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Formigas também fazem ‘lockdown’ para proteger o formigueiro em suas epidemias

Estudo analisa as estratégias que os animais desenvolveram para enfrentar doenças contagiosas

As formigas da espécie ‘Lasius niger’ se afastam do ninho para morrer quando são infectadas por um fungo.
As formigas da espécie ‘Lasius niger’ se afastam do ninho para morrer quando são infectadas por um fungo.GEtty
Miguel Ángel Criado

Como os humanos, as formigas se isolam umas das outras quando enfrentam uma doença contagiosa. Como os humanos, os babuínos evitam os indivíduos infectados. E, como os humanos, morcegos doentes reduzem seus contatos aos parentes mais próximos (suas mães). Mas uma revisão das estratégias que os animais usam para enfrentar as suas próprias epidemias mostra duas situações menos habituais no caso dos humanos: entre os insetos sociais, pode ocorrer a expulsão violenta dos infectados, mas também os doentes, quando sentem a proximidade da morte, se afastam para sempre de forma voluntária, a fim de proteger a colônia.

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Sebastian Stockmaier é pesquisador de comportamento animal na Universidade do Texas em Austin (EUA). É também coautor de uma revisão publicada na Science que reúne o conhecimento científico a respeito de como os animais alteram suas condutas para enfrentar agentes patogênicos. Stockmaier está convencido de que os humanos não inventaram nada. “Não me surpreende que os animais exibam comportamentos parecidos para conter a propagação das doenças contagiosas. Não somos os únicos que continuamente precisam enfrentar agentes patogênicos”, diz ele por e-mail. “Especificamente, não me surpreende como desenvolveram padrões que protegem os indivíduos saudáveis da infecção, evitando os congêneres doentes, por exemplo.”

O autoisolamento passivo talvez seja a estratégia mais universal, incorporada à fisiologia animal (inclusive humana). Assim como fazem as pessoas gripadas, indivíduos de diversas espécies entram numa espécie de letargia que os leva a reduzir a interação com o resto do grupo. Quanto menor o contato, menor o contágio.

A fisiologia também serve para dar pistas aos saudáveis sobre quem precisa ser isolado. Entre os mandris (parentes próximos dos babuínos), observou-se que os não infectados se tornam menos disponíveis para pentear os membros do grupo que estiverem infestados com um parasita intestinal. E como sabem? Porque as fezes dos animais infectados pelos protozoários têm um cheiro diferente. Aliás, os mandris saudáveis deixam justamente de limpar e retirar pulgas na zona ao redor do ânus dos doentes.

Mas há outras estratégias mais ativas, moldadas pela pressão seletiva exercida pelos agentes patogênicos. As formigas da espécie Lasius niger, uma das mais comuns da Europa, evitam entrar no ninho quando são infectadas por um fungo que prolifera na sua cutícula, a parte mais externa do seu corpo. Porém, o autoisolamento pode chegar a ser um exemplo radical de altruísmo. É o que conta Nathalie Stroeymeyt, coautora do estudo e responsável pelo laboratório de epidemiologia das formigas na Universidade de Bristol (Reino Unido): “Como última reação, quando estão perto da morte, elas deixam completamente o formigueiro para morrerem isoladas. Não está claro que sinais usam para decidir quando é hora de irem embora para sempre, mas isso também foi observado depois que as formigas foram expostas a toxinas ou ao CO2, então não é algo específico de uma doença em particular”.

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Os insetos sociais, como as formigas, são os animais que mais desenvolveram estratégias e mudanças de comportamento para frear contágios. Algumas são de caráter altruísta, como a praticada por cupins de madeira úmida, que começam a vibrar em questão de minutos quando esporos de um determinado fungo grudam no seu corpo. Essa vibração alerta os demais cupins, que se afastam dos atingidos. Também há violência. Assim, as abelhas melíferas expulsam as infectadas à força da sua colmeia. Tudo pela colônia.

Há ainda outra estratégia mais fascinante e que parece uma boa resposta ao problema dos assintomáticos. Usando etiquetas identificativas aderidas ao abdome das formigas, o grupo de Stroeymeyt acompanhou seus movimentos perante a ameaça de um agente patogênico. Viram que, depois que a infecção penetra no ninho, as formigas coletoras e as encarregadas de cuidar das crias deixam de manter contato, mesmo que ambas estejam sãs. Além disso, as últimas trocavam as pupas de lugar, e as primeiras reduziam suas entradas no ninho. O formigueiro inteiro se organizava em compartimentos, numa espécie de lockdown.

“As formigas desenvolveram uma grande quantidade de mecanismos para diminuir o risco de epidemias e, como são uma espécie social, como nós, talvez possamos nos inspirar em algumas de suas soluções”, propõe Stroeymeyt. “Por exemplo, elas praticam a quarentena e o distanciamento social proativo, como temos feito durante a pandemia de covid-19, por isso é provável que sejam medidas muito efetivas para combater doenças”, acrescenta.

Entretanto, a entomóloga observa que existem limites para o que podemos aprender com os insetos sociais. “Primeiro, porque a estrutura da rede social dentro das sociedades de formigas é muito diferente das sociedades humanas, o que limita as aplicações diretas. Em segundo lugar, porque as formigas são altruístas e estão dispostas a se sacrificarem a si mesmas ou sacrificar outras formigas em benefício da colônia (por exemplo, com o autoisolamento ou matando de indivíduos infecciosos), que não é algo aplicável ou desejável nas sociedades humanas.”

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