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O meio milhão de reais que Claudia Cruz recebeu e não sabe por quê

Mulher de Eduardo Cunha recebeu valores de empresa doadora de campanha do PMDB

Marina Rossi

Investigadores da Operação Lava Jato querem saber a razão pela qual a jornalista Claudia Cruz recebeu mais de 590.000 reais da empresa de logística Libra Terminal, em abril de 2007. Cruz é mulher do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, e a empresa em questão já fez grandes doações para campanhas do PMDB.

A jornalista Claudia Cruz
A jornalista Claudia CruzReprodução / Facebook
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Se depender da jornalista, a força-tarefa terá dificuldades para descobrir as razões do recebimento do dinheiro. Em depoimento que deu à Polícia Federal em abril, Cruz afirmou que “não se recorda a razão do pagamento de 591.254,99 reais” que a sua empresa, a C3Produções Artísticas e Jornalísticas, recebeu da Libra Terminal naquele ano.

Claudia Cruz é acusada pela Procuradoria Geral da República (PGR) de ser beneficiada do recebimento de propina, parte do esquema de corrupção liderado por Eduardo Cunha. Ela e uma das filhas do casal, Danielle Dytz, não são rés na Operação Lava Jato, mas já prestaram depoimentos para esclarecer a abertura de contas e gastos milionários no exterior. Claudia gastou por exemplo, no começo de 2014, 7.700 dólares na loja de Chanel em Paris e outros 2.646 dólares na Christian Dior e quase 3.000 dólares na loja de Balenciaga. De acordo com a PGR, o dinheiro gasto pela família é ilícito.

O Grupo Libra, de onde os mais de 500.000 vieram, é um conglomerado portuário e de logística. Segundo publicou O Estado de São Paulo em janeiro deste ano, o grupo, que tem uma dívida bilionária com o Governo Federal, foi o único beneficiado de uma emenda parlamentar incluída por Eduardo Cunha na nova Lei de Portos, em 2013. Com a brecha, empresas em dívida com a União podem renovar os contratos de concessão de terminais portuários. Ainda segundo O Estado, o presidente em exercício Michel Temer recebeu 1 milhão de reais de dois dos sócios do Grupo Libra em 2014, por meio de uma conta que criou para receber doações e repassar para as campanhas de seu partido, o PMDB.

Além da razão do pagamento, os investigadores perguntaram a Claudia Cruz sobre alguns acionistas da empresa. A jornalista afirmou que conhecia "socialmente" Gonçalo Torrealba, um dos acionistas. Já a filha Danielle disse que ele é "amigo" de seu pai.

A reportagem procurou a assessoria de imprensa do Grupo Libra que informou que, até a noite desta quinta-feira, ainda não havia conseguido obter as informações sobre o pagamento à C3.

Segundo a Folha de S. Paulo, Claudia Cruz utiliza sua empresa, a C3, para exercer atividades remuneradas, como a de mestres de cerimônia, e que a remuneração que recebe “varia muito”.

Investigação de gastos

Claudia Cruz é uma mulher que está acostumada a lidar com grandes valores. Algumas cifras gastas por ela se tornaram públicas após a denúncia da PGR, no ano passado. Em uma viagem a Paris, em 2014 por exemplo, a jornalista chegou a gastar 17.000 dólares em apenas três dias. Os gastos foram em lojas de marcas de luxo como Dior e Balenciaga. No ano passado, também não economizou, gastando 14.700 dólares em outras lojas de grifes famosas, como Chanel.

Apesar do apagão na memória, ela não desperdiça dinheiro. Segundo extratos do seu cartão de crédito obtidos pela PGR, Cruz pediu a autoridades estrangeiras a restituição de impostos de compras que fez no exterior. O recurso, chamado tax free, é um direito que turistas têm em pedir o estorno de parte do valor de algumas compras, a título de restituição de imposto, nos países da Europa.

Segundo a Folha de S. Paulo, há vários pedidos da restituição, com referência de que teriam sido gastos na Suécia, nos valores de 59, 35 e 71 euros, por exemplo. Não há referência sobre quais produtos foram comprados e o jornal não divulgou em qual ano exatamente essas compras foram feitas.

Entre agosto de 2014 e fevereiro de 2015, as despesas de cartão de crédito de Cunha, a mulher e a filha Danielle somaram 156.000 dólares (cerca de 626.000 reais). A denúncia afirma que Cláudia e Danielle foram favorecidas pelas propinas de mais de 5 milhões de dólares que Cunha teria recebido por "viabilizar a aquisição de um campo de petróleo em Benin, na África, pela Petrobras".

Em depoimento, Danielle, que é publicitária e declarou receber entre 5.000 e 10.000 reais por mês, afirmou que as compras que fazia eram autorizadas pelo pai e que não sabia se ele havia seguido com suas atividades empresariais paralelamente às de deputado. Admitiu que tem um cartão de crédito estrangeiro e que não questionava a origem do dinheiro. Disse também desconhecer quanto ganha um deputado e reconheceu os gastos milionários no exterior.

O depoimento de Claudia Cruz e Danielle está sob segredo de justiça. Em março, uma semana antes de prestarem depoimento à força-tarefa da Lava Jato, elas entregaram seus passaportes à polícia.

Nesta quarta-feira, o deputado Marcos Rogério (DEM), relator do processo contra Cunha, pediu ao Conselho de Ética a cassação do deputado afastado. Para Rogério, houve quebra de decoro por parte de Cunha, quando ele mentiu, afirmando na CPI da Petrobras que não tinha uma conta do exterior. Agora, o Conselho de Ética voltará a se reunir na próxima terça-feira para discutir o parecer de Rogério e iniciar a votação.

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