10 fotosNosso ❤ por São Paulo: a redação do EL PAÍS escolhe seus lugares favoritosA cidade completa 463 anos nesta quarta-feira São Paulo - 25 jan. 2017 - 11:48BRTWhatsappFacebookTwitterLinkedinLink de cópiaDe origem nordestina, o Morro do Querosene, lá pros lado do Butantã, é como uma centena de outros bairros descolados. A diferença do Querosene é que ele nunca deixou de ser Querosene. Por algum encanto sem explicação, o dedo do mercado não chegou por lá. O que equivale dizer que os moradores antigos não foram postos para descer as ladeiras do bairro, que no lugar das mercearias não foram abertos cafés de última moda, que os bares não foram substituídos por novos botequins com jeito de antigo. Sendo assim, ali convivem as tradições do festejo popular do Boi Bumbá, popular no nordeste brasileiro; o trabalho de artistas plásticos que escolheram o morro para construírem seus ateliês; e as rodas de samba do bar/garagem da Ieda. A festa do boi acontece três vezes por ano: em abril, junho e em dezembro. E para saber quando vai ter samba ou feira de artistas, o negócio é pesquisar na internet. Contudo, para descobrir mesmo o bairro, o melhor é só caminhar e puxar papo com quem estiver por ali. Com alguma coisa original, você com certeza vai topar. (André de Oliveira)Germania HeibeNa chegada você tem a impressão de que está prestes a entrar em um universo descompassado com seu espírito. Seu objetivo é comprar umas plantinhas, aumentar seu contato diário com a natureza nessa cidade cada vez mais cinza e esperava uma vibe mais de paz para esse seu momento zen. Mas, amigo, ali é caos: é rebolar para escapar de carrinhos carregados de vasos (os motoristas são profissionais), é ignorar esbarrões de pessoas apressadas cujos olhos apontam planilhas de compras (elas são organizadas), é saber que às vezes falta luz (mas ela pode voltar rápido). Você entra meio desconfiado, mas logo começa a descobrir os motivos que fazem a visita valer a pena: aquela planta que você quer, plantólatra, está ali. E as que você não sabia que queria, também. E elas custam tão mais barato que nas floriculturas (em média de 10 a 15 reais um vaso médio) que vai ser sua vez de contratar o carrinho quase atropelador (a 25 reais) para carregá-las para o carro. E saiba: é tanta coisa acontecendo ali que a cada visita é possível descobrir um box inteiramente novo pra você. No fim, acho que o que mais me atrai na Feira de Flores da Ceagesp é que ela é uma síntese de São Paulo: um lugar caótico, feio a primeira vista, mas que quando você começa a entender descobre suas muitas belezas. E se vicia. (Talita Bedinelli)“São Paulo é como o mundo todo”, diz Caetano Veloso, mas em São Paulo cada um vive e circula em sua bolha – e, por consequência, vai aos mesmos lugares e convive com o mesmo tipo de gente o tempo todo. O bom de morar em Santa Cecília, o bairro que escolhi depois de toda uma vida no Rio de Janeiro, é que lá posso ter e ver um pouco de tudo que habita nesta cidade. Vivo em uma região — oficialmente chamada de Vila Buarque — que está a poucos passos da bela e rica Higienópolis e do degradado e encantador centro da cidade. É fácil transitar por esses dois mundos, que em Santa Cecília acabam se misturando. Por lá circulam árabes e judeus, gente pobre e gente rica, jovens hipsters e idosos, a galera da Umbanda e da Igreja Evangélica. Tenho ao meu lado botecos pé sujos, a chique pizzaria Veridiana, o alternativo bar Conceição Discos, o brasileiríssimo Sotero e o barato restaurante japonês Toshiro. Também posso caminhar no Minhocão entre antigos prédios e jardins verticais e depois descansar no gramado do parque Buenos Aires. Aliás, tudo se faz a pé — algo que em São Paulo deve ser valorizado. Isso porque, além de toda essa diversidade, é fácil viver em Santa Cecília. Tem feira, tem supermercados, tem farmácias, tem padarias, tem açougues, tem academias… Tem até