PEC 241, que limita gasto público, passa por teste crucial na Câmara
Proposta de mudar Constituição, prioridade máxima de Temer, terá nova votação na Casa e no Senado
Os deputados federais aprovaram na noite desta segunda-feira o texto principal da proposta de emenda constitucional que cria um teto de gastos públicos da União pelos próximos 20 anos, a PEC 241 – chamada pelos governistas de PEC do Novo Regime Fiscal e pelos opositores de PEC da Morte. O placar final foi de 366 a favor, 111 contrários e duas abstenções – foram 58 votos a mais do que os 308 necessários para a aprovação da proposta. Ainda são necessárias mais três votações para que essa proposta se torne lei, uma na Câmara e duas no Senado. A expectativa é que as etapas, consideradas prioridade máxima para o Governo Temer, ocorram até o fim deste ano para que a nova regra já passe a valer em 2017.
Caso a aprovação da PEC 241 se confirme, todos os gastos, inclusive com o salário mínimo, só serão reajustados conforme a inflação do último ano (a informação é contestada pelo Governo Temer, que diz que até 2019 permanece a regra de aumento conforme a variação inflacionária mais ganho do PIB do ano retrasado). Um levantamento feito pela bancada da oposição na Câmara constatou que, caso essa regra já estivesse vigorando na última década, o salário mínimo que hoje é de 880 reais seria de aproximadamente 550 reais. O congelamento do salário mínimo é o primeiro passo para assegurar a reforma da Previdência, a próxima meta da gestão Michel Temer (PMDB) no Congresso Nacional. Parte das aposentadorias é diretamente vinculada ao mínimo.
Nas áreas de saúde e educação o limite de gastos passará a valer apenas em 2018. As demais, já valerão a partir do ano que vem, se o pleno for cumprido à risca. Ainda na noite desta segunda-feira, os deputados votariam nove emendas parlamentares para tentar alterar algumas regras, como os investimentos em saúde e educação.
Vitória expressiva
Para se chegar ao expressivo resultado desta segunda-feira na Câmara, que pressupõe uma das maiores mudanças fiscais para o Estado brasileiro em décadas, o Governo Temer atuou intensamente nos bastidores nos últimos dias. O próprio presidente concedeu uma série de entrevistas e promoveu um jantar no Palácio da Alvorada para os deputados na noite de domingo apenas para garantir o quórum alto em Brasília logo na manhã de segunda-feira. Os movimentos mais recentes da gestão foram: a exoneração de três ministros que também são deputados para que eles pudessem votar favoráveis ao projeto e uma pressão feita por outros membros de seu primeiro escalão sobre parlamentares, ameaçando inclusive exonerar seus indicados para cargos comissionados.
Os ministros Bruno Araújo (Cidades), Max Beltrão (Turismo) e Fernando Coelho Filho (Minas e Energia) retomaram suas cadeiras na Câmara porque temiam que seus suplentes votassem contrários à emenda constitucional ou que se abstivessem. Já os ministros Ricardo Barros (Saúde) e Maurício Quintela (Transportes) circulavam pelos corredores do Congresso para convencerem seus correligionários do PP e do PR a votarem com o Governo. Com o resultado, Temer ligou para o relator da proposta, Darcísio Perondi (PMDB-RS), disse que ele e sua equipe "fizeram história" e "serão reconhecidos por gerações futuras".
O dia também foi marcado por uma série de manobras regimentais para tentar concluir a votação ainda nesta segunda-feira. Os parlamentares reduziram o tempo de discussão do projeto de lei e conseguiram antecipar em ao menos um dia a votação. A pressa do Governo em aprovar o projeto ainda nesta semana leva em conta o prazo que a PEC 241 levará para tramitar também no Senado e passar a valer já no ano que vem. A expectativa é que a votação em segundo turno na Câmara ocorra até no dia 24 de outubro. No Senado, o projeto deve ser votado, em duas etapas, até a primeira quinzena de dezembro.
A votação propiciou momentos inesperados na sessão. Alguns membros da oposição votaram com a situação e vice-versa. O governista Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), por exemplo, falou contra a PEC 241. E o oposicionista Silvio Costa (PTdoB-PE) discursou a favor da PEC. Todos os lados levantaram faixas e cartazes defendendo seus posicionamentos. Deputados do PSDB, do DEM e do SD se revezavam para segurar uma faixa com os dizeres “O PT quebrou o Brasil. Nós estamos consertando”. Outros, também governistas, seguravam cartazes que afirmavam “A PEC 241 tira de vez o Brasil do vermelho”. Já os opositores mostravam placas dizendo que “A PEC 241 desmonta o Estado”.
Enquanto na Câmara os debates eram intensos, a sociedade, de maneira geral, demorou a entrar nas discussões, apesar do projeto tramitar no Congresso desde junho. Foi apenas na semana passada que entidades vinculadas a sindicatos de trabalhadores começaram a se manifestar contra a proposta. A Procuradoria Geral da República emitiu uma nota técnica dizendo que a proposta é inconstitucional, enquanto a Associação dos Magistrados Brasileiros a classificou como um atentado ao Judiciário. Já as entidades patronais entraram na discussão apenas no domingo, quando 822 delas, capitaneadas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), publicaram anúncios de quatro páginas inteiras em dois jornais de circulação nacional defendendo a PEC 241.
Na justificativa que acompanha a proposta apresentada ao Congresso, os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo Oliveira, alegaram que a PEC visa “reverter, no horizonte de médio e longo prazo, o quadro de agudo desequilíbrio fiscal em que nos últimos anos foi colocado o Governo”.
Em seu discurso convocando seus aliados, o líder de Temer na Câmara, André Moura (PSC-SE) disse que a PEC tem o objetivo de impedir “uma trajetória explosiva da inflação e da recessão”. Os opositores, por sua vez, afirmaram que o Brasil será jogado em “uma situação de exclusão”, conforme declarou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
Um dos argumentos usados pelo Governo para convencer os que ainda estavam em dúvida era de que a criação de um teto de gastos por 20 anos (que pode ser revisado no décimo ano) traria novos investidores ao Brasil e que, se ela não fosse aprovada, possivelmente novos impostos teriam de ser criados.
A tese foi criticada por um grupo de especialistas vinculados à Sociedade Brasileira de Economia Política. “Essa PEC parte de um pressuposto de que se ela for aprovada, a gente volta a ter crescimento no Brasil. Isso é mentira. Isso supõe a fadinha da confiança, que fazendo passar um ajuste fiscal muito rigoroso, a confiança volta, o investimento volta. Isso é ideológico, não tem nenhum substrato estatístico, material ou histórico”, ponderou o economista Pedro Rossi, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Até o fim deste mês, a gestão Temer deve enviar ao Congresso a sua proposta de reforma da Previdência. Antes, o Senado começará a analisar uma reforma política que prevê a extinção de uma série de partidos nanicos.
Ainda que aprovada em primeira votação, para prosseguir a proposta ainda dependerá do Judiciário. Oito deputados da oposição ingressaram com uma ação no Supremo Tribunal Federal alegando que a PEC 241 é inconstitucional. Inicialmente, pediam que fosse concedida uma liminar suspendendo a tramitação do projeto, mas foi negada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do STF. Agora, esperam o julgamento do mérito da questão, que pode suspender qualquer decisão do Legislativo.
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