De ‘playboy’ a alternativa ao PT
Para Aécio, o caminho da corrida eleitoral começou com uma transformação de imagem
Até pouco tempo atrás, Aécio Neves da Cunha, de 54 anos, transmitia a imagem de um autêntico playboy. Mineiro que mora no Rio de Janeiro há mais de 15 anos, sempre foi um habituè de eventos sociais badalados, onde se posicionava como uma das celebridades presentes. O candidato do PSDB, ex-governador de Minas Gerais, oriundo de uma família de forte tradição política, começou na vida pública aos 21 anos, como secretário pessoal de seu avô Tancredo Neves enquanto governador (1981-1984). Mas o caminho até chegar a ser considerado pelos membros de seu partido – que tem uma forte ala pró-José Serra – como a principal opção, e finalmente alcançar o segundo turno contra a candidata do Governo, não foi fácil. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que hoje lhe apoia, foi um dos que sugeriu que enquanto ele não mudasse sua postura em sua vida privada, dificilmente conseguiria o apoio necessário para sua candidatura.
De fato, o senador se casou recentemente com uma modelo, Letícia Weber, com quem teve um casal de gêmeos este ano. Para reforçar sua nova imagem de homem tradicional e de família, batizou os recém-nascidos no começo de outubro na catedral de São João del Rei, construída em 1721 na cidade do avô Tancredo, no interior de Minas. Outra prova de seu esforço de mudança de imagem são os vídeos publicados em sua página no YouTube, que além das gravações de campanha apresentam momentos vividos com a família na cidade interiorana mineira de Cláudio, seu refúgio, que chegou a chamar de "meu Palácio de Versalhes", segundo uma reportagem da revista Piauí publicada em junho.
Não foram apenas essas estratégias de marketing que o fizeram chegar ao segundo turno com Dilma Rousseff, em uma disputa acirrada como não se via desde 1989. Sua eloquência, facilidade de discursar e capacidade para se converter em uma alternativa real ao PT o favoreceram nos debates televisionados. A agressividade foi crescendo conforme o caminho foi se mostrando mais difícil e cada vez mais repleto de golpes baixos: sofreu acusações sobre uso de cocaína – algo que não se confirmou – e sobreviveu com firmeza a escândalos políticos como o do mensalão mineiro (lavagem de dinheiro durante campanha de um governador do PSDB em 1998) e do aeroporto que construiu em Cláudio com recursos públicos em um terreno de propriedade de seu tio. Também foi acusado de nepotismo por empregar sua irmã, Andrea Neves, quando era governador – cujo cargo era voluntário – e de bater em mulher, por um episódio público supostamente vivido com sua esposa. Além de tudo, antes de chegar ao segundo turno, havia uma pedra em seu caminho chamada Marina Silva. Ninguém esperava a reviravolta passional que a morte do candidato do PSB, Eduardo Campos, provocou. Como ele mesmo previu, a onda Marina era uma fase e, no final, passaria a emoção e viria "a onda da razão". Contou com o respaldo de boa parte dos eleitores fieis à legenda do partido e foi impulsionado pela aprovação de 92% de seus oito anos como governador de Minas – apesar de muitas vezes derrubado por sua rival petista em debates sobre seu questionável legado da educação no Estado.
Natural de Belo Horizonte e formado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas, Aécio vende a tradição política como parte de seu DNA. Antes do dia da decisão final, a reforçou simbolicamente com uma visita ao túmulo do avô Tancredo. Sua maior dificuldade, entretanto, foi usar as palavras certas para se dirigir às classes mais baixas. "Choque de gestão" e "eficiência" é a linguagem do mercado – que o adora –, mas não dos que poderiam levá-lo ao posto que tanto almeja. Mesmo tendo dito que manteria os programas sociais, como o Bolsa Família, talvez não tenha sabido explicar bem como isso é compatível com sua intenção de enxugar o Estado, resgatar a credibilidade do país no mercado ou de afastar o fantasma da inflação. Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, um dos nomes já confirmados de sua equipe para a pasta da Fazenda, tentou desfazer esse mal entendido ao lançar o programa para a área econômica esta semana, dizendo que as políticas sociais estavam “ameaçadas pelo fraco crescimento da economia brasileira”.
Aécio soube seduzir alguns sindicatos e aposentados com sua proposta de rever o fator previdenciário (que reduz o valor do benefício para quem se aposentou mais recentemente), sem entrar em detalhes de como seria feito. E também não mencionou que o cálculo foi instituído pelo seu mentor político, o próprio Cardoso, algo que Dilma explorou em um dos debates promovidos pela Globo. Ganhou o apoio do setor do etanol e tem tradicionalmente o voto de eleitores mais abastados e de grandes proprietários de terras. Até mesmo acampamentos dos Trabalhadores Sem Terra, Movimento tradicionalmente de esquerda, foram vistos com bandeiras com as cores de seu partido, amarelo e azul. Tem o suporte necessário no Congresso e no Senado, por sua capacidade de articulação e de afinidades com o PMDB, e conquistou até mesmo aliados no interior paulista, colégio eleitoral que tradicionalmente se divide entre o governador do estado Geraldo Alckmin e Serra. Soube aproveitar seu papel de presidente do partido – função que assumiu em 2013 com o apoio de aliados de Serra, anteriormente suas maiores resistências dentro da sigla. Apesar do desgastante embate (nunca assumido) nos bastidores em 2009, quando houve uma racha no partido entre os candidatos presidenciais Serra e Aécio para as eleições de 2010, tudo terminou como o mineiro queria, ainda que quatro anos depois do previsto.
Aécio abriu 13 processos no Tribunal Superior Eleitoral nessas eleições, entre eles uma ação contra a campanha de Dilma Rousseff, que teria usado os Correios para favorecer a distribuição de material da campanha petista, algo que o presidente da entidade negou. Após acordo inédito, ambos os candidatos zeraram os processos relacionados a ofensas pessoais em propaganda eleitoral perante o Tribunal Superior Eleitoral, em 22 de outubro. Mas apesar do mau humor no campo jurídico, o boa praça e simpático Aécio é um conhecido torcedor fervoroso do time mineiro Cruzeiro, dizem que gosta de cavalgar, que nunca despreza uma pelada e ainda que, sempre que tinha uma oportunidade, surfava. Durante a campanha protagonizou algumas cenas cômicas, como o constante assédio de mulheres que o agarravam para selfies, com a maior naturalidade. Sem nunca abandonar o sorriso e as covinhas subsequentes, transmite uma típica simpatia mineira e, contra o jeito de ser de seus conterrâneos, pouco desconfiada.
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