9 fotosUm farol abandonadoSegunda edificação mais antiga de Fortaleza, o Farol Velho do Mucuripe está desmoronando. A comunidade ao seu redor luta por ações para recuperá-lo.El País08 ago. 2021 - 17:54BRTWhatsappFacebookTwitterLinkedinLink de cópiaO Farol Velho foi levantado com mão de obra escrava na década de 1840 e é uma das edificações mais antigas de Fortaleza, a capital do Ceará. Foi desativado em 1957 e tombado patrimônio histórico em 1983. Mas, sem reformas há pelo menos 40 anos, está sob risco de desmoronar.Fernanda SiebraA edificação tem registro de risco de desabamento há pelo menos uma década. Há duas semanas, a cúpula de metal onde ficava a luz que iluminava o mar, acendida pela primeira vez há 150 anos, desmoronou. Dentro do farol, a maresia corroeu o ferro da escada circular, agora sustentada apenas pelas laterais de alvenaria. Todas as paredes, internas e externas, foram pintadas com o grito de uma comunidade que exige ser vista. Em um cinturão preto desenhado para simbolizar o luto pelo farol que se despedaça, o Titanzinho saúda os visitantes: “Bem-vindo ao abandono”.Fernanda SiebraO Farol Velho está fincado em uma esquina da orla de Fortaleza. Fica entre os dois principais pontos turísticos da cidade: a Praia do Futuro e a Beira-Mar. Dentro de uma comunidade indesejável ao Turismo e onde até hoje falta o básico, o Titanzinho, ele espera há décadas uma reforma.Fernanda SiebraAo longo dos anos, o Tintanzinho viu chegar água, mas não saneamento. A violência aumentou, e as facções foram se apoderando dos espaços enquanto a pobreza crescia. O bairro costumava ser mal visto por ter tantos cabarés, onde prostitutas recepcionavam marinheiros. Sorte sempre foi ter o mar tão perto, dando peixe para comer e onda para formar surfistas. Houve quem saísse dali para campeonatos mundiais depois de aprender a surfar em um pedaço de tábua diante da omissão de um Estado que não os vê. A maioria dos cerca de 2.000 moradores da comunidade vive da pesca, do surf ou das empresas de gás natural, petróleo e alimentos que há no entorno.Fernanda SiebraKátia Cilene cresceu e criou dois filhos em uma casa que construiu com as próprias mãos pertinho do mar, naquela faixa de praia abandonada ―mas nunca esquecida― com medo de ser expulsa. Em 2014, a Prefeitura de Fortaleza chegou a apresentar um projeto para restaurar a segunda edificação mais antiga da cidade. Planejou uma praça, um calçadão e a retirada de 200 famílias da região. O projeto até começou a sair do papel à revelia da comunidade, mas logo foi abandonado por falta de verba. Cinco anos depois, o Governo do Estado chegou a negociar a instalação de um estaleiro na região. Ouviu um ruído forte da comunidade e de ambientalistas pelo receio dos impactos à região, um berço de corais e área de desova de tartarugas durante a reprodução.Fernanda SiebraNa casa onde mora, bem de frente para o mar, Kátia Cilene manuseia antigos álbuns de fotografias que guardam suas lembranças de um tempo que era possível subir no topo do farol. Fernanda SiebraAgora, enquanto o farol desfalece, o Governo do Ceará diz trabalhar em um novo projeto, depois de ter conseguido a cessão do equipamento pelo Governo Federal no ano passado. Mas não dá prazos nem esclarece se ouvirá a comunidade que construiu um verdadeiro forte para defender aquele território. No fim de julho, o Iphan esteve no local para avaliar se há sítio arqueológico na área e um relatório sairá dentro de 15 dias. Após a entrega desse documento, a Secretaria do Turismo verificará quais ações serão adotadas para dar prosseguimento ao projeto de restauro do farol.Fernanda SiebraO pescador Chicão, de 80 anos, chegou ao Titanzinho depois de ser uma removido da antiga Praia do Peixe para a construção do calçadão turístico da Beira-Mar e da avenida que agora separam o mar dos prédios de luxo. Décadas depois, Chicão não está nem um pouco disposto a mudar outra vez do lugar onde criou os filhos e netos, em uma casa de costas para o mar que a maré de janeiro insistia em alagar. “Hoje a maré não alaga mais, não vejo risco nenhum aqui. Este é o melhor lugar que tem pra nossa casta, dos pobres. Aqui só passa fome quem for preguiçoso porque peixe o mar dá.”Fernanda SiebraKátia Cilene anda pelas ruas da comunidade e sente o abandono. “Aqui fizemos a nossa vida, a nossa cultura, o nosso lazer. Mas o poder público nos deu as costas”, queixa-se. Fernanda Siebra