Presidente do conselho da Telefónica anuncia sua renúncia
César Alierta nomeia como sucessor seu braço direito, Álvarez-Pallete
César Alierta, presidente do conselho da Telefónica, deixará o cargo depois de quase 16 anos no comando da maior multinacional espanhola. O executivo, que completa 71 anos em maio, coordenou a substituição na cúpula da operadora de telefonia. José María Álvarez-Pallete, atual diretor-presidente e seu braço direito até agora, ocupará o posto a partir de 8 de abril.
O anúncio da saída de Alierta nesta terça-feira causou surpresa no mundo dos negócios, mas a substituição estava sendo preparada desde o ano passado, pilotada pelo próprio presidente, que considerou que este era o momento certo para seu homem de confiança tomar as rédeas da empresa, que enfrenta o desafio da transformação de uma operadora de redes em uma companhia digital e de exploração de conteúdos, de acordo com fontes familiarizadas com a decisão.
O sucessor de Alierta herda uma companhia totalmente internacionalizada — 74% das receitas são originadas fora da Espanha, e o Brasil é o mercado número um —, administrada profissionalmente, apesar de estar condicionada em várias frentes ao poder político, por ser uma atividade parcialmente regulamentada, e que tem sido capaz de dar o passo do mundo analógico da velha Telefónica para o ecossistema digital.
Alierta deixa preparada, pelo menos para os próximos dois anos, a política de remuneração aos acionistas, baseada em altos dividendos mesmo durante períodos de crise, quando outras operadoras internacionais optaram por reduzi-los ou mesmo eliminá-los. Desde que assumiu o conselho de administração até o último pagamento em 2014, a saída de caixa da Telefónica em dividendos supera 40 bilhões de euros (cerca de 165 bilhões de reais, excluindo a remuneração baseada em ações). De fato, os mercados receberam a notícia da renúncia de Alierta com ganhos de cerca de 1%.
Alierta chegou à Telefónica em 2000, quando a empresa ainda era administrada como uma estatal (tinha acabado de ser completamente privatizada pelo Governo de José María Aznar). Juntamente com o presidente do BBVA, Francisco González, Alierta era o único alto executivo ainda à frente de uma empresa antes controlada pelo Governo. Antes da Telefónica, estava no comando da empresa de tabaco Tabacalera, também privatizada. E, sob os auspícios do ex-ministro da Economia Rodrigo Rato, que, indignado com o curso da gestão singular de Juan Villalonga, o antecessor de Alierta no cargo, o escolheu para arrumar a empresa.
Habilidade com os políticos
Outra característica do comando de Alierta tem sido sua capacidade de combinar o profissionalismo na gestão com boas relações com o poder político. Durante seus mais de 15 anos como presidente do conselho, Alierta conviveu com três primeiros-ministros (Aznar, José Luis Rodríguez Zapatero e Mariano Rajoy) e, apesar das constantes pressões vindas do mundo político, nunca foi questionado em seu posto.
Essa capacidade de lidar bem com o poder lhe rendeu algumas críticas, devido às muitas contratações de executivos que vieram do mundo da política (as chamadas portas giratórias), como Eduardo Zaplana, Rodrigo Rato, Narcís Serra, Trinidad Jiménez, entre outros.
Alierta endireitou o leme da operadora e logo iniciou a expansão do grupo, não só em seu mercado natural (Espanha e América Latina), mas em países maduros como Alemanha, Reino Unido, República Checa e Irlanda. Para isso, comandou as maiores operações da história do grupo, como a aquisição das licenças UMTS, a compra das filiais latino-americanas da BellSouth e da O2, e a criação da Vivo, maior operadora de telefonia do Brasil. Durante sua gestão, a empresa investiu 100 bilhões de euros (cerca de 400 bilhões de reais), o equivalente a 10% do PIB espanhol.
A gestão de Alierta, que sempre se gabou de sua teimosia como nativo de Aragão (Espanha), tem sido personalista, e não hesitou em mudar a gestão organizacional várias vezes quando não estava satisfeito com a trajetória do grupo. Em várias dessas revoluções despontava um sucessor, como o português Antonio Viana-Baptista ou, mais recentemente, Fernando Abril-Martorell.
Mas, finalmente, o escolhido foi Álvarez-Pallete, um executivo da casa — trabalha há 17 anos no grupo e, desde 2012, ocupa o posto de diretor-presidente —, a quem Alierta considera "como o executivo mais preparado para enfrentar com sucesso os desafios impostos pela revolução digital", segundo o comunicado oficial da Telefónica.
Alierta permanecerá no conselho de administração da Telefónica, assento que ocupava há quatro anos antes de se tornar presidente, e também concentrará suas contribuições em questões sociais e de progresso, como a educação digital e a presidência executiva da Fundação Telefónica.
O presidente do conselho da Telefónica tem direito a receber 35,5 milhões de euros (145 milhões de reais) por seu plano de pensão, já que, no ano passado, substituiu a blindagem que constava em seu contrato por uma contribuição extraordinária e única a um plano de previdência social.
O desafio para o sucessor
Álvarez-Pallete recebe uma empresa com gestão profissionalizada, focada no mundo digital, e fortemente diversificada, com 322 milhões de clientes em 20 países. Além disso, e após o último programa de demissão voluntária, reina a paz nas relações trabalhistas. Mas o sucessor de Alierta também deverá enfrentar vários desafios transcendentais para o futuro da operadora.
O mais urgente é reduzir seu elevado nível de endividamento, de cerca de 50 bilhões de euros (200 bilhões de reais), e superior à capitalização da empresa. Nesse desafio, será fundamental a postura assumida pela Comissão Europeia sobre a venda da O2, subsidiária britânica da multinacional espanhola, ao grupo Hutchinson, de Hong Kong, por 14 bilhões de euros, por receio de que a operação possa prejudicar a concorrência no mercado britânico. A aprovação da operação forneceria um colchão financeiro suficiente para garantir a política de dividendos generosa e financiar as últimas aquisições da empresa (GVT no Brasil, E-Plus na Alemanha, e Digital + na Espanha).
O outro desafio, e causa oficial da substituição, é comandar o grupo como uma empresa digital, capaz de competir com gigantes da Internet como o Google, Facebook ou Amazon. Esta sempre foi uma das grandes obsessões de Alierta, que tem criticado essas empresas que, em sua opinião, se aproveitam de sua situação de desregulamentação para ganhar mercados sem investir. Rentabilizar esse mundo digital com ferramentas que garantam a privacidade dos assinantes contra a atual lei da selva digital é o teste que Alierta deixou para seu sucessor.
Outro desafio igualmente importante do atual diretor-presidente e o verdadeiro espinho cravado que parte com Alierta é convencer os mercados de que a Telefónica vale muito mais, ou seja, que as ações se valorizem. Nos 16 anos de Alierta na presidência do conselho, a crise, tanto no setor quanto na economia, tem impedido os papéis da Telefónica de levantar voo. Hoje a ação vale cerca de 10 euros (40 reais), quando chegou a ultrapassar 20 euros há mais de 15 anos.
A seu favor joga a recuperação do setor, especialmente na Espanha, onde a explosão da Internet móvel e as novas redes de fibra óptica garantem o crescimento da receita nos próximos anos. O novo presidente do conselho irá consolidar essa base sólida e rentabilizar os pesados investimentos feitos pelo grupo no mundo audiovisual, com a compra de direitos jogos esportivos e filmes. Não em vão, Alierta prometeu que a Telefónica estará entre os três maiores grupos audiovisuais do mundo e o primeiro em língua espanhola.
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