
Um farol abandonado
9 fotosSegunda edificação mais antiga de Fortaleza, o Farol Velho do Mucuripe está desmoronando. A comunidade ao seu redor luta por ações para recuperá-lo.
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1O Farol Velho foi levantado com mão de obra escrava na década de 1840 e é uma das edificações mais antigas de Fortaleza, a capital do Ceará. Foi desativado em 1957 e tombado patrimônio histórico em 1983. Mas, sem reformas há pelo menos 40 anos, está sob risco de desmoronar. Fernanda Siebra -
2A edificação tem registro de risco de desabamento há pelo menos uma década. Há duas semanas, a cúpula de metal onde ficava a luz que iluminava o mar, acendida pela primeira vez há 150 anos, desmoronou. Dentro do farol, a maresia corroeu o ferro da escada circular, agora sustentada apenas pelas laterais de alvenaria. Todas as paredes, internas e externas, foram pintadas com o grito de uma comunidade que exige ser vista. Em um cinturão preto desenhado para simbolizar o luto pelo farol que se despedaça, o Titanzinho saúda os visitantes: “Bem-vindo ao abandono”. Fernanda Siebra -
3O Farol Velho está fincado em uma esquina da orla de Fortaleza. Fica entre os dois principais pontos turísticos da cidade: a Praia do Futuro e a Beira-Mar. Dentro de uma comunidade indesejável ao Turismo e onde até hoje falta o básico, o Titanzinho, ele espera há décadas uma reforma. Fernanda Siebra -
4Ao longo dos anos, o Tintanzinho viu chegar água, mas não saneamento. A violência aumentou, e as facções foram se apoderando dos espaços enquanto a pobreza crescia. O bairro costumava ser mal visto por ter tantos cabarés, onde prostitutas recepcionavam marinheiros. Sorte sempre foi ter o mar tão perto, dando peixe para comer e onda para formar surfistas. Houve quem saísse dali para campeonatos mundiais depois de aprender a surfar em um pedaço de tábua diante da omissão de um Estado que não os vê. A maioria dos cerca de 2.000 moradores da comunidade vive da pesca, do surf ou das empresas de gás natural, petróleo e alimentos que há no entorno. Fernanda Siebra -
5Kátia Cilene cresceu e criou dois filhos em uma casa que construiu com as próprias mãos pertinho do mar, naquela faixa de praia abandonada ―mas nunca esquecida― com medo de ser expulsa. Em 2014, a Prefeitura de Fortaleza chegou a apresentar um projeto para restaurar a segunda edificação mais antiga da cidade. Planejou uma praça, um calçadão e a retirada de 200 famílias da região. O projeto até começou a sair do papel à revelia da comunidade, mas logo foi abandonado por falta de verba. Cinco anos depois, o Governo do Estado chegou a negociar a instalação de um estaleiro na região. Ouviu um ruído forte da comunidade e de ambientalistas pelo receio dos impactos à região, um berço de corais e área de desova de tartarugas durante a reprodução. Fernanda Siebra -
6Na casa onde mora, bem de frente para o mar, Kátia Cilene manuseia antigos álbuns de fotografias que guardam suas lembranças de um tempo que era possível subir no topo do farol. Fernanda Siebra -
7Agora, enquanto o farol desfalece, o Governo do Ceará diz trabalhar em um novo projeto, depois de ter conseguido a cessão do equipamento pelo Governo Federal no ano passado. Mas não dá prazos nem esclarece se ouvirá a comunidade que construiu um verdadeiro forte para defender aquele território. No fim de julho, o Iphan esteve no local para avaliar se há sítio arqueológico na área e um relatório sairá dentro de 15 dias. Após a entrega desse documento, a Secretaria do Turismo verificará quais ações serão adotadas para dar prosseguimento ao projeto de restauro do farol. Fernanda Siebra -
8O pescador Chicão, de 80 anos, chegou ao Titanzinho depois de ser uma removido da antiga Praia do Peixe para a construção do calçadão turístico da Beira-Mar e da avenida que agora separam o mar dos prédios de luxo. Décadas depois, Chicão não está nem um pouco disposto a mudar outra vez do lugar onde criou os filhos e netos, em uma casa de costas para o mar que a maré de janeiro insistia em alagar. “Hoje a maré não alaga mais, não vejo risco nenhum aqui. Este é o melhor lugar que tem pra nossa casta, dos pobres. Aqui só passa fome quem for preguiçoso porque peixe o mar dá.” Fernanda Siebra -
9Kátia Cilene anda pelas ruas da comunidade e sente o abandono. “Aqui fizemos a nossa vida, a nossa cultura, o nosso lazer. Mas o poder público nos deu as costas”, queixa-se. Fernanda Siebra