não virá para o Brasil”, completa.

A proximidade com o mercado norte-americano também é destacada por Alan Fernandes, diretor-executivo do Banco Espírito Santo (BES) no Brasil e responsável pela atividade de "project finance" da instituição em nível global. Ele avalia que, além da proximidade física com os Estados Unidos, “o modus operandi mexicano também é muito mais próximo ao norte-americano que o brasileiro”.

“A tendência é um movimento da Pemex e de outras empresas com ações mais agressivas em outros mercados, e também na busca por recursos e parcerias com outras companhias.”

Segundo o professor Moutinho, o México volta também a ganhar terreno no mercado energético, após ter representado quase que uma exceção na onda de liberalização do setor na América Latina na década de 1990. Os mexicanos foram símbolo de um dos três modelos observados na região no período.

“O modelo mexicano não mudava. Havia apenas a perda de reservas e produção, e o modelo se manteve por tanto tempo graças à forte alta do preço do petróleo”, afirma. Os outros modelos citados pelo professor da USP eram o argentino, marcado pela privatização efetiva no governo do presidente Carlos Menem, e o brasileiro, intermediário entre os dois anteriores, pois conseguia atrair parceiros sem realizar a privatização da Petrobras, que é uma empresa estatal de economia mista.

Uma lei em 1997 instituiu a flexibilização do monopólio estatal do petróleo no Brasil. Com isso, teve início um cenário de maior competição no setor, com a Petrobras estabelecendo parcerias com empresas privadas nacionais e internacionais e intensificando o seu processo de internacionalização.

“Ponho minha mão no fogo de que o México não seguirá o modelo argentino. O que dá para esperar é um modelo parecido com o brasileiro. A Pemex não será privatizada, e vão abrir áreas que sejam mais desafiadoras do ponto de vista tecnológico”, completa.

A reforma mexicana estabelece uma margem de dois anos para que as empresas públicas descentralizadas – Pemex e a Comissão Federal de Eletricidade (CFE) – se convertam em “empresas produtivas do Estado”, um termo ambíguo que as conclama a serem mais competitivas e a adotar as melhores “práticas em nível internacional”.

Moutinho e Fernandes coincidiram em destacar ainda que uma parceria entre o Brasil e o México em energia teria sido mais proveitosa no passado, ante uma agenda mais internacionalizada da Petrobras. Hoje, o foco da estatal brasileira está no desafio de colocar de pé uma exploração economicamente viável do petróleo na camada pré-sal.

“Onde poderíamos tirar vantagem é na exploração offshore, com tecnologia e capital humano. Mas não temos dinheiro. Há dez anos seríamos grandes parceiros, mas, hoje, com o pré-sal, estamos nos desinternacionalizando”, diz o professor da USP. “Se fosse em outros tempos, a Petrobras estaria mais aberta à exploração e produção em outros mercados. Atualmente, ela olha com mais atenção o mercado interno”, complementa, por sua vez, o diretor-executivo do BES.

Jean-Paul Prates, diretor da consultoria Expetro no Rio de Janeiro, reforça a exceção mexicana em um passado recente de avanços. “O monopólio do México era total, da exploração de petróleo até o posto de gasolina. Era um prejuízo muito grande que o país carregava”, afirma.

Mas Prates acredita que o momento não deve ser de lamentações no Brasil, e sim, de adaptações. “É evidente que, de cara, há mais riscos de o México se tornar um competidor do que um parceiro. Mas lamentar isso seria idiota. O Brasil tem muito a ensinar para o México por tudo o que percorreu”, avalia.

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