No espaço, ninguém pode ouvir seus gemidos
Pornhub quer fazer um filme pornô no espaço e você não quer dar um centavo para eles

Como diz Miguel Noguera no filme Taller Capuchoc, a Internet mandou tudo ao inferno em dez anos: indústrias como a cinematográfica e a musical, apesar de agora desfrutarem de uma difusão e variedade sem precedentes, tiveram que aumentar a engenhosidade para competir com a cultura do tudo de graça, seja unindo-se ao inimigo invencível com plataformas como Netflix ou Spotify, ou transformando o consumo de seus produtos em eventos atraentes para o público (aqui cabem desde os shows de sempre até propostas do tipo Phenomena Experience).
Em qualquer caso, o resultado é o mesmo: o formato físico já era – talvez os amantes dos vinis sejam os únicos ainda em pé, gastando salários para aumentar suas bibliotecas – em prol da experiência que, no caso áudio(e)visual pode ser até compartilhada; dá também para dançar com seus amigos no Festival SOS ou ir à filmoteca com seu namorado(a).
E a masturbação? Isso você faz sozinh@ e em casa.
Juntando a cultura do tudo grátis com a solidão intrínseca do onanismo, o consumidor de pornografia talvez seja o único que ninguém pediu explicações por suas mudanças de hábito: o repetido aluguel ad nauseam do mesmo filme vintage em sua locadora local, conhecendo-o tão bem como a palma da sua mão calejada, cedeu lugar à possibilidade de se masturbar todos os dias com um vídeo diferente – terça-feira com glory hole, quarta-feira com fisting – sem ter que colocar dinheiro em cima do balcão; e o mais importante: sem ser bode expiatório em discussões sobre a crise da indústria na imprensa mainstream. Evidentemente, a pornografia, como qualquer outro nicho, conta com seguidores dispostos a pagar para assistir festivais eróticos ou ter uma cópia de Garganta Profunda III, mas seu número é ridículo em comparação com o tráfego de páginas como YouJizz ou Pornhub.
No mês passado, a própria Pornhub tinha divulgado sua intenção de realizar no ano que vem uma produção própria, nada mais e nada menos que no espaço exterior. Com o nome de Sexploration, o projeto levaria as estrelas do cinema para adultos Eva Lovia e Johnny Sins, assim como o resto da equipe, em uma nave espacial, afastando-se da atmosfera da Terra para fazer o que melhor sabem: uns com o foco na câmera e outros transando como cobaias drogadas.
Para poder bancar essa aventura ambiciosa, Pornhub lançou uma campanha de crowdfunding na qual pedia três milhões e meio de dólares. Um fracasso? Com grande dificuldade, e a poucos dias (no momento em que escrevo estas linhas) do final do prazo para que os usuários possam contribuir, a cifra supera os 235.000 dólares. Nem as recompensas oferecidas em troca do financiamento, como os trajes espaciais e a roupa interior que usariam Lovia e Sins, conseguiram seduzir os usuários.
Mencionamos no começo os ouvidos surdos da imprensa a qualquer possível crise que uma indústria como a do cinema pornográfico pode ou não estar sofrendo. A marginalização jornalística, relacionado com a solidão do consumo de um produto como este, se estende a qualquer outra notícia relacionada com o pornô: se Sexploration abriu um espaço entre os posts de alguns meios de comunicação digitais foi entre um gif e outro de um gatinho; Sexploration foi tratado, definitivamente, como ruído genérico de Internet, quando, obviamente, tem vocação de pioneirismo.
Não podemos pedir a Sexploration, se algum dia chegarmos a vê-lo, que seu roteiro tenha a solidez de Morangos Silvestres, mas pelo menos estaremos vendo a primeira obra de ficção filmada inteiramente fora do nosso planeta, o que não é pouco e agora depende de duas modalidades de pedido: a que pede que algum milionário filantropo salve o IndieGoGo de Sexploration, ou que Pornhub – com seu próprio dinheiro – continue com a sua produção sem depender do sucesso ou do fracasso de seu crowdfunding; que entende, no final, o que nós que temos, como Houston, um problema, que ainda não captamos: Sexploration talvez seja um pequeno amasso para Sins e Lovia, mas é um grande handjob para a humanidade.