E a farsa acabou
Faltam ao Barça os valores alvirrubros: humildade, pressão e senso de equipe
Há partidas desenhadas para uma explosão de alegria, mas poucas como a do Stamford Bridge, quando um gol de Iniesta levou o Barcelona à final de Roma. No último minuto, os milhares de torcedores blaugranas chutaram junto com o manchego na direção ao gol de Cech. Não havia dúvidas sobre a equipe, os jogadores ou o treinador, porque o barcelonismo soprava então na mesma direção, e a bola não saía do campo do Chelsea.
E há também confrontos em que o fracasso se adivinha, dias nos quais se manifestam de uma vez e sem ressalvas, de forma cruel e em um contexto solene, os males incubados nos dias úteis, os erros dissimulados contra rivais e em torneios menores. Os azuis-grenás foram perdendo detalhes pouco a pouco, sem que os jogadores e a comissão técnica quisessem perceber, até ficarem nus ontem na vitrine da Champions. Nunca ninguém deu um centavo pelo Barça com 1 x 0 no marcador do Vicente Calderón, ao contrário daquela noite em Londres. A partida acabou sem Iniesta em campo, com Messi abatido e Neymar penteando de novo a bola com o topete, sintoma de derrota, sinal de desânimo, prova inequívoca de decadência depois da goleada sofrida já no ano passado frente ao Bayern. Os blaugranas não aprendem a lição, nem dentro do campo nem no banco de reservas, por mais que o elenco se reveze. O famoso traje dos quatro meias se revelou afinal tão inócuo quanto a aposta nos dois centroavantes, frágeis como os zagueiros, mostra de como a equipe de Martino está desgastada e pouco trabalhada.
O ridículo do Barça foi maiúsculo, vítima do seu próprio desafio, escravo de uma bravata ridícula caso se preste atenção ao futebol apresentado ontem em Manzanares. Antes do jogo, os azuis-grenás falavam em valentia, em dominar o marcador mais do que em controlar o jogo, em chegar à meta contrária com o arremate e não com o passe, em marcar 1 x 0 para mudar o roteiro do Atlético. O plano próprio de uma equipe pequena que ainda se acredita grande, compatível com sua condição de semifinalista da Copa da Europa em seis temporadas consecutivas, do time que conta com a figura de Messi, e não com o ausente Messi.
O famoso traje dos quatro meias se revelou afinal tão inócuo quanto a aposta nos dois centroavantes, frágeis como os zagueiros, mostra de como a equipe de Martino está desgastada e pouco trabalhada
A afronta afinal era pura comédia, uma farsa, dominados que ficaram os barcelonistas assim que o Atlético pegou na bola. Só dava o time vermelho e branco, excelente na pressão, intenso na mobilização, sempre focado para o gol do Barça, mais reconhecível do que nunca, inclusive sem Diego Costa nem Arda Turan. Alguns azuis-grenás viram no Atlético a reencarnação do Bayern. Os atacantes de Simeone não paravam de chutar ao gol e às traves de Pinto, que deu meia-volta com a bola vindo na direção do seu gol, como se estivesse espantando, já vencido por Koke. Inalcançável para Alba, Raúl García ganhava a bola, Villa quebrava o espinha dos beques e não havia zagueiro que detectasse Adrián.
Não havia quem agarrasse a bola no Barcelona, nem sequer Busquets, reincidente nas perdas, incapaz de conter o enxame do Atlético. As bolas divididas, as primeiras e segundas jogadas, o jogo pertencia exclusivamente ao grupo de Simeone. A retaguarda azul-grená era uma brincadeira, e de nada serviu que Alves achasse Messi uma vez. O Barça não tinha categoria nem velocidade com bola, requisitos indispensáveis para combater o Atlético, superior física e taticamente, excelente do ponto de vista ofensivo, só desafortunado no chute a gol. Ao primoroso exercício no ataque seguiu-se depois uma exibição de defesa do Atlético. As chegadas do Barça foram mínimas, reduzido como ficou por um rival que logo retomou o comando. Os azuis-grenás se repetem na vitória e na derrota, no 4-4-2 e o 4-3-3, que são fáceis de decifrar para Simeone. Martino começa por tirar Cesc e acaba por colocar Alexis e/ou Pedro. Ontem, apostou em ambos, e teve a ideia de tirar Iniesta, prova de rendição.
A partida de ontem estava pintada para a glória do Atlético e a miséria de um Barça carente de futebol, de jogadas e de figuras, necessitado precisamente dos valores alvirrubros: a humildade, a pressão e o senso de equipe, que nada têm que ver com a autogestão nem a complacência. Vestido de luto e caducado o Barça na Europa, o clube que combina com a primavera boreal agora é o Atlético. Um joga para o pé, como os veteranos, e o outro para o espaço, como os juvenis.
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.