Expectativa alta para cumprir a ingrata missão do ajuste fiscal
O novo ministro da Fazenda foi talhado para o cargo, dizem seus pares. Mas, fará as vezes de mensageiro das más notícias em 2015
Irônico, bem-humorado, dono de um raciocínio muito rápido, QI muito acima da média, workaholic de carteirinha. As pessoas que já conviveram com Joaquim Levy, o novo ministro da Fazenda, têm elogios fáceis quando questionados sobre o estilo do homem que assume no dia primeiro de janeiro a árdua missão de colocar a economia brasileira nos trilhos. Para Fabio Pina, economista da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, o novo ministro da Fazenda é uma figura que facilita a própria tarefa de aliar ajuste e crescimento. “Ele conhece o setor público e privado e tem uma formação acadêmica sólida. É muito difícil ter uma pessoa assim, pois às vezes é somente um bom acadêmico, ou somente um bom funcionário público. Levy é uma figura rara da economia”, afima Pina.
A escolha do seu nome foi ‘premiada’ pelo mercado financeiro no mesmo dia da sua confirmação, no dia 27 de novembro, com uma alta generosa da Bolsa de Valores de São Paulo. Desde então, Levy tem se mostrado discreto, com poucas aparições públicas, apenas para reiterar o que já era esperado dele: foco em austeridade das contas públicas, transparência, e alguns sacrifícios em nome da credibilidade, como o corte de subsídios a empresas. Esses conceitos, no entanto, provocaram urticária em parte do eleitorado da presidenta, que se sentiu traído com a escolha de um nome mais alinhado com a cantilena do principal rival de Dilma nas eleições deste ano, Aécio Neves.
Torcedor do Botafogo, Levy é engenheiro naval, com doutorado em Economia na Universidade de Chicago, meca ultraliberal que prega liberdade para que os mercados ajustem por si só os desequilíbrio da economia, o oposto do modelo de um Estado centralizador que caracterizou os Governos do PT. Levy no governo Dilma seria então uma mistura de água e óleo aos olhos dos mais ortodoxos. Mas, esse é um movimento que se repete em outros países, observa Manuel Henriquez Garcia, presidente da Ordem dos Economistas do Brasil. “Na França também se viu esse casamento [o socialista Françoise Hollande e seu ministro liberal, Emmanuel Macron, nomeado recentemente]”, compara. Garcia lembra que o desafio mundial é ajustar as contas públicas ao mesmo tempo em que se trabalha para tornar o PIB mais robusto.
Tendência ou não, o fato é que alguns setores já marcaram protestos contra o ajuste fiscal que está em curso para o mesmo dia da posse de Dilma. Alheio ao barulho em torno do seu nome, Levy dedicou as últimas semanas a conhecer no detalhe o ‘inventário’ das contas do ministro demissionário Guido Mantega. A dupla, que se deixou fotografar uma vez para mostrar sintonia neste período de transição, trabalhou para definir as tarefas que o novo czar da economia tem pela frente, bem como o tamanho dos ‘esqueletos’ que precisam ser contabilizados para definir o tamanho do aperto dos gastos públicos neste segundo mandato da presidenta Dilma.
O novo ministro já assumiu algumas metas, como uma economia de gastos modesto para 2015 (superávit primário de 1,2%), e assegurou que manteria a transparência em primeiro lugar na divulgação das contas do Governo, numa tentativa de quebrar a desconfiança que se instalou em relação à política econômica do seu antecessor. “O discurso dele está na linha correta, e estamos esperançosos que ele traga os resultados esperados”, diz Flavio Serrano, economista do Banco Espírito Santo. Serrano, no entanto, lembra que fazer bem feito no cargo que Levy passa a ocupar significa “trazer dor”, uma vez que a necessidade de ajuste implica em sacrifícios, assim como cortar os doces quando se está em dieta. Assim, 2015 será o ano da desintoxicação, para debelar a inflação com juros mais altos, aumentar os impostos para garantir arrecadação e dizer 'não' para quem pleitear verbas extras.
Caberá a Levy, assim, assumir o papel de mensageiro de diversas más notícias para o cidadão comum em 2015, como o aumento de impostos, o estreitamento do crédito, e o fim de subsídios a empresas, muitos deles que sustentaram empregos, o grande patrimônio das gestões petistas. Não por acaso as consultorias já projetam aumento na taxa de desemprego. “Mas quanto mais demorar, maior será o custo. E não há uma segunda alterantiva”, diz Silvio Campos Neto, economista da Tendências Consultoria, que prevê um aumento de desemprego dos atuais 4,9% para 5,4% até o final de 2015.
A economia, no entanto, se move de expectativas, e depois que o mercado financeiro e o setor privado travaram uma verdadeira guerra com a presidenta ao longo de todo o primeiro mandato, é preciso falar o idioma dos donos do dinheiro para restaurar o otimismo, ainda que seja a partir de 2016. Na entrevista ao jornal Valor, Joaquim Levy disse que a transparência e a eficiência são “dois valores indispensáveis para garantir o investimento e a produtividade, e portanto, do emprego nos anos a frente. Só assim a gente vai poder fazer uma limonada dos atuais desafios”. Desta forma, Levy praticamente não doura a pílula ao deixar claro que vem aí um ano de limão amargo, mas necessário, para colher os frutos depois.
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