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Coluna
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O Brasil ainda pode

Os Jogos Olímpicos que começam nesta sexta-feira medem sua capacidade de recuperação

 Aficionados de Brasil apoyan a su equipo el jueves 4 de agosto
Aficionados de Brasil apoyan a su equipo el jueves 4 de agostoFernando Bizerra Jr. (EFE)

Esta poderia ter sido a semana em que o Brasil seria coroado no clube das grandes potências: próspero, pujante, capaz de organizar os Jogos Olímpicos que começam nesta sexta-feira. Quando a cidade do Rio de Janeiro recebeu o encargo, há sete anos, desbancando Madri, o trem do Brasil avançava imparável: criava riqueza, isolado da crise financeira, com um estável Governo de esquerda que havia tirado da pobreza 45 milhões de pessoas. Nada parecia ir mal, como confirmava o fato de que a empresa estatal Petrobras havia descoberto diante das costas de São Paulo uma importante jazida de petróleo e gás natural que levou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a recordar o dito nacional de que "Deus é brasileiro". Mesmo que fosse, nada poderia fazer ante a crise global nem perante a proverbial capacidade dos brasileiros de colocarem obstáculos a si próprios e a se precipitarem pela ladeira do derrotismo.

Muitos estão há meses duvidando em público da capacidade do país para organizar jogos com 10.600 competidores.

Não são só a profunda recessão que vive o país, a pior em sua história, nem o desemprego, que superou a barreira dos 11%. Tampouco a crise política é responsável única, com a presidenta Dilma Rousseff afastada do exercício do poder por praticar maquiagem fiscal e um executivo em funções sem legitimidade nem capacidade de governar. Nem sequer é a epidemia do vírus do zika. É a mescla de todos esses fatores com um mais difícil de medir, mas igualmente destrutivo: o célebre complexo de vira lata. Foi o dramaturgo Nelson Rodrigues quem criou em 1950 essa expressão que hoje se usa de forma muito comum, depois que seu país perdeu a final da Copa do Mundo para o Uruguai. Escreveu: "O brasileiro se coloca voluntariamente em uma situação de inferioridade em face do resto do mundo. O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima"

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Que melhor momento que este, portanto, para se pôr para baixo? Muitos estão há meses duvidando em público da capacidade do país para organizar jogos com 10.600 competidores. E ninguém se enfureceu tanto como os próprios brasileiros. Um exemplo: a mídia local do Rio parecia aliviada quando a delegação da Austrália decidiu abandonar recentemente a Vila Olímpica porque, a seu ver, não reunia as condições de habitabilidade que agradaria à imensa maioria dos atletas. Há vários meses há alertas de todo o tipo no país: da sujeira, da insegurança, da lentidão das obras, da possibilidade de um ataque terrorista e até de assuntos de tão difícil solução como a própria existência das favelas.

A cerimônia inaugural desta sexta é uma chance de ouro para que o Brasil demonstre que, apesar de tudo, os jogos Olímpicos são uma oportunidade e um excelente motivo para olhar para o futuro e empenhar-se em sair de suas muitas crises. A Espanha demonstrou em 1992 que algo assim é possível. Embora outros países em apuros tenham organizado com êxito competições dessa envergadura, talvez a diferença seja que, ao contrário do Brasil, esses países acreditavam em si mesmos.

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