Grammy elege a voz latina do ano, a mexicana Natalia Lafourcade

O disco de desamor da cantora mexicana e Leonel García domina uma cerimônia em que os artistas colombianos também brilharam

Natalia Lafourcade e Leonel Garcia com o prêmio a Canção do Ano.Chris Pizzello/Invision/AP

A história de desamor que Natalia Lafourcade conta para si mesma em Hasta la raíz é o disco do ano da música latina. À frente de Ricky Martin, Alejandro Sanz, Julieta Venegas, Miguel Bosé e Jorge Drexler, a delicada mexicana de 31 anos viu seu sucesso coroado na noite de quinta-feira (18 de novembro) com o máximo reconhecimento das premiações do Grammy Latino, concedidas as músicas de tudo o que se considere latino, incluindo – claro – o Brasil.

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Numa estranha decisão, o espetáculo televisado da Academia Latina começou diretamente com o prêmio mais importante: melhor gravação do ano, que destaca o produto musical completo. Os mexicanos Natalia Lafourcade e Leonel García eram competidores em duas categorias e concorriam juntos a outras três. No final, Hasta la raíz foi um reconhecimento a ambos. É a canção do ano e o trabalho do ano. “Estou em choque”, disse Lafourcade quando já tinha subido ao palco quatro vezes para agradecer. “Dedico isso ao México, aos latino-americanos. Cuidemos de nossas raízes. Cuidemos de nossa origem: é muito importante levá-la conosco”.

Natalia Lafourcade, com seus prêmios em Las Vegas.Powers Imagery/Invision/AP

Yo te llevo dentro/hasta la raíz/y por más que crezca/vas a estar aquí” [Te levo comigo/até a raiz/e por mais que cresça/estarás aqui”], que já se tornou o refrão do ano por decisão da indústria, fala de algo mais do que o vazio deixado por uma ruptura. Leonel García foi o companheiro que Lafourcade procurou para ampliar a mensagem. “Somos amigos há muitos anos”, explicou García à imprensa. “Como amigo, você sabe o que a pessoa está sentindo. Ela queria falar da despedida e da separação, mas também do orgulho de ser latino. Esse foi o grande desafio que me propôs. E a partir disso tentamos falar de amor, de um amor latino, passageiro, que se liberta para ir a um futuro melhor.”

Natalia Lafourcade já havia subido ao palco duas horas e meia antes do início do espetáculo, durante a entrega prévia de prêmios não televisionados, para acompanhar sua equipe técnica no Grammy de melhor engenharia de gravação. Foi quando explicou um dos pontos fundamentais do disco: a “calma no estúdio”. Os artistas podiam dispor de todo o tempo que fosse necessário. Uma apresentação adequada para a atmosfera transmitida por Hasta la raíz. “É o disco que mais curti fazer”, disse.

Maná e Tigres del Norte exibem cartaz em sua atuação.REUTERS

Em seguida, chegaram os prêmios de melhor álbum de música alternativa e melhor canção alternativa – também para Hasta la Raíz. “O momento em que fizemos essa música foi um dos mais mágicos que vivi”, afirmou a cantora. Compor a quatro mãos “exige uma energia que nem sempre acontece. Foi mágico.” Na sala de imprensa, o produtor argentino Cachorro López recordou quando Lafourcade lhe enviou a canção. “Eu lhe disse: ‘Se você deixar, faço o que você quiser com essa música. Mas se masterizar essa demo assim como está, certamente vai ser sucesso’.”

Outro ganhador da noite foi Juan Luis Guerra, o homem que nos anos 90 levou a bachata, ritmo tradicionalmente dominicano, a todo o mundo latino com o grupo 4.40 e que agora vive um grande momento de maturidade. Guerra e o 4.40 arrebataram de Lafourcade o prêmio de melhor álbum do ano com Todo Tiene Su Hora. “Este me pegou de surpresa”, reconheceu, com o troféu na mão, antes de agradecer. Ao todo, Juan Luis Guerra levou três prêmios.

Os Grammy reconheceram também uma potente geração de músicos que desponta na Colômbia. O grupo Diamante Eléctrico, de Bogotá, ganhou o prêmio de melhor álbum de rock com disco B. “Queremos agradecer nosso país, que está exportando uma música incrível”, disseram os integrantes. A energia contagiosa de Chocquibtown subiu ao palco para receber a distinção de melhor álbum de fusão tropical. O reaggeton do cantor J Balvin foi reconhecido com o prêmio de melhor canção urbana com Ay Vamos. Na Colômbia, “há uma nova camada artística e uma energia para o mundo que estamos projetando através da música”, disse J Balvin. A banda Bomba Estéreo tinha duas indicações, uma delas para gravação do ano, e a atuação da noite: o hit Fiesta (Festa) cantado com Will Smith. A máquina eletrônica colombiana e o rapper gritando “parriba/pabajo” (para cima/para baixo) garantiram um dos momentos altos da noite.

Foi a atuação estelar de um show que é tanto um concerto como uma entrega de prêmios. Os chamados “momentos Grammy” deste ano incluíram Alejandro Sanz com Paula Fernandez e Mariachi Sol, do México. O espetáculo foi um banho de cultura mexicana com Maná e os Tigres del Norte cantando juntos Somos Más Americanos. Eles exibiram um cartaz com um apelo aos latinos dos Estados Unidos: “Não votem nos racistas”. Foram muitas as referências diretas a qualquer hipotético candidato atual. Os dois grupos tocaram juntos na sala de imprensa com a mesma mensagem: “São 50 milhões nos EUA. Têm o poder de votar num candidato que faça uma reforma migratória” para os trabalhadores “que põem a comida na mesa dos americanos”, disse Fher Olvera, vocalista do Maná.

Nas categorias exclusivamente dedicadas ao Brasil, além da homenagem de Personalidade do Ano a Roberto Carlos, o prêmio de maior destaque – o de Melhor Álbum de Pop Contemporâneo Brasileiro – foi para Tulipa Ruiz, por Dancê. Diogo Nogueira levou o troféu de melhor canção por Bossa Negra e o grupo Fundo de Quintal foi premiado com o Melhor Álbum de Samba/Pagode por Só Felicidade. Na categoria de Melhor Álbum de Música Cristã em língua portuguesa, brilhou a cantora carioca Fernanda Brum, com Da Eternidade.

Entre os demais prêmios importantes, o espanhol Alejandro Sanz obteve o de melhor álbum vocal pop com Sirope. O grupo Monsieur Periné juntou-se à lista de jovens triunfadores colombianos da noite com o prêmio de melhor novo artista. Trata-se de uma das categorias mais difíceis e desejadas, já que significa a entrada pela porta da frente à indústria da música latina. O Maná, com o disco Cama Incendiada, ganhou o prêmio o prêmio de melhor álbum pop/rock. El Perdón, de Nicky Jam e Enrique Iglesias, levou o troféu de melhor interpretação urbana.

Juan Luis Guerra, com seus prêmios em Las Vegas.REUTERS

Realizada no hotel MGM Grand de Las Vegas, EUA, a entrega do Grammy Latino é um evento onde se fala e se canta indistintamente em espanhol, português e inglês, os idiomas em que se expressa uma comunidade de difícil definição. A versão Grammy do mundo latino é a única que une a América ibérica com as 50 milhões de pessoas que se autodenominam hispanas nos EUA. Também é, como demonstrou o ganhador do prêmio de música urbana, Tego Calderón, a única cerimônia de prêmios nos EUA em que se pode dizer: “Viva Porto Rico, porra!”

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