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Kenti Robles: “Convido-os a assistir a um jogo, nosso futebol vai longe”

Mexicana atua no time feminino do Atlético de Madrid desde 2015 e se consagrou como titular

Diego Mancera
Kenti Robles, em atuação pelo Atlético.
Kenti Robles, em atuação pelo Atlético.A. Marín (EFE)
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Kenti Robles (Cidade do México, 1991) jogava futebol nas ruas da capital mexicana. As traves eram duas jaquetas e seu companheiro em um primo. Aos 12 anos, a família decidiu se mudar para Barcelona. Ela não queria parar de bater bola. “Meu pai torce pelo Barça, mas o primeiro clube que ele procurou foi o Espanyol”, conta ela, em Madri, onde atua como lateral-direita no Atlético de Madrid, líder da Liga Iberdrola. É uma das melhores do país, mas prefere se manter distante de questões relacionadas à seleção.

Pergunta: Como você se envolveu com o futebol?

Resposta: Eu jogava para me divertir. Minha mãe sempre deixou muito claro que os estudos tinham de vir primeiro, e até mesmo hoje eu continuo estudando, pois sei que amanhã não poderei viver do futebol, mas acho que foi quando estava com 16 anos, já estava no Espanyol, vi que me promoveram para o time titular e comecei a achar que podia ir mais longe.

P. Como é ser jogadora de futebol no México, um país onde o machismo é muito forte?

R. Dizem que para vencer a ignorância é preciso ler. Eu os convido a verem um jogo, e ficará muito claro que o nosso futebol vai longe, que não temos nada a invejar do futebol masculino.

P. Quando era mais jovem, você recebeu comentários misóginos por jogar futebol?

R. Sim, claro que todas [as jogadoras] receberam. Hoje em dia eu já não escuto nada, mas quando era pequena o típico era dizerem que “futebol é só para homens”. Acredito que crescemos ouvindo isso. Nossas famílias é que nos deram apoio. Isso nos serviu para entender que, no fim das contas, não existe nenhum esporte que seja apenas para homens.

P. Você prefere jogar na direita?

R. Sim, Sempre joguei como lateral. Cheguei a jogar durante um ano como central, mas acho que todos os técnicos perceberam que eu gosto dessa posição, que tenho um bom retrospecto ali e que é onde eu me coloco melhor.

P. Como chegou ao Espanyol?

R. Minha mãe conheceu um catalão. Fomos então morar em Barcelona. Lembro que eu já lhe pedia há muito tempo que ela me colocasse em um time. Ela não queria que eu largasse os estudos, mas ao final concordou. Na mesma tarde em que procuramos o clube, ele me abriu as portas.

P. Como foram aqueles primeiros anos na equipe?

R. Eu queria pertencer a uma equipe, conviver com mais jogadoras. Conhecer, finalmente, um time competitivo. Já não era apenas um hobby, eu queria crescer, aprender. Foi muito bom. Eu estava muito satisfeita.

P. Como é poder contar aos amigos que jogou no Barcelona, ganhou três campeonatos e duas copas?

R. A passagem pelo Barcelona foi muito gratificante em termos de títulos conquistados. Ganhamos absolutamente tudo com jogadoras incríveis, que chegaram à seleção da Espanha. Para mim foi uma fase muito complicada, porque precisava amadurecer em termos futebolísticos, entender que ainda tinha de melhorar em vários aspectos. Eu achava que já estava perfeita, que tinha engolido o mundo inteiro, e é claro que isso não era verdade. A idade me mostra, hoje, que por mais que você já tenha passado muitos anos jogando, sempre haverá margem para melhorar.

P. Teve um certo desgosto por não ter sido o que esperava?

R. Quem define o time é o técnico. Nunca baixei os braços. Nunca me dei por vencida.

P. Em julho de 2015, o Atlético de Madrid feminino a contratou.

R. Pouco mais de um ano atrás, a presidenta do clube [Lola Romero] me telefonou, sentamos para conversar e ela disse que tinham me visto jogar, e se eu queria fazer parte do Atlético. Foi uma decisão difícil para mim, porque era a primeira vez que eu teria de sair de casa, morar sozinha. Então, tinha de pensar muito bem nas coisas e conversar com minha família para escolher o que seria melhor para mim.

P. Como foi essa primeira temporada no time?

R. É verdade que no começo foi difícil com o técnico [Miguel Ángel Sopuerta]. Ele não me usava, mas eu continuava treinando. Com o novo treinador [Ángel Villacampa], conquistei sua confiança.

P. No primeiro ano você já conquistou a Copa da Rainha contra o Barcelona (3-2).

R. Foi a primeira da história do time. Foi incrível. Eu tinha ganho vários títulos jogando no Barcelona, mas devo dizer que me senti muito confortável no Atlético, sentindo que contribuía para o time. É muito difícil integrar uma equipe que já parte de um grupo. Não esperávamos fazer 3-0 já no primeiro tempo. Foi uma coisa com a qual ninguém havia nem sequer sonhado. Lembro que, no final, quando o juiz apitou o término da partida, não acreditávamos no que tinha acontecido.

Kenti, em jogo contra o Barcelona.
Kenti, em jogo contra o Barcelona.EFE

P. Esta temporada começou bem. O Atlético é líder do campeonato.

R. Temos o desejo de continuar trabalhando, de ver até onde podemos chegar. Os treinos e os jogos da equipe me deixam de boca aberta. Posso dizer que nunca tinha visto jogadoras de nível tão elevado. Estamos em um bom momento. Sinto orgulho das minhas companheiras, pois tenho coisas a aprender de cada uma delas.

P. Você é a primeira mexicana a jogar no Vicente Calderón.

R. Sendo bem sincera, foi só quando o juiz apitou o final do jogo que me dei conta de quanta gente havia no estádio [13.935 espectadores]. O técnico nos disse que confiava em nós, que devíamos jogar como se fosse a nossa última partida. Pediu para nos divertirmos.

P. Como foi enfrentar a sua compatriota Charlyn Corral?

R. Ganhamos do Levante por 5-1. É sempre muito difícil marcar Charlyn. É uma jogadora muito rápida. Consegue enganar você com facilidade em um espaço muito pequeno.

P. Outra mexicana, Nayeli Rangel, vai jogar no Sporting Helva.

R. Desejo tudo de bom para ela. Sei que vai trazer muitas coisas novas. Temos Pamela Tajonar no Sevilha. [As mexicanas]estão gostando do campeonato, os times estão nos utilizando. Creio que isso é bom para o nosso país.

P. Qual é a sua principal característica?

R. A garra. Para mim não tem bola perdida.

P. E o futuro?

R. Gostaria de continuar no Atlético, estar na seleção. Continuar trabalhando. Estar entre as melhores e não largar os estudos.

P. Por que não falar da seleção nem do novo campeonato mexicano?

R. Foi uma decisão que tomei. E que tem o apoio do meu clube.

P. O que você faria para promover o futebol feminino?

R. Colocando-o na televisão. Quando você vê, percebe o que ele lhe transmite.

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