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Mesmo assintomáticos, vacinados e curados de covid-19 podem transmitir o coronavírus

Imunizados propagam o coronavírus quando suas defesas imunológicas não atingem a eficiência total, segundo vários estudos

Profissional colhe amostra de uma mulher para exame PCR no hospital militar de Sevilha (Espanha), neste mês.
Profissional colhe amostra de uma mulher para exame PCR no hospital militar de Sevilha (Espanha), neste mês.PACO PUENTES

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“Não imaginei que teria covid-19 pela segunda vez. Até que ponto ter tido imuniza?”, questiona médica
Una sanitaria vacuna contra el Covid-19 a una persona en el Antiguo colegio de Maristas, a 10 de abril de 2021, en Pamplona, Navarra (España). La jornada de hoy es el primer día de apertura del colegio para las vacunaciones contra la Covid-19 con la dosis de AstraZeneca y pruebas PCR.
ASTRAZENECA;MARISTAS;VACUNA;CENTRTO;ESPAÑA;PAMPLONA;NAVARRA;CORONAVIRUS;COVID19;CALLE
Eduardo Sanz / Europa Press
10/04/2021
Por que falamos de 70% da população vacinada como uma ‘cifra mágica’ para acabar com a covid-19?
A woman wearing a face mask walks past a mural, following the coronavirus disease (COVID-19) outbreak, in Hong Kong, China, August 25, 2020. REUTERS/Lam Yik     TPX IMAGES OF THE DAY
Reinfectados, o grande enigma da pandemia

Casos de covid-19 entre pessoas que já haviam tido a doença ou se vacinaram são raros. Mas ocorrem e são motivo de atenção: ainda é cedo para o vale-tudo, para a volta à normalidade absoluta. Diversos estudos detectaram infecções entre 10% e menos de 1% das pessoas já imunizadas, segundo o momento, o coletivo, o local da pesquisa e a pauta de vacinação. Estas pessoas, assintomáticas na maioria dos casos graças à imunidade natural ou induzida pelas vacinas, ainda conservam durante um tempo a capacidade de abrigar e propagar o coronavírus, mesmo sem desenvolverem a doença. Para evitar o risco de propagação dos contágios, adverte Guillermo López Lluch, catedrático de Biologia Celular da Universidade Pablo de Olavide (UPO), em Sevilha (Espanha), é preciso “alcançar a imunidade coletiva mais ampla possível no menor prazo de tempo”. “É uma corrida contra o vírus”, diz.

O biólogo viu de perto um imunizado sendo infectado. Tratava-se de uma pessoa próxima a ele, de 92 anos e já vacinada com as duas doses prescritas, que precisou ser internado no setor de ortopedia de um hospital de Córdoba, no sul da Espanha. Ao passar por um exame de rotina, deu positivo para covid-19 apesar de não ter sintomas compatíveis com a doença.

Jocelyn Keehner e Lucy E. Horton, junto a outros membros da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) e San Diego (UCSD), publicaram em março na revista The New England Journal of Medicine os resultados de uma pesquisa interna: “O risco absoluto de dar positivo para o SARS-CoV-2 [coronavírus causador da covid-19] depois da vacinação foi de 1,19% entre os trabalhadores sanitários da UCSD e de 0,97% entre os da UCLA; estas taxas são superiores aos riscos notificados nos ensaios da vacina contra o coronavírus ARNM-12731 [Moderna] e a vacina BNT162b2.2 [Pfizer-BioNTech]”.

O estudo aponta as mesmas conclusões, embora com diferentes cifras, de outro trabalho publicado no mês passado pelos Centros para o Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos e outros anteriores que saíram na Nature e British Medical Journal.

Todos esses trabalhos confirmam a existência de infecções em imunizados, embora seu registro seja raro. López Lluch aventa uma razão: “É muito provável que os casos sejam mais numerosos que os detectados, já que, na maioria das ocasiões, não produzem sintomas e, portanto, essas pessoas, que são consideradas imunizadas, não são encaminhadas para exame PCR”. Mark Pandori, diretor do laboratório de Saúde Pública de Nevada, concorda: “Estamos subestimando os casos de reinfecção. São muito difíceis de determinar, são necessários equipamentos especializados para fazer esse trabalho ou um laboratório central”, explica ele na Scientific American.

