Do que tanto ri esse tal de Scorsese?
O humor, se não é engraçado, irrita. Isso explica algumas reações às opiniões de Fran Lebowitz exibidas em ‘Faz de conta que NY é uma cidade’, da Netflix
Com o humor acontece algo que não ocorre com nenhuma forma de arte: só é valorizado se você acha engraçado. Qualquer crítico pode reconhecer o valor de um livro ou um filme de que não gosta ou até detesta. Uma pessoa pode dizer que David Lynch é chato e destacar, ao mesmo tempo, que o considera um dos grandes artistas do século. Por outro lado, se um humorista não fizer você rir, será muito difícil que você encontre a generosidade, a paciência e a equanimidade necessárias para afirmar que aprecia seu talento e entender que outros riam com suas piadas.
Porque o humor, como diz o clichê dos críticos preguiçosos, não deixa ninguém indiferente. Se não é engraçado, irrita. Nada incomoda mais do que um engraçadinho. Isso explica algumas reações às opiniões de Fran Lebowitz. Existem muitas pessoas desconcertadas pela força das gargalhadas de Martin Scorsese na série ‘Faz de conta que NY é uma cidade’, da Netflix. “Do que ele ri?”, perguntam-se. Ginia Bellafante fez essa pergunta no The New York Times, intrigada pelos jovens que lotam teatros para escutar o que, para ela, não são mais do que resmungos de uma velha. Bellafante pergunta no título e, 1.300 palavras depois, continua sem saber.
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Clique aquiO que dói mesmo é que Scorsese se divirta mostrando os dentes. Pode-se desprezar o gosto das pessoas comuns, mas não o de um deus maior do Parnaso. Se os filmes do diretor significarem algo para você, a admiração passional que ele tem por uma humorista que você despreza é quase uma traição. Ou Scorsese demonstra ser um grosseiro que não merece os louros, ou você está deixando de captar algo sutil e profundo. Ou ele é um idiota ou você é que é, e como a primeira opção parece muito improvável, a aterradora possibilidade da segunda o enfurece tanto que você não percebe que o humor é visceral e não se curva a nenhuma crítica.
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