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Messi é julgado por fraude fiscal: entenda o caso em 10 pontos-chaves

Julgamento do astro do Barcelona e da seleção argentina começa nesta terça-feira na Espanha

Jesús García Bueno

Lionel Messi, astro do Barcelona e da seleção argentina de futebol, enfrenta um julgamento por fraude fiscal a partir desta terça-feira. Mais de 200 jornalistas de diversos países estão credenciados para cobrir a etapa oral do processo na Audiência de Barcelona, na Espanha, que durará três dias. Messi só deverá comparecer na próxima quinta-feira, 2 de junho, quando precisará depor. O julgamento começa três anos depois de o Ministério Público mover uma ação contra o jogador.

Leo Messi no tribunal de Gavà em 2013.
Leo Messi no tribunal de Gavà em 2013.GIANLUCA BATTISTA

A seguir, alguns dos pontos-chaves do processo penal contra o camisa 10 do Barça:

1. Por que Messi será julgado? Por ter fraudado o fisco espanhol em 4,1 milhões de euros (16,3 milhões de reais, pelo câmbio atual) ao evitar o pagamento do imposto de renda durante os anos de 2007, 2008 e 2009. Ninguém duvida de que a fraude existiu, e o jogador inclusive já pagou o que devia, além de uma vultosa multa. O que está em questão neste julgamento é se Messi precisa responder penalmente por isso. Há quem opine (como os promotores) que não, já que, apesar de ser o jogador quem paga os impostos, a responsabilidade deve recair integralmente sobre seu pai, Jorge Horacio Messi, que geria seus assuntos econômicos e financeiros.

2. Quem o acusa, e qual é a pena possível? A parte acusadora é a Advocacia do Estado, órgão público que defende os interesses da Agência Tributária espanhola. Ao contrário do Ministério Público, essa instituição considera que Messi deve de fato ser julgado e condenado a um total de 22 meses e 15 dias de prisão por três delitos de fraude fiscal. Além do mais, pede que ele pague uma multa igual à quantia sonegada (4,1 milhões de euros). A Advocacia do Estado admite que o jogador provavelmente não é um gênio das finanças, mas argumenta que ele sonegou o IR “de forma consciente e voluntária”, e que no mínimo tinha conhecimento dos “exorbitantes rendimentos” recebidos a cada ano por seus direitos de imagem. A enorme cifra sonegada e o uso de paraísos fiscais agravam a pena; entretanto, a Advocacia do Estado analisa duas atenuantes que lhe permitiriam pleitear uma pena menor: a reparação do dano e o reconhecimento de fatos.

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3. Em que consistiu a fraude? Os direitos de imagem são a pedra angular do assunto. Apesar das suas divergências quanto à responsabilidade do jogador, o Ministério Público e a Advocacia do Estado consideram que o pai de Messi articulou uma estrutura empresarial em paraísos fiscais a fim de ocultar os dividendos milionários pela exploração comercial da imagem do jogador. Durante esses três anos, o atacante argentino recebeu 10,1 milhões de euros (40,1 milhões de reais, pelos valores atuais) de 20 grandes empresas (Banc Sabadell, Telefónica, Danone, Air Europa, Adidas, Pepsi e Konami, entre outras) a título de direito de imagem. No entanto, não pagou o IR correspondente. Messi simulou a cessão de seus direitos de imagem a empresas sem atividade em paraísos fiscais como Belize e Uruguai, a um preço ridículo. O dinheiro depois circulou pelo Reino Unido e a Suíça, “sem ser submetido a tributação praticamente alguma” e com “total opacidade” diante do fisco espanhol, que ignorava que o “real beneficiário” dessa renda era o próprio Messi.

4. Por que o Ministério Público não o acusa? Os promotores chegaram à conclusão de que Messi não só ignorava a estrutura empresarial montada por seu pai como também nunca foi informado a respeito, limitando-se a jogar futebol. A promotora do caso, Raquel Amado, também cita em favor do réu os depoimentos de fiscais tributários (segundo os quais era o pai de Messi quem conhecia a estrutura tributária criada) e um atestado, apresentado pela defesa do jogador, “sobre seu [baixo] nível educacional”. Mas o fato determinante para inocentá-lo surgiu no depoimento de Messi, que disse: “Da grana o meu pai se encarrega”. Messi, conclui a promotoria, fraudou o fisco, mas não houve dolo, pois agiu sem saber o que fazia, seguindo as orientações do pai.

