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Coluna
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O quase nada que sabemos sobre Jesus

História ou mito, lenda ou realidade, o judeu Jesus conseguiu resistir ao longo de mais de 2.000 anos, não só como um fato religiosos, mas como um fenômeno que seduz milhões de pessoas

Juan Arias

Aqui, no Brasil, se pode ler o nome de Jesus até nos para-choques dos caminhões e nas escovas dos engraxates. E nas camisetas ou nas salas de espera do dentista. E nos cabeleireiros. Onde menos a gente imagina. Ontem, o vi até em uns panos de limpeza expostos numa loja.

Foram as igrejas evangélicas que colocaram Jesus na moda.

E os seguidores dessas igrejas são os mais pobres, os menos alfabetizados.

O que sabem eles da verdade histórica desse Jesus onipresente nas suas vidas? E nós? E a Igreja? Muito pouco, quase nada.

Não sabemos quem era seu pai. Não sabemos onde e quando nasceu. Ignoramos o que fez dos 12 aos 30 anos. Viajou ou permaneceu encerrado na minúscula aldeia de Nazaré tão insignificante que não aparece nos mapas da sua época?

Imaginamos que foi casado, porque era praticamente impossível um judeu solteiro. Não sabemos se teve filhos, embora fosse o mais normal, já que a descendência era tão sagrada para os judeus que na Bíblia Deus permite aos patriarcas cujas esposas sejam estéreis, dormir com a escrava para que lhe dê descendência.

Não sabemos com certeza porque o poder romano o condenou a morte jovem, embora suponhamos que fosse por não se submeter ao poder romano considerado opressor e injusto com o povo judeu.

Do Jesus da fé, do criado por Pablo de Tarso, pelos primeiros concílios da Igreja, pela teologia, sabemos tudo. Mas esse não era o Jesus real, o que caminhava pelas aldeias da Galileia rodeado por tudo aquilo que a sociedade considerava escória. Pela caravana de sofredores.

Sabemos muito pouco das suas palavras. Acreditam os especialistas que no máximo umas 12 frases dos evangelhos poderiam ser suas, precisamente aquelas mais enigmáticas, como a de que "é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha que um rico conseguir a salvação", ou aquela de "deixai que os mortos enterrem seus mortos", ou "a César o que é de César e a Deus o que é de Deus". Da maior parte delas não se tem certeza de que fossem pronunciadas por ele. Nem sequer a oração do Pai Nosso, já que aparece com variantes nos diferentes evangelistas.

É difícil até saber da sua existência histórica, se nos ativermos aos documentos da época. Temos apenas uma frase alusiva do historiador Flavio Josefo e mesmo essa há quem ponha em dúvida.

Entretanto, hoje, a maioria dos historiadores se inclinam a aceitar a existência de Jesus, por toda uma conjunção de circunstâncias que tornam quase impossível negar dita existência, embora dela saibamos tão pouco.

O que sim é verdade é que, embora seja um paradoxo, sobre nenhum outro personagem da história se escreveu e discutiu tanto como sobre Jesus de Nazaré. Só no Instituto Bíblico de Roma há uma biblioteca com um milhão de obras sobre o tema.

História ou mito: lenda o realidade, o judeu Jesus conseguiu resistir ao longo de mais de 2.000 anos, não só como um fato religiosos, mas como um fenômeno inédito, capaz de seduzir a milhões de pessoas, crentes ou não.

Sobretudo porque o Jesus histórico, esse "grande desconhecido" não era cristão, era um seguidor dos ensinamentos judaicos. Não era considerado Deus, nem pelos judeus, nem mesmo por ele mesmo, que sempre se chamou de "filho do homem", que de acordo com uma expressão aramaica significa simplesmente "homem".

De uma só coisa temos certeza: de que foi judeu de nascimento e de religião e que seus pais e sua família eram judeus. Um judeu crente, que frequentava a sinagoga e que ao mesmo tempo era um inconformista com a hipocrisia dos religiosos do seu tempo e intransigente com os sacerdotes e mercadores do Templo dos quais derrubou as mesas e aos quais advertiu para que não fizessem da "casa de meu Pai" um "covil de ladrões".

O profeta que não sofria por alguém ter fome ou estar doente. E nem mesmo porque o vinho acabasse num casamento: "curava todos", escrevem os evangelhos.

Todo o resto está coberto por um véu histórico. Talvez um dia possamos saber alguma coisa mais, se aparecem novos manuscritos daquela época, sobretudo como aqueles que a Igreja posterior queimou depois de desautorizá-los oficialmente.

Como por exemplo alguns escritos gnósticos que chegaram até nós graças a que alguns deles foram enterrados em ânforas, provavelmente por monges, para salvá-los do fogo.

É nesses manuscritos encontrados no Egito em que se constrói um Jesus bem diferente daquele que aparece nos evangelhos canônicos, com suas relações amorosas com Maria Madalena, suas ideias gnósticas e as discussões com os apóstolos que se queixavam por ele revelar a uma mulher, Madalena, "segredos que ocultava deles".

Muitos cristãos ainda hoje se escandalizam de que nesses manuscritos se conte que Jesus "beijava Maria Madalena na boca". Ignoram que na filosofia gnóstica, segundo a qual o mal do mundo não veio pelo pecado, mas pela ignorância, essa sabedoria se transmite justamente pela boca.

Os rituais do Natal têm provavelmente muito pouco a ver com o Jesus histórico, de cujo nascimento não sabemos nada. Não sabemos nem quando nasceu, nem onde. Certamente não em Belém, nem no dia 24 de dezembro, data que a Igreja escolheu tomando-a da festa do Sol dos romanos.

O mais provável é que tenha nascido em Nazaré, onde passou sua infância. Os judeus são chamados, de fato, pelo nome do pai ou do lugar de nascimento e todos os evangelistas o chamam de "Jesus de Nazaré", nunca de "Jesus de Belém".

A festa do Natal, convertida hoje numa festa de consumo, tem, entretanto, muito que ver com a mensagem original daquele profeta judeu, já que Natal, religioso ou laico, é a celebração da vida e não da morte que Jesus nem queria nem buscou. Mais ainda, que rejeitou e temeu, chegando a suar sangue ao saber que o matariam. O Jesus histórico não encarnava o ideal do herói ou do super-homem, mas do homem de carne e osso que acreditava na utopia da igualdade, o amor universal e do perdão e que, desconsolado e pendurado na cruz pediu explicações a Deus por tê-lo abandonado injustamente à sua própria sorte, identificando-se nesse momento com todos aqueles abandonados à própria sorte e com todos os condenados injustamente. A mensagem natalina, na sua melhor essência, consiste em que a aposta da Humanidade deve ser pela vida e não pela morte, a favor da felicidade e não da dor, da sabedoria e do conhecimento da verdade e não dos medos e apocalipses teológicos que as igrejas costumam nos oferecer como presente envenenado e antievangélico.

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