o shopping Higienópolis a poucos minutos caminhando, mas tantos comércios locais da região, de todos os tipos e gostos, quase não é preciso ir lá. Santa Cecília, com suas calçadas e esquinas sempre ocupadas, é um bairro com cara e jeito de bairro. Todos os dias me surpreendo com algo novo. E com estações de metro e pontos de ônibus perto, tampouco é necessário ter um carro. De lá é fácil sair e conhecer São Paulo. (Felipe Betim)Mayara Maluceli (facebook)São Paulo é - ou ao menos já foi - um verdadeiro museu do grafite a céu aberto. O Beco do Batman, localizado em uma travessa entre as ruas Luís Murat e Aspicuelta, na Vila Madalena, representa um importante mobiliário deste acervo. Ali estão espalhados grafites de diversos estilos e cores em paredes que formam uma galeria de arte no asfalto de um dos bairros mais boêmios da cidade. O local já é tão turístico, que há visitas guiadas agendadas periodicamente. No ano passado, as vias foram interditadas para os carros, para facilitar a circulação dos visitantes, e receberam iluminação de LED, para que as obras possam ser vista também durante a noite. Nada mais paulistano. (Marina Rossi)João CastellanoPoucos lugares da cidade fazem eu me sentir vivendo em uma metrópole como o bairro da Liberdade. Nos fins de semana, a entropia urbana ao redor da praça dessa Chinatown à brasileira lembra que São Paulo não é cinza. A capital tem tantas cores como as lanternas vermelhas que servem de cartão postal do bairro, as roupas dos cosplayers adolescentes (talvez nem tão jovens assim) que se amontoam na saída da estação Liberdade ou as bugigangas que lotam as vitrines e os olhos dos frequentadores. Para quem sente prazer em comer, a região é um prato cheio – com perdão do trocadilho – independentemente de quanta grana se tenha, e dá até pra levar ingredientes orientais pra casa sem ser assaltado (no sentido figurado). Foi aqui que eu, uma (então) jovem porto-alegrense pouco viajada, descobri que lamen não é miojo, que comida japonesa não é só sushi e que não há melhor forma de curar dor de amor, timidez e mau humor que num karaokê. “Melona de banana” é minha versão particular do “Haagen Dazs de mangaba” da letra dos Paralamas do Sucesso. (Kellen Moraes)Vivian Farinazzo"Até que a gentrificação nos separe", fiz piada com meus vizinhos e amigos da vida toda quando o PPD (Por um Punhado de Dólares)- Cafés Sinceros abriu na rua do supermercado e da minha academia, a Nestor Pestana, no centro de São Paulo. Foi mais um sinal da mudança do bairro, se ajustando aos hábitos e consumo de novos moradores. Mas havia mais que a piada: com o café sinceríssimo, eles me educaram a não adoçar a bebida. Os amigos da vida toda eu encontrava agora por lá sem combinar, fora a rotina boa de dar um oi para a Juliana, Victor e Marcola - eles são todos simpáticos, gatos e criaram mesmo um clima acolhedor. Os recados políticos da lousinha do lado de fora completam o espírito que se instala de vez quando vira "festinha", como deve acontecer neste feriado. Para ser perfeito, só me faltam os jornais impressos - sim, eu ainda sou dessas. (Flavia Marreiro)São Paulo é mais fácil com um parque ao lado. Pode ser o Parque da Aclimação, familiar e pacato. Ou o Parque Trianon, sombra fresca no meio da avenida Paulista. O importante é que seja perto de casa; que se possa chegar a ele a pé. E é a pé que eu chego três ou quatro vezes por semana ao Ibirapuera, para fazer exercícios. Para mim, essa comodidade já seria o bastante, porque os bebedouros e banheiros funcionam bem e existe uma infraestrutura mínima, com pequenas vendas e lanchonetes. Mas o parque ainda abriga museus e um restaurante que costumam agradar às visitas que vêm de fora da cidade. É um bom lugar para respirar, enfim, em uma cidade que pode ser sufocante. (Rodolfo Borges)Rodolfo BorgesAnos atrás a artista plástica Ángela León desenhou a capital paulista como