5. O que Messi dirá? Basicamente, que não sabia de nada. O jogador responderá às perguntas de todas as partes e seguirá na linha do que já disse no tribunal de instrução de Gavà, nos arredores de Barcelona, onde depôs como suspeito em 2013. “Eu não lia os contratos nem os papéis que assinava, nem nada”, disse Messi na ocasião. Essa responsabilidade, deixou claro, recaía sobre os ombros do seu pai: “Assino o que o meu pai diz para assinar, nem olho, nem presto atenção, nem pergunto (...). Eu não olho o que assino, se o meu pai diz eu assino de olhos fechados.”

6. E o pai? Qual é o papel dele? As acusações atribuem a Jorge Horacio Messi a responsabilidade predominante na fraude. Ele mesmo admitiu a culpa em seu depoimento: “Lionel nunca teve acesso aos contratos nem à informação (...). Eu levava os contratos e lhe dizia que precisava assinar”. Para o pai, os promotores pedem um ano e meio de prisão; a Advocacia do Estado quer uma pena de 22 meses e 15 dias. Sua participação foi “direta, decisiva e necessária” porque “administrou e dirigiu as negociações na criação da estrutura societária”.

Ninguém duvida de que a fraude existiu. O que está em questão neste julgamento é se Messi precisa responder penalmente por isso

7. Que estratégia a defesa pretende seguir? A defesa centrará todos os seus esforços em obter a absolvição do jogador. Essa é a prioridade. A partir daqui, os advogados de pai e filho teceram uma estratégia para demonstrar uma responsabilidade em cascata: Leo não sabia nada ou quase nada, Jorge Horacio sabia alguma coisa, mas quem realmente conhecia a estrutura eram os “assessores externos” da família. A defesa aponta que os dois acusados são “leigos em direito tributário” e que atuaram “assessorados por um prestigioso escritório de advogacia especializado em direito tributário e esportivo”. Os advogados dos Messi – o ex-magistrado do Supremo Tribunal Enrique Bacigalupo e o advogado criminalista Javier Sánchez-Vera – baseiam-se na posição do Ministério Público e também denunciarão “irregularidades” e “defeitos” na investigação da Agência Tributária e na instrução judicial.

8. Como se desenvolverá o julgamento? A Oitava Seção da Audiência de Barcelona julga Messi e seu pai a partir desta terça-feira. O julgamento durará, provavelmente, três dias: o primeiro dia será para tratar das “questões prévias” (em que as partes expõem argumentos jurídicos) e ouvir as testemunhas; na quarta-feira serão ouvidas mais testemunhas e especialistas; e, na quinta-feira será a vez dos dois acusados. Nesse mesmo dia, a acusação e a defesa vão apresentar seus relatórios finais, em que solicitarão, respectivamente, a condenação e a absolvição dos Messi. Se houver atraso, esse último trâmite será realizado na sexta-feira. Messi só é obrigado a comparecer no dia de seu depoimento (quinta-feira), como prevê a lei quando o pedido de prisão é inferior a dois anos. O Superior Tribunal de Justiça da Catalunha reservou uma sala grande (a polivalente) e várias salas de imprensa para acompanhar o julgamento.

9. Há possibilidades de acordo? Até o último momento, em qualquer procedimento, existe a possibilidade de chegar a um acordo. Neste caso, entretanto, as partes concordam que é praticamente impossível. Durante a instrução judicial, a defesa buscou um acordo para evitar o julgamento, mas a posição da Advocacia do Estado tornou-o impossível. Messi já pagou cinco milhões [de euros] à Fazenda como “reparação de dano” pela cota fraudada. E o fez apenas dois meses depois de o Ministério Público abrir o processo contra ele. Além disso, já pagou outros dez milhões ao fisco para regularizar sua situação de 2010 e 2011, em que também operou com o mesmo sistema.

10. Messi pode ir para a cadeia? É um cenário altamente improvável. Mesmo que o tribunal condenasse Messi à pena solicitada pela Advocacia do Estado (a máxima que poderia impor) esta sempre será inferior a dois anos. A lei prevê deixar em suspenso o ingresso na prisão dos condenados a menos de dois anos, contanto que seja o primeiro delito que cometem, como seria o caso do jogador argentino.

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