Morre cinegrafista atingido por um rojão em manifestação no Rio
O funcionário da TV Bandeirantes, Santiago Ilídio Andrade, de 49 anos, teve morte cerebral declarada nesta segunda-feira O caso acontece num momento em que o Senado pretende votar lei do terrorismo, para enquadrar crimes de vandalismo em protestos
O cinegrafista da TV Bandeirantes, Santiago Ilídio Andrade, de 49 anos, teve a morte cerebral declarada na manhã desta segunda-feira. Ele havia sido atingido na cabeça por um rojão enquanto trabalhava na cobertura das manifestações ocorridas na última quinta-feira, dia 06, no Rio de Janeiro contra o aumento da passagem de ônibus.
O confronto entre a polícia e os manifestantes na Central do Brasil foi o estopim para que balas de borracha e explosivos começassem a ser atirados no local. Andrade teve o crânio afundado por um rojão e a cena foi registrada por outros cinegrafistas e fotógrafos. Após a divulgação das imagens, o tatuador Fábio Raposo foi identificado como a pessoa que entregou o explosivo para alguém que o disparou. O rapaz se apresentou ao 17º Distrito Policial e confirmou à polícia ter repassado o rojão ao homem que acendeu o explosivo e atingiu o cinegrafista, mas alegou não conhecer o suspeito de lançar o artefato. Raposo foi preso no domingo.
Na tarde desta segunda-feira, a presidenta Dilma Rousseff determinou que a Polícia Federal participe das investigações sobre a morte de Andrade. Em sua conta no Twitter, Rousseff declarou que “a morte do cinegrafista revolta e entristece”, e em um outro post, divulgou seu pedido à PF: “ Determinei à PF que apoie, no que for necessário, as investigações para a aplicação da punição cabível”.
Andrade é a primeira vítima fatal entre os profissionais de mídia dos protestos iniciados em junho do ano passado, que foram marcados pela violência do confronto entre policiais e manifestantes. Desde que começaram, as manifestações pelo Brasil deixaram pelo menos 91 jornalistas feridos, de acordo com levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).
Desses, 55 tiveram ferimentos promovidos por policiais, incluindo o caso da jornalista da Folha de S.Paulo, Giuliana Vallone, atingida no olho por um disparo de bala de borracha dado por um policial no dia 13 de junho do ano passado. No mesmo dia, outros seis jornalistas do veículo foram vitimados no protesto,além de um fotógrafo da Futura Press, Sérgio Andrade Silva, de 31 anos, que ficou cego de um olho depois de ser atingido por uma bala de borracha. A violência praticada pela polícia foi um turning point nas manifestações, que a partir desse dia ganhou apoio popular.
Teor político
A morte de Andrade ocorre nas vésperas da votação de um projeto de lei que define o crime de terrorismo no país, e que poderá enquadrar, inclusive, manifestações de movimentos sociais. Se aprovado, o projeto de lei 728/2011, de autoria de Romero Jucá (PMDB-RR), que é relator da Comissão Mista de Consolidação da Legislação e Regulamentação de Dispositivos da Constituição, poderá tipificar como terrorismo o ato de destruir ou explodir meios de transportes ou qualquer bem público ou privado, com a pena máxima de até 30 anos.
Polêmico, o texto está sendo debatido no Senado. Para Jucá, é importante que a lei seja aprovada antes do início da Copa do Mundo. E esse é justamente o ponto da oposição: acredita-se que o projeto de lei é de interesse da FIFA, assustada diante das manifestações constantes que vem ocorrendo no país.
A morte do cinegrafista chega também às vésperas de novas manifestações, que começam a se articular nas redes sociais. No Facebook já existe uma convocação para os próximos protestos, intitulada “Segundo grande ato em 2014 contra a Copa”, convocando para o dia 22 de fevereiro, na Praça da República, em São Paulo. Mais de 9.500 mil pessoas já confirmaram presença.
O anúncio da morte do cinegrafista também acontece em meio a uma denúncia de que o autor do disparo de rojão que acertou Santiago Andrade seria ligado ao deputado estadual Marcelo Freixo, do PSOL, partido que disputa o comando do Rio e faz oposição ao governo federal. O deputado negou as acusações.
Na tarde deste domingo, o estagiário Marcelo Mattoso, que trabalha com o advogado Jonas Tadeu, defensor de Fábio Raposo, registrou na delegacia um depoimento. Nele, ele afirma ter recebido uma ligação de uma militante identificada como Sininho, que teria oferecido apoio jurídico a Raposo. Segundo ele afirmou, a moça teria dito que o responsável pela explosão do artefato era ligado ao deputado do PSOL. Sininho foi localizada pela imprensa neste domingo na porta da delegacia onde Raposo está preso, junto a um grupo de manifestantes que pedia a liberdade do rapaz. Ela confirmou que fez a ligação, mas recusou ter feito qualquer oferta. Ao programa Fantástico, da Rede Globo, Freixo afirmou ter recebido uma ligação de Sininho pedindo ajuda ao rapaz, com medo de que ele fosse torturado na delegacia.
O fato esquenta ainda mais o cenário político ligado às manifestações. Pelas redes sociais, militantes petistas acusam os partidos de oposição, entre eles o Psol, de incitarem as manifestações contrárias à Copa em ano eleitoral. A estratégia, dizem os militantes petistas, é manchar o evento e, com isso, a imagem de Dilma Rousseff (PT), que neste ano deve disputar a reeleição à presidência. As manifestações, um rescaldo mais violento dos protestos de junho, têm como lema as críticas ao dinheiro gasto nas obras relacionadas ao Mundial, em detrimento dos investimentos em áreas sociais, como saúde e a educação.
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