López Lluch remete a um recente estudo publicado na The Lancet para argumentar que, embora a resposta imunológica gerada pela vacinação ou pelo próprio corpo previna o contágio e as sequelas mais graves da covid-19, existem imunizados que se infectam e podem ser um foco de dispersão do vírus, mesmo que mostrem sintomatologia leve ou nula.

O especialista em biologia celular explica que a causa é a carga viral, a quantidade de vírus que circula no organismo do infectado. As pessoas imunizadas dispõem de uma linha de defesa formada pelos linfócitos B e T. “Os primeiros produzem os anticorpos, atrapalham o vírus para que não se introduza na célula. Os segundos o atacam diretamente e geram intermediários, como o interferon, as proteínas que apontam a presença de um vírus e impedem sua proliferação”, diz ele, numa explicação simplificada.

Mas enquanto este sistema age para eliminar a infecção, uma pessoa, embora não desenvolva a doença, pode manter uma determinada carga viral. Nesse sentido, López Lluch explica que “a imunidade é uma questão de dias. Enquanto não estivermos imunes, o vírus ou o agente patogênico tem muito tempo para provocar danos que se refletem nos sintomas, que são mais graves. As defesas de nosso corpo são ineficientes e levam tempo, entre 10 e 14 dias, para se ativarem completamente. Quando estamos imunes, a resposta dos linfócitos B e T é mais rápida, e o agente patogênico tem menos tempo para provocar danos. Porém, se alguém imunizado, mas com carga viral, emite aerossóis na frente de alguém que não tem as mesmas defesas, pode contagiar. Se a outra pessoa estiver imunizada, a possibilidade de a doença se espalhar é mínima”.

Por esta razão, o biólogo da UPO aponta a importância de manter as medidas preventivas comuns até que a vacinação seja geral. Essa realidade mudará, observa López Lluch, quanto mais rápida e abrangente for a campanha de vacinação. “Enquanto não se obtiver a imunidade de rebanho”, conclui o especialista, “as mutações que dão maior infectividade ao vírus terão maior capacidade de se propagarem para mais pessoas”.

As variantes de rápida propagação do coronavírus acarretam mutações que lhe permitem escapar de parte da resposta imunológica criada naturalmente ou pela vacinação, segundo um novo estudo publicado na Science por cientistas dos EUA, Alemanha e Países Baixos. Os pesquisadores se centraram principalmente em três mutações: K417N, E484K e N501Y. Sós ou combinadas, elas se encontram na maioria das principais variantes do SARS-CoV-2 e afetam a espícula, a estrutura pontiaguda que permite ao vírus entrar na célula humana. Os cientistas determinaram que alguns anticorpos perdem a capacidade de neutralizar eficazmente o vírus quando as mutações estão presentes.

Reinfecções

A importância da vacinação maciça que inclua todas as faixas etárias é respaldada também pelo neurologista Seth M. Glickenhaus, da Faculdade de Medicina Monte Sinai (EUA), autor principal de um estudo sobre a reinfecção em jovens publicado na The Lancet. “Nossas conclusões indicam que a reinfecção pelo SARS-CoV-2 acontece em adultos jovens. Apesar de ter sofrido uma infecção prévia, os jovens podem contrair o vírus novamente e ainda podem transmiti-lo aos outros. Este é um ponto importante a conhecer e recordar à medida que as vacinas continuam sendo administradas. Os jovens devem receber a vacina sempre que for possível, já que a vacinação é necessária para aumentar as respostas imunológicas, prevenir a reinfecção e reduzir a transmissão.”

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O estudo mostra, segundo os autores, que os anticorpos induzidos pela infecção do SARS-CoV-2 são em grande medida protetores, mas não atuam completamente contra a reinfecção nos jovens. O trabalho monitorou mais de 3.249 marines dos Estados Unidos entre maio e novembro de 2020. Ao redor de 10% (19 de 189) dos participantes que previamente tinham passado pela doença se infectaram novamente. O estudo determinou que aqueles sem imunidade tinham cinco vezes mais risco de infecção que os participantes com anticorpos, mas estes últimos ainda apresentavam algum risco de reinfecção.

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