Temer acena a ruralistas com apoio a mudança em demarcação de área indígena
Em gesto simbólico, presidente interino almoça com bancada ruralista, grupo influente no Congresso
Alterar a regras de demarcação de áreas indígenas. Autorizar a compra de terras brasileiras por estrangeiros. Mudar as regras de licenciamento ambiental. Três pautas insistentemente defendidas por ruralistas e pela bancada conservadora do Congresso Nacional caminham para receber um importante carimbo para que tramitem sem problemas pelo Legislativo brasileiro: o da Presidência da República.
Nesta terça-feira, o presidente interino, Michel Temer (PMDB) sinalizou a um grupo de deputados e senadores da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) que vai analisar a possibilidade de atender a todas essas demandas. Seis parlamentares que participaram do encontro relataram que o presidente se comprometeu a iniciar estudos que têm como objetivo alterar essas regras. O principal argumento dos congressistas é que há uma "insegurança jurídica" no país que impede o avanço do agronegócio. “São temas que precisamos discutir há anos e agora, pela primeira vez, tivemos a sinalização de que é possível progredirmos”, afirmou o deputado Silas Brasileiro (PMDB-MG).
Além das sinalizações práticas, Temer fez um gesto simbólico. Foi a primeira vez que um presidente se reuniu com os representantes da frente, criada há oito anos. O grupo representa 243 dos 594 congressistas. Eles são um dos Bs, da conservadora bancada BBB (boi, bala e bíblia), que domina o Parlamento brasileiro. "Temos consciência de que [o agronegócio] é a pauta mais importante, é o que garante uma certa estabilidade econômica para o nosso país. Então incentivá-los é incentivar o crescimento e o desenvolvimento do Brasil", afagou o peemedebista durante um almoço oferecido pela FPA, em Brasília.
Em seu discurso, Temer ressaltou que tentará resolver os imbróglios, que foram elencados pelo grupo em uma carta de apoio ao seu Governo. “A questão das terras indígenas, a Constituição, em suas disposições transitórias estabeleceu um prazo de cinco anos para a demarcação das terras indígenas e isso nunca foi feito. Levou-se um tempo enorme para que se fizessem as demarcações e ainda hoje processam-se demarcações. Nós vamos tomar conta disso. Vamos tentar solucionar esse problema. E quando digo isso, não é para agredir a nação indígena, ao contrário, é, mais uma vez, para dar estabilidade social ao país”, disse o presidente.
A questão indígena é um dos temas mais polêmicos que deverá ser enfrentado pelo peemedebista. Tramitam no Congresso duas propostas de emendas constitucionais que tratam do assunto, a PEC 71 e a PEC 215. A primeira, que prevê indenização para os proprietários rurais que tiverem suas terras demarcadas como indígenas, já foi aprovada no Senado e ainda aguarda votação da Câmara. A segunda, transfere para o próprio Legislativo a responsabilidade, que hoje é do Executivo, de fazer as demarcações.
A PEC 215, a revogação de processos demarcatórios e outros projetos de mudanças legais são os pontos que mais preocupam a comunidade indígena e seus apoiadores. Alguns especialistas dizem que essas alterações são um retrocesso na política indigenista. “A ideia é flexibilizar ao máximo possível a legislação vigente e, se possível, revogar os direitos adquiridos. Enfraquecer a Funai e os movimentos de apoio, criminalizar a luta indígena e as lideranças também é parte do jogo”, diz a antropóloga Oiara Bonilla, da Universidade Federal Fluminense. Na semana passada, Temer teve de recuar da nomeação de um general do Exército para a presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai) após críticas de indigenistas e representantes dos índios.
Terras para 'gringos' e licença ambiental
Com relação à venda de terras para estrangeiros, o empecilho, na visão dos ruralistas, é um parecer da Advocacia Geral da União, publicado em 2010 e reeditado em 2014, que interpretou a lei 5.709 de 1971 e tratava da aquisição de imóvel rural por cidadãos ou empresas do exterior. A AGU invocou a soberania nacional para impedir novas compras. A decisão criou um entrave jurídico e uma enxurrada de ações judiciais. O que os ruralistas pedem é que o Governo libere a entrada de capital estrangeiro no país por meio da aquisição dessas áreas. “Em um momento de crise, não é admissível que a gente abra mão desse recurso”, ponderou o senador Wellington Fagundes (PR-MT).
No evento, Temer afirmou que a questão vai ser examinada “tendo em vista a modernidade institucional, porque hoje, em face da globalização, é claro que certos padrões relativos à soberania nacional e etc., ganham uma nova fisionomia”.
Os ruralistas são o quarto grupo distinto que Temer contempla em suas diversas reuniões para tentar obter apoio à sua gestão. Antes havia se reunido com representantes de empresários, de industriais e de comerciários. Algo que, praticamente era unânime entre todos, é o desejo de agilizar os procedimentos de concessão de licenciamento ambiental. Temer informou aos ruralistas, nesta terça-feira, que o ministério do Meio Ambiente já está elaborando estudos para avaliar a possibilidade dessas mudanças. O tema também é polêmico. Ambientalistas, já bastante críticos da gestão Rousseff, temem as mudanças e rebatem a ideia de que a legislação é excessivamente rigorosa. Eles defendem que é preciso de estrutura para que Ibama e Funai trabalhem com mais agilidade.
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