Doria abre duelo com Bolsonaro e marca posição dos governadores: “É justo abandonar idosos à própria sorte?”

Videoconferência realizada com os mandatários do Sudeste, região mais afetada pela pandemia, vira ringue entre João Doria e Jair Bolsonaro

Jair Bolsonaro em videoconferência com governadores do Sudeste nesta quarta-feira. 25/03/2020 ONLY FOR USE IN SPAINMarcos Corrêa/Palacio Planalto/ DPA (Europa Press)

Após se reunir com os governadores de todas as regiões do país nos últimos dias, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sentou-se à mesa, virtualmente, nesta quarta-feira para conversar com os líderes do Sudeste, que responde por 60% dos casos de coronavírus até o momento. Era o encontro mais esperado, principalmente pelo governador de São Paulo, João Doria, que está às volta com 40 das 46 mortes pelo Covid-19. Mas a reunião, que ocorreu um dia depois de um pronunciamento em que o presidente criticava medidas de isolamento entre os Estados, acabou em um duelo entre o presidente e o governador de São Paulo, seu ex-apoiador e hoje desafeto, João Doria (PSDB).

Mais informações
Por que o coronavírus mata quase o dobro de homens que de mulheres
AO VIVO | Últimas notícias sobre o coronavírus no Brasil e no mundo
Em cadeia de TV, Bolsonaro minimiza coronavírus para insuflar base radical

O governador paulista iniciou sua fala “lamentando” o pronunciamento feito pelo presidente na noite anterior. Na ocasião, Bolsonaro foi à rede nacional de televisão para, mais uma vez, minimizar a pandemia, que já matou mais de 19.000 pessoas em todo o mundo e ao menos 46 no Brasil. Novamente, o presidente insistiu que se trata de uma “histeria” sobre uma “gripezinha”. Na contramão de todas as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), Bolsonaro questionou medidas tomadas em alguns Estados do País, como o fechamento de escolas. “O que se passa no mundo tem mostrado que o grupo de risco é o das pessoas acima dos 60 anos. Então, por que fechar escolas?”, disse o presidente, afirmando que “devemos sim voltar à normalidade”.

João Doria, que governa o epicentro da pandemia, já havia decretado quarentena em todo o Estado, onde escolas, restaurantes, bares, cafés, lojas, clubes, academias e espaços culturais estão fechados oficialmente desde terça-feira. “O senhor, como presidente da República, tem que dar o exemplo. E tem que ser o mandatário para comandar, para dirigir, para liderar o país e não para dividi-lo”. O tom do discurso de Doria é o mesmo que ele vem usando há algum tempo durante as entrevistas coletivas diárias: questionar a liderança e a postura do presidente. Desta vez, o governador aproveitou o momento para enviar a mensagem diretamente a ele, ainda que virtualmente.

O vídeo, gravado a partir do gabinete do governador paulista e veiculado antes mesmo de a reunião —fechada para a imprensa— terminar, mostra que Bolsonaro mordeu a isca lançada pelo tucano. Com posição fragilizada pela postura autoritária e contrária às recomendações mundiais diante da pandemia reafirmada na noite de terça em seu pronunciamento, o presidente se descontrolou ao responder. Desviou do assunto e lembrou das mágoas do passado: “Agradeço as suas palavras, senhor governador, completamente diferentes e dissociadas por ocasião das eleições de 2018 onde vossa excelência apoderou-se do meu nome para se eleger governador”, respondeu Bolsonaro.

Em 2018, ao perceber a ascensão da popularidade do então candidato Bolsonaro, Doria criou o nome BolsoDoria, para mostrar que era aliado do ex-capitão. O namoro durou pouco depois das eleições. “Guarde as suas observações para a ocasião das eleições de 2022″, afirmou o presidente agora. "Onde vossa excelência poderá destilar todo o seu ódio e demagogia por ocasião das mesmas”. Minutos após a reunião terminar, já havia três publicações de João Doria no Twitter sobre a troca de farpas.

Na véspera, Doria havia feito o primeiro aceno ao presidente, ao elogiar, em entrevista coletiva, a iniciativa do mandatário de conversar com todos os governadores sobre a pandemia. O fez, porém, não sem lembrar que “há 15 meses que os governadores do Sudeste não têm nenhuma reunião nem presencial e nem virtual com o presidente”. Agora, aproveitou a entrevista coletiva que deu na sequência à reunião para reforçar os ataques. “Lamento que o presidente prefira escutar o gabinete do ódio do que o gabinete do bom-senso”, afirmou. Ele se refere ao grupo de assessores ligados ao vereador e filho do presidente, Carlos Bolsonaro, apontados como responsáveis pelos posicionamentos mais radicais e agressivos do presidente.

O governador lembrou que o Estado tem hoje 6,8 milhões de pessoas com mais de 60 anos. “É justo abandonar essas pessoas à própria sorte?”, questionou. Para finalizar a entrevista coletiva desta terça, Doria, que já distribuiu destemperos em vídeos e mensagens contra desafetos políticos até mesmo dentro do seu partido, quis deixar um “recado” para o presidente. "Quem espalha o amor não tem tempo nem disposição para jogar pedras”, afirmou, mencionando uma frase de Irmã Dulce.


Informações sobre o coronavírus:

- Clique para seguir a cobertura em tempo real, minuto a minuto, da crise da Covid-19;

- O mapa do coronavírus no Brasil e no mundo: assim crescem os casos dia a dia, país por país;

- O que fazer para se proteger? Perguntas e respostas sobre o coronavírus;

- Guia para viver com uma pessoa infectada pelo coronavírus;

- Clique para assinar a newsletter e seguir a cobertura diária.

Mais informações

Arquivado Em