imaginava em seus sonhos, no 'Guia Fantástico de São Paulo'. Nesse mundo imaginário, lá estava o Minhocão, com balanços suspensos, árvores exuberantes e feiras ao ar livre. De todos os lugares retratados pela espanhola, o Elevado João Goulart era talvez o que menos se afastava da realidade —ao menos aos finais de semana. Das 15h de sábado às 6h30 de segunda-feira, esse trambolhão arquitetônico revela seu lado fantástico quando é fechado para carros e reservado aos habitantes não motorizados, ávidos por ocupar seus espaços cinzas e transformá-los em pista de corrida, campo para piqueniques e praia improvisada —sob a moldura de paredões verdes e grafites gigantes (que, por enquanto, ainda resistem). É meu canto preferido de São Paulo, porque não há outro igual, em lugar algum. E por representar tudo o que a cidade é pra mim: ora feia, ora linda, sempre caótica e deslumbrante. (Marina Novaes)Marina NovaesO que mais desorienta o olhar de um estrangeiro em São Paulo é que quase tudo parece ser uma resposta a outra coisa. Os edifícios da Avenida Higienópolis são um deleite para os olhos, mas são tão futuristas que mais do que lugares parecem uma tentativa desesperada de fugir do presente. Os monumentos e lugares históricos estão tão distantes das áreas mais movimentadas e ficaram tanto para trás em tamanho, força e relevância em comparação com os arranha-céus brutalistas do centro que seria possível dizer que os últimos quiseram substituir os primeiros. Aqueles que dizem que as cidades dialogam consigo mesmas me parecem simplórios; quem disse que São Paulo só quer conquistar a si mesma me parece um gênio. Por isso é importante visitar uma região do centro, que fica entre a Praça das Artes e o viaduto Santa Ifigenia. Começa no edifício Martinelli, dos anos vinte – o primeiro arranha-céu da cidade e provavelmente o mais carismático –, e termina no Mirante do Vale de 1960, o maior com seus 170 metros e o mais propício a um entardecer de verão. No meio está o Largo de São Bento, de quando São Paulo era apenas uma grande promessa, um edifício que alguém tirou de Blade Runner e colocou-lhe palmeiras e uma ladeira que alguém roubou de Tóquio. Mas o melhor é quando você passeia pelo viaduto Santa Ifigênia e chega a um ponto, de costas ao lado em que o sol se põe, que tem uma vista muito específica. Um monte de edifícios de diferentes estilos, velhos, novos, abandonados e prontos a inaugurar, separados pela Avenida Prestes Maia. Por um milagre que aqui nem sempre se dá, eles não escondem e esmagam uns aos outros, mas se complementam num conjunto marciano de estilos e cores. Lá, em pleno pasmo diante da coerência acidental que a cidade tem quando a deixam em paz, você fica livre de um peso que não sabia que carregava e acontece como quando um mergulhador fica diante do olho cansado de uma enorme baleia: o que parecia uma bestialidade de repente é natural e, se o animal está tendo um bom dia, até mesmo acolhedor. (Tom C. Avendaño)TOM C. AVENDAÑODe um lado, a Faria Lima, com seus escritórios, seus executivos na hora do almoço e seus centros comerciais; do outro, o Alto de Pinheiros, com suas casinhas ricas e seus restaurantes chiques cheios de gente com barba. No meio, resistente, teimoso, algo sujo, sempre movimentado, o Largo da Batata, meu lugar preferido de São Paulo. Agora, nos dias ensolarados, há cadeiras de praia para que você se deite, feche os olhos e imagine que está em Copacabana. Sabemos que isto não é Copacabana, mas o que você queria... À noite, há bares com música caipira ao vivo, algum puteiro numa esquina, bares com mesas nas calçadas sempre cheias, bailes improvisados no centro da praça, grupos de capoeira, batucadas, funkeiros desarticulados, malucos de bicicleta, gente para cima e para baixo, que vêm e vão. Se você se sentir sozinho, venha para a praça. Eu faço isso sempre. (Antonio Jiménez Barca)ANTONIO JIMÉNEZ BARCA