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Maria Carolina Santiago, dona de três ouros e de um lugar na história do esporte paralímpico brasileiro

Aos 36 anos, nadadora que compete entre deficientes visuais estreou em Paralimpíadas com cinco pódios, três deles dourados. Já é a brasileira mais premiada em Tóquio, e uma das maiores da história

Carol Santiago com suas cinco medalhas conquistadas em Tóquio, três delas de ouro.
Carol Santiago com suas cinco medalhas conquistadas em Tóquio, três delas de ouro.ALE CABRAL/CPB
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Maria Carolina Santiago, um nome para cada medalha de ouro conquistada nos Jogos Paralímpicos de Tóquio 2020. A nadadora despontou como a maior vencedora entre os 260 atletas brasileiros que viajaram ao Japão ao subir no pódio em cinco das seis provas em que competiu. Santiago venceu os 50m livre, os 100m livre e os 100m peito, batendo dois recordes paralímpicos, e ainda foi prata no revezamento 4x100m livre misto e bronze nos 100m costas. Todas as provas disputadas em classes para deficientes visuais. Um início arrasador para a pernambucana de 36 anos que, em sua estreia paralímpica, já entra na história como uma das atletas brasileiras mais premiadas da história e encabeça o melhor desempenho da natação do país nessa competição.

Nascida no Recife, Maria Carolina cresceu em Caruaru, cidade do interior a 130 quilômetros da capital pernambucana. Ela tem a síndrome chamada de Morning Glory, uma condição rara que atinge o sistema nervoso e reduziu sua visão para 30% da capacidade. Começou a praticar a natação aos quatro anos de idade pelo baixo impacto que o esporte teria em sua visão prejudicada. Aos 12, já disputava competições para atletas com deficiência e em águas abertas. No entanto, cinco anos depois, ficou completamente cega por oito meses devido ao acúmulo de água na retina. Se curou, mas abandonou o esporte. Só voltou a frequentar uma piscina dez anos depois, quando tinha 27.

O intervalo explica a estreia atrasada de Santiago numa Paralimpíada, aos 36 anos. Ainda que o esporte paralímpico seja conhecido por possibilitar a competição entre atletas mais velhos que o convencional, o caso não chega a ser comum na natação —Daniel Dias, maior ídolo do esporte, anunciou a aposentadoria aos 33 anos após quatro Paralimpíadas. É a mesma idade com a qual Carol ingressou pela primeira vez num clube de natação paralímpica, o Grêmio Náutico União de Porto Alegre, em 2018.

A partir daí, ela ascendeu rapidamente até o topo de esporte. No ano seguinte, disputou o Parapan-americano e o Mundial de Londres. No Parapan, quatro ouros: 50m livre, 100m livre, 400m livre e 100m costas. No Mundial, mais dois ouros, nos 50m e 100m livre, e duas pratas, nos 100m costas e no revezamento 4x100m livre. Apesar do ano de 2020 sem frequentar competições, Carolina voltou à seletiva paralímpica brasileira em junho de 2021 quebrando o recorde mundial dos 50m livre e se classificando para seis provas paralímpicas.

Para aquecer, a primeira final da brasileira na Paralimpíada de Tóquio terminou com a medalha de bronze, nos 100m costas da classe S12. A segunda, dois dias depois, foi concluída com o ouro e um novo recorde paralímpico: 26s82 nos 50m livre S13. O primeiro lugar quebrou um jejum de 17 anos sem que uma mulher brasileira vencesse uma prova de natação paralímpica. A última havia sido com Fabiana Sugimori, em Atenas 2004. Depois, Santiago embalou seu segundo ouro, no 100m livre S12, e, no mesmo dia, foi prata no revezamento 4x100m livre misto 49 pontos. Por fim, fechou sua participação com mais um ouro e um recorde paralímpico (1min14s89), no 100m peito S12, neste dia 1º de setembro. A única final na qual não foi para o pódio foi os 100m borboleta S12, que finalizou em sexto lugar.

“Eu sempre fui apaixonada pela natação. É onde eu me sinto melhor, onde eu me sinto feliz. Eu sinto essa sensação de estar onde eu queria estar. É minha melhor versão”, declarou emocionada ao vivo no Encontro com Fátima Bernardes, programa da TV Globo, após seu último ouro. “Eu tenho vivido os melhores momentos da minha vida. Que esses resultados importantes no feminino possam inspirar novas atletas. Que outras meninas vejam que é possível”, desejou.

Tanto a S12 como a S13 são categorias da natação para deficientes visuais. Este esporte paralímpico abriga deficientes funcionais da S1 a S10, visuais da S11 a S13 e intelectuais na S14. Carol não é totalmente cega (caso dos S11), então fica alocada na S12. Ela disputou os 50m livre na S13 porque não houve esportistas S12 suficientes para formar a prova nesta categoria. No caso do revezamento 4x100m livre misto 49 pontos, a modalidade é disputada de forma que a soma entre as classes dos quatro atletas envolvidos seja igual ou menor que 49. O Brasil, por exemplo, competiu com Wendell Belarmino (S11), Douglas Matera (S13), Lucilene da Silva (S12) e Carol (S12), todos deficientes visuais, totalizando 48 na soma das classes.

Maria Carolina encabeça um desempenho histórico da natação brasileira em Tóquio. No oitavo dia de competições, o esporte já deu 20 medalhas para o Brasil, superando os recordes de Rio 2016 e Pequim 2008, quando o país subiu a 19 pódios na modalidade. Foram, até agora, seis ouros, cinco pratas e nove bronzes. Um destaque importante para o esporte que perde a lenda Daniel Dias, mas ganha, além de Carol, prodígios como Gabriel Bandeira e Gabriel Araújo, que se tornam campeões aos 21 e 19 anos de idade, respectivamente. Santiago também já é a nadadora brasileira mais vitoriosa da história das Paralimpíadas.

Mas os louros de Carol vão além da natação. Entre todos os atletas que competem em Tóquio 2020, ela só ganhou menos que o bielorrusso Ihar Boki (cinco ouros) e que o chinês Thao Zeng (quatro ouros), ambos nadadores. Entre as mulheres, é a primeira. Os resultados também a colocam no Olimpo de atletas brasileiras. Ela frequenta, agora, a mesma mesa de Ádria Santos, que venceu quatro medalhas de ouro, oito de prata e uma de bronze no atletismo entre 1988 e 2008; e de Terezinha Guilhermina, outra do atletismo, dona de três ouros, duas pratas e três bronzes entre 2004 e 2016. Ádria, Terezinha e Carolina são, agora, as três brasileiras mais premiadas em Jogos Paralímpicos, com a diferença que Santiago conseguiu sua coleção numa só edição. E ela promete não parar por aí. “A gente viu que realmente dá certo, e estou bem empolgada para Paris 2024. Quero passar por essa preparação de uma forma menos difícil do que foi Tóquio [por conta da pandemia]”, disse ela, que terá 39 anos nos próximos Jogos.

Por fim, as medalhas da nadadora coroam uma campanha especial para o esporte feminino do Brasil. Somando os Jogos de 2008, 2012 e 2016, apenas três mulheres foram campeãs paralímpicas individuais representando o Brasil. Em Tóquio 2020, já são cinco: Silvânia Costa (salto em distância), Mariana D’Andrea (halterofilismo), Alana Maldonado (judô), Beth Gomes (lançamento de disco) e Maria Carolina Santiago.

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